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Qual o poder do pastor evangélico em determinar para o crente em quem votar? – por Carlos Wagner

Muito se tem escrito que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem investido em atrair a atenção dos eleitores evangélicos, em especial dos neopentecostais. Conheço a maioria das pessoas que estão ao redor de Lula e sei que sabem o tamanho e a complexidade do problema. Como repórter, também tenho estrada suficiente para notar que os grandes jornais e os noticiários das redes de TV (cabo e aberta) e rádio estão contando mal a história do voto dos evangélicos. Para começar, estão considerando como se todos eles fossem a mesma coisa. Não são. E as diferenças nada têm a ver com a visão de cada grupo para interpretar a Bíblia. É mais complexo. É sobre isso que vamos conversar.

Antes de começar a conversa julgo necessário dizer o seguinte. Não vou discutir religião. Sou um velho repórter, 73 anos, quase 40 vividos em redação, especializado em conflitos agrários, migrações e crime organizado nas fronteiras. Por conta da minha especialização andei pela maioria dos sertões da América do Sul fazendo reportagens. Vi e documentei muita coisa. Sempre digo e repito que muitas dessas coisas até Deus duvida que existam. Aprendi que quanto mais direta for a notícia, melhor é para o leitor. Daí ser admirador dos repórteres que fazem a cobertura policial. Eles conseguem resumir tudo em poucas linhas. Não é fácil. Dito tudo isso, vamos a nossa conversa. Por serem coisas diferentes, vamos separar os pastores dos seus seguidores, conhecidos como crentes. Os pastores têm duas linhas políticas. A primeira é a chamada Teologia da Prosperidade, que cresceu, amadureceu e hoje é um dos esteios da extrema direita americana. Prega que a salvação da alma é a prosperidade e, por consequência, a riqueza. No Brasil são muitos os seus expoentes, a maioria parlamentares da Bancada da Bíblia no Congresso. Conta com muitos pastores, vou citar os três que considero os mais importantes na atualidade: Silas Malafaia, 65 anos, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Grande orador e defensor dos valores da extrema direita, no último domingo de fevereiro (25/2) ele organizou e financiou uma manifestação que reuniu mais de 200 mil pessoas na Avenida Paulista, área central de São Paulo, em apoio ao ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL) – há matérias na internet. O segundo é o pastor Edir Macedo, 79 anos, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus e dono do Grupo Record, um conglomerado de emissoras de TV, rádio e jornais. E o terceiro é o pastor Marcelo Crivella, que foi prefeito do Rio (2017 a 2020), senador (2003 a 2017) e é sobrinho de Edir Macedo. Nos dias atuais, os pastores que seguem a Teologia da Prosperidade estão alinhados com os projetos políticos defendidos pela extrema direita brasileira. Apostaram todas as suas fichas em Bolsonaro. Mesmo com o ex-presidente inelegível por oito anos, pregam nos seus cultos a fantasia de que ele não ganhou as eleições em 2022 por ter sido sacaneado pelas urnas eletrônicas. Fato é o seguinte. Essa pregação contra as urnas eletrônicas mantém as bases mobilizadas. Não é por outro motivo que menos de duas semanas depois da manifestação na Paulista começou a circular uma conversa forte, com aval do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, de que a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro é cogitada para disputar as eleições presidenciais em 2026. Portanto, qualquer investimento que Lula fizer para se aproximar da base desse grupo de pastores será tempo jogado fora. Eles já foram longe demais para recuar.

Asegunda linha política dos pastores é Missão Integral, uma teologia nascida na América Latina, nos anos 60, que defende os empobrecidos, injustiçados e despossuídos. Um dos seus seguidores mais conhecidos é o pastor Henrique Vieira, 37 anos, deputado federal (PSOL-RJ), escritor, ator e pastor da Igreja Batista do Caminho, em Niterói (RJ), onde começou na política como vereador (2013 a 2016). Há muitos outros parlamentares e pastores que fazem parte dessa linha política. A maioria deles não é conhecida do grande público porque a cobertura da grande imprensa é centrada nos seus opositores, os pastores Malafaia, Macedo e Crivella. Não poderia ser diferente. Eles focaram suas carreiras na mídia. Andei lendo e consultando fontes sobre os pastores da Missão Integral. Eles são simpáticos às ideias de Lula. Não existe nenhum trabalho confiável que compare o volume de seguidores da Teologia da Prosperidade e da Missão Integral. O que se pode afirmar, como um grau razoável de precisão, é que os dois lados são organizados. A Integral é muito semelhante à Teologia da Libertação, que também nasceu na América Latina, nos anos 60, dentro da Igreja Católica, em defesa dos pobres. Tem como um dos seus expoentes máximos o frei Leonardo Boff, 85 anos, teólogo, escritor e intelectual. Como disse lá no início da conversa, não vou discutir religião. Usando a simplicidade e a elegância do texto dos repórteres que fazem a cobertura policial, digo que os pastores da Teologia da Prosperidade lutam pelo dinheiro e os da Missão Integral, pelos pobres e oprimidos.

