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As Forças Armadas no banco dos réus da democracia – por Leonardo da Rocha Botega

E tem aquela outra frase, de 68: “às favas todos os escrúpulos de consciência”

“Democrata é o cacete. Não tem mais democrata agora”. Esta mensagem, escrita em 4 de dezembro de 2022, foi uma das tantas obtidas pela Polícia Federal nas investigações que culminaram com o indiciamento de trinta e sete pessoas por organização criminosa, abolição violenta do estado democrático de direito e golpe de estado. Entre os indiciados estão o ex-presidente Jair Bolsonaro e boa parte da cúpula militar de seu governo.

Buscando uma equivalência histórica, a frase, escrita por um militar, tem o mesmo sentido da que foi pronunciada pelo, também militar, Jarbas Passarinho na reunião que determinou a decretação do Ato Institucional Nº 5, em 13 de dezembro de 1968. Naquela ocasião, o então ministro, se voltando ao ditador Artur da Costa e Silva, declarou: “Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência”. O resultado todos nós sabemos (ou pelo menos os democratas sabem).

Em que pese o distanciamento histórico entre estes dois “discursos”, a origem institucional comum revela o quanto de permanência do golpismo autoritário ainda reside nas Forças Armadas brasileiras. Soma-se a isso os fatos de que dos trinta e sete indiciados pela Polícia Federal, vinte e cinco são militares, sendo sete generais e dois ex-comandantes de Forças Armadas. Além disso, o plano descoberto revelou que o golpe teria ampla participação das Forças Especiais do Exército, os chamados “kids pretos”.

A ideologia do golpismo autoritário tem suas bases calcadas no mito de que o exército foi o grande construtor da nacionalidade brasileira. Primeiramente com a vitória sobre os holandeses na Batalha dos Guararapes, depois com as vitórias das tropas de Duque de Caxias contra os rebeldes das províncias e, finalmente, com o golpe que depôs D. Pedro II e implantou a República em 1889. Desde então, foram dezenas de pronunciamentos, tentativas e golpes vitoriosos ao longo da História do Brasil Republicano.

Entre os golpes vitoriosos estão o de 1930, o autogolpe de 1937 e o golpe de 1964. Em comum a todos estes golpes (e aos pronunciamentos e tentativas também) está a falsa ideia de que as Forças Armadas representam uma espécie de Poder Moderador entre os poderes da República. Está ideia é tão falsa quanto a interpretação que o golpismo autoritário faz do artigo 142 da Constituição Federal, definindo-o como uma regra que autoriza legalmente uma intervenção militar.

Com exceção de poucos juristas de grande desonestidade intelectual, a ampla maioria concorda com os pareceres, tanto do Congresso Nacional, quanto do Supremo Tribunal Federal, de que não existe qualquer margem na Constituição para a existência de uma instituição “mediadora” entre os poderes da República. Nunca é tarde para lembrar que a Constituição de 1988 foi construída justamente para consolidar o fim do autoritarismo ditatorial hegemonizado pelos militares após o golpe de 1964.

As Forças Armadas, portanto, não são nem “poder moderador”, tampouco construtora da nacionalidade brasileira. Muito pelo contrário! Historicamente sua atuação foi mais frequente como repressora dos desejos desta mesma nacionalidade, vide as constantes violações dos direitos dos povos indígenas e das comunidades quilombolas, levadas à cabo pelos militares, tanto na ditadura do Estado Novo, quanto na Ditadura Civil-Militar de 1964-1985, sem contar Canudos e outros tantos massacres contra o verdadeiro povo brasileiro.

A verdade é que historicamente as Forças Armadas brasileiras foram pensadas como órgãos de repressão aos “inimigos internos”, sejam eles quem fosse. Sertanejos, caboclos, indígenas, negros, comunistas ou quem assim fosse considerado, todos eram alvos. E ao que tudo indica o advento da democracia brasileira pós-anos 1980 não mudou essa concepção em boa parte da caserna.

Jair Messias Bolsonaro, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, Almir Garnier Santos, Estevam Cals Theópilo Gaspar de Oliveira, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, Walter Souza Braga Neto, Mario Fernandes, Laercio Vergílio, Mauro Cesar Barbosa Cid e mais dezesseis outros militares golpistas nominados pela Polícia Federal, são exemplos disso. Seus indiciamentos pela trama que culminou na infame tentativa de golpe de 08 de janeiro de 2023 não podem ser vistos como ações de um pequeno grupo.

A presença nas articulações pela ruptura da democracia brasileira de figuras que ao longo das últimas décadas estiveram nos altos escalões das Forças Armadas, coloca as próprias Forças Armadas no banco dos réus desta mesma democracia. Ou enterramos definitivamente a permanência do golpismo autoritário que ainda reside nas Forças Armadas brasileiras ou nunca avançaremos com a nossa tão incompleta democracia.

(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve regularmente no site, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).

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9 Comentários

  1. Brando,
    Vamos fazer um debate público. Olho no olho, sem a covardia do anonimato! Topas? Aí podemos ver até onde vai a tua argumentação fora do teclado, mostrando a cara. Vamos? Podes até convidar os coleguinhas.

  2. Brando,
    Quanto malabarismo e desonestidade “pseudointelectual” para justificar a ação dos coleguinhas hein!
    Mas tem algumas perguntas que você poderia responder: teu anonimato é por covardia? Medo dos coleguinhas que estão entregando todo mundo? Que diferença ética com a esquerda hein? Sem a desumanização da tortura estão caguetando todo mundo! Que camaradagem hein! Selva!

    1. Kuakuakuakuakua! Padrão vermelho, na falta de argumentos desqualifique! O ‘malabarismo’ e ‘desonestidade’ “pseudointelectual”‘ inclui um negócio chamado ‘direito’. Aquilo que vem depois do ‘Estado Democratico de ….’. Mas é bom que o autor acusou….o golpe! Kuakuakuakuakuakua!

  3. Resumo da opera. Vermelhos já sabem que reeleição do Rato Rouco não será facil. Sem polarização nao tem votos. Economia balança mas não cai. Preços dos alimentos subindo. Querem interferir nas FFAA por qual motivo?

  4. Alas, ‘conspiração’ não é tipificada no Brasil. Muito indiretamente talvez. Formação de quadrilha. Associação criminosa que depende de ‘[…] violência, intimidação, corrupção, fraude ou de outros meios assemelhados […]’.

  5. Obviamente já esta tudo decidico no ‘Estado Democratico de Direito’. Processo e julgamento serão ‘temporizados’ de acordo com o calendario eleitoral de 2026. Negócio será na base do condenar e achar um mimimi para justificar depois. ‘Usar a criatividade’ será a norma.

  6. Lendo o Codigo Penal. Dos crimes contra as instituições democraticas. ‘Art. 359-L.Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais: […]’. ‘Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído: […]’. Se eram ‘planos’ onde está a ‘violencia ou grave ameaça’?

  7. Pergunta bem basica. Na hora do aperto, enchentes, etc. quem irá aparecer para ajudar? Os de verde ou os de vermelho que passam a vida esfregando a barriga numa mesa no ar condicionado?

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