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Precisão da imprensa ajuda os gaúchos a sobreviver às tragédias das enchentes – por Carlos Wagner

“...Chuvas, ventos e outros eventos climáticos despertarão os piores temores”

Porto-alegrenses estão com os nervos à flor da pele com a frequência das enchentes na capital gaúcha (Foto Reprodução)

O porto-alegrense está assustado e com os nervos à flor da pele. Na quarta-feira (22), começou a ganhar corpo a conversa de que as águas do Lago Guaíba, ou Rio Guaíba como é conhecido popularmente, estavam alagando novamente a capital gaúcha. Por conta de alguns bueiros de esgoto pluvial que voltaram a despejar água nas ruas, vielas e avenidas do Praia de Belas e do Menino Deus, dois bairros classe média.

No dia 5 de maio, um domingo, as águas do Guaíba alcançaram a cota de 5,31 metros, superando a marca de 4,73 metros da enchente de 1941, até então a maior já registrada, e colapsando o sistema de proteção contra as cheias de Porto Alegre. A falta de manutenção no sistema facilitou a invasão das águas no Centro Histórico e em vários bairros.

No final da tarde de quarta-feira, o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) informou que a volta dos alagamentos às ruas do Menino Deus se deveu ao desligamento momentâneo de uma estação de bombeamento. No Praia de Belas, o problema aconteceu porque a água dos bueiros que corre para o Arroio Dilúvio, que por sua vez deságua no Guaíba, foi represada pelo vento sul. Problema que vem atormentando a comunidade há uns bons anos.

Se os responsáveis pelo Dmae tivessem avisado rapidamente a população do se tratava, teriam evitado muita dor de cabeça aos moradores que ainda estavam limpando e consertando suas casas dos danos e sujeiras trazidas pela enchente. Para quinta e sexta-feira (dias 23 e 24) estavam previstas chuvas intensas na Região Metropolitana de Porto Alegre, de 80 e 100 milímetros.

Na Capital, a chuva começou durante a madrugada e persistiu com intensidade durante toda a quinta-feira, inundando outra vez ruas que até dois dias antes ainda estavam alagadas pela cheia do Guaíba. Arroios transbordaram e prédios voltaram a ser invadidos pela água, como foi o caso do Hospital Mãe de Deus, que atende 1,5 mil pessoas por dia. A Praça da Alfândega, no Centro Histórico, também foi novamente coberta pelas águas.

No final da manhã de quinta, o Dmae soltou uma nota explicando que os alagamentos aconteceram por dois motivos: o excesso de lixo deixado nas ruas pela enchente do início do mês e o funcionamento precário das estações de bombeamento. Os reais resultados dessa chuvarada só serão conhecidos no fim de semana.

Para contextualizar a nossa conversa. A enchente de maio foi a terceira de grandes proporções nos últimos nove meses no Rio Grande do Sul. Desta vez, castigou fortemente a Região Metropolitana, mas também atingiu 320 dos 497 municípios gaúchos, matando 163 pessoas e deixando 72 desaparecidos (dados disponíveis até o fechamento deste texto).

No total, as três enchentes custaram a vida de 218 pessoas e deixaram um rastro de destruição na infraestrutura (estradas, pontes, residências, prédios comerciais e industriais) que custará muito tempo e dinheiro para ser refeita. No início de maio, fiz o post Novo normal do clima instala a rotina das tragédias no território gaúcho.

Voltando a nossa conversa. Essa nova realidade contribui para que os gaúchos acompanhem os comentários dos meteorologistas e repórteres especializados no clima como se estivessem assistindo na TV ou ouvido no rádio uma partida de futebol. A chuva de quinta-feira ressuscitou os traumas deixados pelas três enchentes anteriores.

Daqui para frente, chuvas, ventos e outros eventos climáticos despertarão os piores temores na população por conta do novo normal do clima. Daí a importância das notícias serem redigidas e apresentadas de maneira simples, clara e precisa, para não deixar dúvidas no leitor. Elas precisam esclarecer exatamente o que está acontecendo.

Lembro que no final da década de 70, quando comecei a trabalhar em redação de jornal, havia os repórteres especializados em meio ambiente, “os verdes”, como eram chamados pelos colegas. Na época, os movimentos ecologistas ao redor do mundo se consolidavam e pressionavam governos, bancos e grandes indústrias a respeitar o meio ambiente.