Agora vamos falar sobre os seguidores destes pastores, os chamados crentes. O que há em comum entre eles é a origem. Logo que iniciei na profissão de repórter, no final da década de 70, nas favelas das regiões metropolitanas e nos rincões do Brasil começaram a tomar corpo a presença dos neopentecostais devido o surgimento dos chamados pastores eletrônicos. Até então existiam os evangélicos históricos, membros das igrejas tradicionais como a Assembleia de Deus. Lembro-me que fiz várias matérias nas favelas sobre a proliferação das novas igrejas evangélicas, que eram erguidas em barracos por pessoas que liam a Bíblia, interpretavam os textos a sua maneira e saíam pregando aos seus fiéis. Nas suas pregações, eles davam esperanças a uma população extremamente carente e sem cobertura de atendimento médico, que só foi popularizado com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) pela Constituição em 1988. Antes do universalização do atendimento pelo SUS, o sistema público de saúde só atendia os contribuintes da Previdência Social. As populações mais pobres não tinham acesso aos serviços médicos e hospitalares e dependiam de chás caseiros curar os seus males. Pastores como Edir Macedo construíram os seus impérios vendendo curas milagrosas. Alerto os meus colegas, em especial os jovens repórteres envolvidos na cobertura do dia a dia nas redações, que existem muitos livros, reportagens e documentários sobre a expansão das igrejas evangélicas no Brasil. É importante se informar para entender a complexidade da situação. Nos dias atuais, a maioria dos evangélicos são pessoas pobres. E acreditam nas pregações dos seus pastores. Os pastores ligados a Malafaia gastam uma grande parte do tempo dos cultos pregando o discurso do ódio contra o governo. Tem o seguinte. A história tem nos ensinado que as eleições são decididas pelo eleitor que chamamos da “maioria silenciosa”, aquele que escolhe em quem votar quando já está a caminho da urna. É a tal maioria silenciosa que existe em todos os grupos de eleitores, incluindo os evangélicos. Então é de se perguntar: qual é o poder do pastor evangélico em determinar para o crente em quem votar?

PARA LER NO ORIGINAL, CLIQUE AQUI.

(*) O texto acima, reproduzido com autorização do autor, foi publicado originalmente no blog “Histórias Mal Contadas”, do jornalista Carlos Wagner.

SOBRE O AUTOR:  Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela UFRGS. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 67 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.

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5 Comentários

  1. Ou seja, a religião tem que ser o que ele imagina que deve ser. A ‘vanguarda iluminista’ que va se ferrar. Para ser educado.

  2. “Fiquei imaginando que estranha mistura seria essa da religião com ódio, porque a religião verdadeira é o oposto do ódio, da violência. É a capacidade de lidar com o outro, mesmo quando ele tiver um comportamento absurdo, para compreendê-lo e convertê-lo”.

  3. O que não foi escrito. Vide o que os vermelhos estão preocupados. Vide o que o presidente do STF andou falando. “Precisamos combater a captura da religião para servir a causas políticas temporais e não espirituais, a instrumentalização de lideres religiosos para captar votos e dizer ‘o meu adversário é o demônio, quem votar nele não vai para o céu’. É uma forma bárbara, anti-cristã, de lidar com a religião”.

  4. ‘A história tem nos ensinado que as eleições são decididas pelo eleitor que chamamos da “maioria silenciosa”, aquele que escolhe em quem votar quando já está a caminho da urna.’ Não ha maneira de provar isto sem ler os pensamentos de quem se dirige para votar. Sem falar que as pessoas mentem para os pesquisadores.

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