Minha cidade e as tragédias – por Orlando Fonseca
“As imagens que vou guardar é do conhecido veículo com as cores da UFSM”

Sexta-feira passada, quando me dirigia pela Faixa Nova para a TV Diário, onde participaria do Sala de Debate, comecei a ouvir nas rádios locais a notícia de um acidente com um ônibus da UFSM. Ao chegar na sede do Jornal, já fui sendo tomado pela atmosfera comum à circulação de notícias trágicas. Jornalistas, por serem uma espécie de antenas da humanidade (os poetas estão em uma prateleira mais elevada, segundo Ezra Pound), têm a potência de elaborar em palavras o que outros sentem no coração, na alma; estes últimos por estarem envolvidos diretamente com os fatos trágicos. Jornalistas precisam transformar em texto não apenas o que acontece, mas a dimensão do que é capaz de romper com o cotidiano e se elevar acima do comum e do ordinário.
Fomos conduzidos para a sala do programa, e o debate foi sendo tomado pelo que se anunciava nos bastidores, com o devido cuidado, próprio de uma ética – ainda vigente – que prescreve cautela. Uma notícia não é apenas um conteúdo desprovido de implicações graves, quanto maior a sua urgência, maior o estrago que pode fazer em uma comunidade. Uma vez que as informações circulando já pelas redes sociais falava em mortes, a abordagem ganhava maiores conotações em sua força trágica, pois atingiria a apreensão, o temor e a dor, não apenas da cidade.
Àquelas alturas já era uma sombra tomando o Estado todo, pelas reportagens na mídia da Capital. O programa Sala de Debate teve de ser interrompido, as notícias e as imagens que já chegavam davam o prenúncio de algo realmente terrível. Fomos dispensados, nós os participantes do programa, já constrangidos de tentar qualquer outro tema, pois o que a cidade precisava saber se impunha com amarga urgência.
Enquanto me dirigia para um restaurante, a fim de almoçar, fui tomado mais uma vez pela força trágica das notícias, por estar no meio delas. Do mesmo modo que, em 2013, fui acordado de madrugada por sirenes e informações das rádios, e me ver mergulhado no meio de um vendaval que ainda não deixou de soprar seu hálito de morte sobre a cidade. Pois não se fica incólume em um lugar onde 242 jovens morrem em um incêndio, em uma boate, onde minutos antes se divertiam e celebravam a vida desapercebidos dos perigos que ela traz em uma faísca.
Agora os perigos se anunciavam em uma curva, em um freio que não funciona, um veículo que rola pela ribanceira. Mais uma vez, percebi nas notícias que chegavam de todos os lados, rádios, internet e redes sociais, que Santa Maria estava nas manchetes. Naquele longínquo 27 de janeiro, no incêndio da Kiss, por força do cargo que exercia, pró-reitor de graduação na UFSM, tive de passar o domingo também elaborando texto – a Nota oficial da Reitoria e informações para a imprensa do país.
Ainda na Faixa Nova, ouvindo as informações que chegavam da região de Lajeado, voltei no tempo quando, por força do meu trabalho literário, estive mais de uma vez em escolas de Estrela, Teutônia, Westfália. Mas não conhecia Imigrantes, aliás, jamais ouvira falar de um Cactário por ali, e mais, o maior da América do Sul. No entanto, as imagens que vou guardar é do conhecido veículo com as cores da UFSM, tombado em um campo. Dificilmente as tragédias como estas acontecem simplesmente por uma fatalidade. Os sinistros espreitam as falhas humanas, na condução do ônibus, na falta de manutenção desse ou nos cuidados com as estradas.
A perícia ainda dará o seu veredicto sobre o que realmente motivou o acidente, pois não se pode achar que sete pessoas, sete alunos (que percorreram um longo trajeto de preparo, seleção e dedicação aos estudos no Politécnico) podem perder a vida na curva de uma estrada pela qual viajavam em uma excursão-técnica. Caso contrário, ainda vamos ver perdurar junto ao nome de Santa Maria os efeitos trágicos de descuidos, de imprudência ou de riscos previsíveis.
(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.
Resumo da opera. Especulações. Padrão tupiniquim é que problemas só são problemas se baterem no bureau mais alto e tiverem a capacidade de afetar a imagem. Outro padrão: porta arrombada tranca de ferro. Mais um: nunca aconteceu, logo nunca vai acontecer, basta continuar fazendo, ou não fazendo, a mesma coisa.
‘[…] os efeitos trágicos de descuidos, de imprudência ou de riscos previsíveis.’ Inquerito deve apurar impericia, imprudencia ou negligencia.
‘[…] sete alunos […] podem perder a vida na curva de uma estrada pela qual viajavam em uma excursão-técnica.’ Tanto podem como perderam.
‘[…] na condução do ônibus, na falta de manutenção desse […]’. Onibus tinha cores da instituição, logo pertencia a ela. Não deve ser o unico. Manutenção era responsabilidade da instituição também. O motorista era terceirizado. Se existe frota, existe responsavel, o chefe dele e o chefe do chefe….
Cactário. Curso tecnico em paisagismo com duração de tres semestres. Pois então.
‘[…] estive mais de uma vez em escolas de Estrela, Teutônia, Westfália.’ Caminho da Serra, entra em Venancio saindo da 287 e vai até Garibaldi.
‘[…] que ainda não deixou de soprar seu hálito de morte sobre a cidade.’ Bastante obvio, varia de pessoa para pessoa. Cacoete comum de extrapolar experiencias proprias como se fosse as mesmas da maioria. Imprensa utiliza isto como ferramenta, ‘consensos falsos fabricados’.
‘Do mesmo modo que, em 2013, […]’. A ficha demorou a cair para a maioria. Cobertura na TV SM, Coronel Vargas, se lembro bem, fala em um caminhão frigorifico saindo da boate cheio e mais dois encostando no local. O numero de mortos foi aumentando.
‘Àquelas alturas já era uma sombra tomando o Estado todo, […]’. Obvio que não, para o afegão medio a vida não para e a maioria não pode ficar ouvindo radio/vendo televisão enquanto trabalha.
‘[…] (os poetas estão em uma prateleira mais elevada, segundo Ezra Pound),[…]’. Que também era poeta. Bastante modesto. Alas, poetas pica-fumo que quase ninguém le e ficam empurrando livros editados do proprio bolso para o circulos de amizades entram nesta conta?
‘Jornalistas, por serem uma espécie de antenas da humanidade […]’. Como são ‘nobres’! Kuakuakuakuakuakuakuakua!