Esses movimentos conseguiram fazer com que vários países, entre eles o Brasil, criassem legislações protegendo o ambiente. Nos anos seguintes, os repórteres especializados em ecologia começaram a sumir das redações. Há um caminhão de motivos pelos quais esses profissionais saíram de cena. Um deles é que a pauta ambientalista se tornou um bom negócio e foi absorvida pelo mercado.

Nos últimos 20 anos, nasceram, cresceram e se consolidaram movimentos negacionistas em vários cantos do mundo. No Brasil, os negacionistas avançaram sobre as reservas naturais e a legislação que disciplina a construção civil. Quando os repórteres ambientais saíram das redações levaram consigo o seu conhecimento e as fontes que lidam com o assunto.

Nos dias atuais são escassas as redações que ainda mantêm a figura do repórter especializado em assuntos do meio ambiente. A maioria não tem esse profissional e utiliza os órgãos governamentais como fonte de informação. O resultado dessa situação: matérias confusas e carentes de informações precisas.

Diante de tudo que escrevi, acredito que não há como os gaúchos não estarem com os nervos à flor da pele. Para um bom número de moradores de Porto Alegre, ontem (quinta-feira) foi a quarta vez que precisaram sair de suas casas, afugentados pelas águas.

Lembro que, no início do mês, o sistema contra as enchentes da Capital, que inclui 18 estações de bombeamento de água, colapsou pela falta de manutenção. Enquanto o sistema não for conservado e colocado em pleno funcionamento, qualquer chuva mais forte alagará a cidade.

Isso é um fato. Fazem parte da cultura dos gaúchos os chamados ditos populares. Um deles, que ouço desde a minha infância lá em Encruzilhada do Sul, pequena cidade na Serra do Sudeste, onde a água congela nos canos durante o inverno, afirma o seguinte: “Um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar”. É provocação lembrar esse dito para alguém que pela quarta vez foi expulso de casa pelas águas.

PARA LER NO ORIGINAL, CLIQUE AQUI.

(*) O texto acima, reproduzido com autorização do autor, foi publicado originalmente no blog “Histórias Mal Contadas”, do jornalista Carlos Wagner.

SOBRE O AUTOR:  Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela UFRGS. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 73 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.

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6 Comentários

  1. ‘[…] nasceram, cresceram e se consolidaram movimentos negacionistas em vários cantos do mundo.’ Vermelhos por falta de argumento usam a desqualificação para eliminar o dissenso. Sao autoritarios sem qualificações. ‘Democracia’ é só mais uma palavra. Negocio é marginalizar os ‘indesejaveis’ na concepção deles. E socializar os marginalizados. Engenharia social por falta de melhores termos. Alem de contraproducente gera ressentimentos. Gera conflito e polarização.

  2. ‘[…] o sistema contra as enchentes da Capital, que inclui 18 estações de bombeamento de água, colapsou pela falta de manutenção.’ Segundo comunistinha da Rede Bullshit, noticia boa tem problemas cognitivos notorios, o problema foi que Marchezan extinguiu uma repartição publica, o DEP. Se houvesse uma repartição publica encarregada do caso existisse nada disto aconteceria. Alas, nos mesmos microfones onde foi questionada a serventia do Muro da Mauá. A la Ricupero.

  3. ‘Se os responsáveis pelo Dmae tivessem avisado rapidamente a população do se tratava, […]’. ‘Para quinta e sexta-feira (dias 23 e 24) estavam previstas chuvas intensas […]’. Vai ver não tinham material de desenho. Na hora do aperto ou se corre atras do prejuizo ou se interrompe o que esta fazendo para atender a midia. O gargalo é o tomador de decisão. Derrubaram uma passarela, por exemplo. Alguém tem que chutar o penalti mas há que esperar porque esta dando entrevistas?

  4. Rede BullShit. No dia que a chuva fez os esgotos pluviais transbordarem e as aguas subirem de novo. Segundo relatos população em panico. Trauma não é pequeno e o estado animico por lá esta longe de estar bom. Radio Tuetrouxa queria entrevistar o prefeito ou diretor do DMAE. Não conseguiam. O que aconteceu? Começaram a falar mal do prefeito. Abandonaram os fatos por ‘vingancinha’. Domingo jogo beneficiente no RJ. Adriano Imperador passa sem falar com a imprensa. O que aconteceu? ‘Jornalistas’ falando sua opinião pessoal (desfavorável, obvio) sob o jogador. Como se a maioria da população, não só uma bolha, estivesse interessada nas considerações pessoais dos periodistas. Padrão é: não fez o que a imprensa acredita que tem que ser feito ‘leva pau’. Influi? Só os com problemas cognitivos. Solução é trocar de estação.

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