Baleia Verde-amarela – por Orlando Fonseca
O Brasil passando por águas profundas e turbulentas, semana passada, e o assunto de maior destaque, entre formadores de opinião pública, era o jogo da Baleia Azul. Não retiro do tema a sua gravidade, nem a legitimidade dos que se debruçaram sobre o mesmo para alertar pais e educadores sobre o perigo escondido na, aparentemente, inofensiva Baleia. No entanto, há uma ameaça bem maior do que o cetáceo digital, fora do mundo virtual, aqui mesmo, na pacata realidade do trabalhador brasileiro. A verdadeira Baleia Azul ataca desde Brasília.
O jogo compartilhado pela internet e que vem atemorizando a galera mais atenta ultrapassou, sem dúvida, os limites do entretenimento, uma vez que o objetivo final é a morte do próprio jogador. Este deve cumprir 50 tarefas de um “curador” – desses tipos estranhos e entidades que se criam e prosperam no mundo virtual – que envolvem automutilações no meio de procedimentos mais inofensivos. Ao final, mesmo sabendo da situação desde o início, o participante é levado ao suicídio, sob ameaças escabrosas. Não há, como seria de esperar do nome sinistro do jogo, um suicídio em massa. Houve a ocorrência de casos na Rússia – onde surgiu o jogo – e um que outro alhures. Agora, convenhamos, alguém que se envolva em algo do tipo, conscientemente, já tem um problema prévio severo. O jogo e as suas circunstâncias têm o mesmo apelo e reações que já passaram o livro Os sofrimentos do jovem Werther, de Goethe – no século XVIII, músicas e filmes ao longo do final do século passado. Pesquisas apontam que, desde os anos 1980, é crescente a taxa de suicídios na faixa dos 15 aos 29 anos, no Brasil.
O tema do suicídio de adolescentes não é um tema menor, que não mereça atenção, o que me causa espécie é que esse mesmo destaque não é dado em relação à desordem social promovida por um governo ilegítimo, apoiado por um congresso suspeito. Assim como acontece com a justiça hoje, esta preocupação me parece seletiva: “vejam só que horror!” – apontam a Baleia, para que passem ao largo, despercebidas, as barbaridades de um bando de tubarões. Estas retiram o futuro desses mesmos jovens com as chamadas “reformas” trabalhistas e previdenciária, pois simplesmente suprimem direitos dos trabalhadores, com a finalidade de garantir o lucro e os ganhos das grandes corporações. Por isso que associo a ideia de que o Temer e sua fauna são a verdadeira Baleia Azul, capazes de estragos significativos na vida dos brasileiros.
Que as reformas são necessárias não há dúvida, pois estão ancoradas, historicamente, em uma realidade que já se modificou muito. No entanto, não podem ser levadas a cabo do modo como estão sendo impostas, nem ao custo para uma parte da relação capital – trabalho, como se pode verificar nas propostas já aprovadas ou nas que ainda tramitam no congresso. O responsável pela crise – econômica e social – não pode ser identificado na força de trabalho. E como as tarefas desse jogo ainda estão rolando, a de número 50 ainda virá, com certeza. Portanto, embora a preocupação, meritória, com os adolescentes e o jogo possam estar na opinião pública, considero urgente apontar para os estragos que estão na perspectiva das “reformas” para “modernizar” o Brasil.
NOTÍCIAS POPU-HILÁRIAS
– O Papa Francisco, em visita ao Egito, cometeu um chiste em sua prédica aos bispos locais. Santo trocadilho, o papa recomendou aos religiosos que não “fizessem obras faraônicas”. Imagino que ele pode inaugurar uma tendência. Em sua próxima visita à Rússia, deverá advertir aos fiéis: cuidado, que a “coisa está russa”; ou quando for à Grécia, vai suplicar aos locais que não nos surpreendam com algum “presente grego”. E vai se recusar a conversar com empresários chineses quando em visita àquele país, ressaltando que a nova ordem do Vaticano é não aceitar “negócios da China”.
– O presidente americano, Donald Trump e o coreano Kin Jong-un estão medindo forças, não para ver quem tem a maior ogiva nuclear, mas quem faz mais besteira no menor intervalo de tempo. Qualquer um deles tem o temperamento explosivo, sabemos, mas a terceira guerra mundial será apenas uma disputa entre os dois, para ver quem tem o maior topete.
– Quando alguém morre no exterior, efetiva-se uma operação diplomática conhecida como “repatriação sanitária”. Algo parecido – digamos, em termos sanitários – aconteceu recentemente no Brasil, com o dispositivo legal criado no Congresso para recuperar o dinheiro sujo depositado no exterior. Só que, dinheiro vivo mesmo não apareceu: 83% da grana continuam descansando em paz nos mausoléus de paraísos fiscais.
OBSERVAÇÃO DO EDITOR: a imagem que ilustra a crônica é uma reprodução obtida na Internet.
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