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EDUCAÇÃO. Luta da comunidade universitária por eleição direta do reitor mudou paradigmas na UFSM

Mobilização teve conquistas, alterou estruturas e influenciou mais instituições

Trancamento do acesso ao campus-sede da Universidade, na avenida Roraima, em Camobi, na greve havida em 1986 (foto Arquivo/ME)

Por Fritz R. Nunes / Da Assessoria de Imprensa da Seção Sindical dos Docentes da UFSM (Sedufsm)

Entre o final dos anos 60 e a maior parte da década de 70, o movimento de resistência era incipiente na UFSM, como bem relatou Luiz Roberto Simon do Monte, o Beto São Pedro, na reportagem REPRODUZIDA na madrugada passada. Os motivos são variados, que podem passar por um grau de politização baixo ou, também, pela própria eficiência da estrutura repressiva. Beto, estudante de jornalismo entre 1973 e 1978, diz que até quem buscasse participar de uma eleição para um diretório acadêmico acabava tendo que prestar contas aos agentes do governo.

Esse quadro começa a mudar no final dos anos 70, e a mobilização se intensifica nos anos 80, levando à UFSM a ser a primeira a universidade a ter um reitor eleito com o voto de sua comunidade (1985, Gilberto Benetti), o que acabou gerando diversos avanços e conquistas internas a partir do governo da Nova República (1985-1990), com José Sarney (PMDB), que sucedeu, ainda que com voto indireto, o último general da ditadura civil-militar. A luta intensa em Santa Maria repercute em todo o país, nas diversas universidades, atesta Paulo Pimenta, hoje deputado federal pelo PT, mas que ingressara no ensino médio da UFSM em 1979, e dirigiu o DCE nos anos de 1985/86.

Para o professor aposentado do Centro de Educação da UFSM, Ricardo Rossato, e que atuou como vice-reitor eleito, a partir de 1987, a universidade, de certa maneira, antecipou alguns movimentos sociais. Ele cita que, no exterior, isto ficou muito bem caracterizado nos movimentos de ‘Maio de 1968’, em várias partes do mundo, mas de modo muito intenso e agudo, isto teria acontecido na França. “Há também um notável evento denominado ‘Primavera de Praga’. Ambos foram abafados de modo diferente, mas suas ideias se disseminaram”, frisa ele.

Rossato argumenta que, no Brasil, a mobilização estudantil do final dos anos 60, leva à repressão violenta, que desemboca no “famigerado AI-5”. E acrescenta: “Após um período mais duro da repressão, estas brasas escondidas sob as cinzas começam a ser acesas e até mesmo greves vão ocorrer no final da década de 1970. O arrocho social e político mostrava já sinais de esgotamento e nas universidades começam movimentos muito claros em busca de uma democratização de toda a sociedade e, portanto, também dentro das instituições de ensino superior. Isto implicava em democratizar as formas de escolher seus próprios dirigentes”, diz o professor.

Edson Nunes de Morais, vice-presidente da Associação dos Professores (Apusm) no período 1985/86, na gestão comandada pelo professor Clovis Guterres (que posteriormente seria o primeiro presidente da Sedufsm), relembra que o crescimento das mobilizações coincide com a estratégia do governo do presidente João Figueiredo. O último general a comandar o Brasil assumiu, em 1979, se comprometendo a fazer uma abertura “lenta, gradual e restrita”, também pressionado pela crise econômica, pelo enfrentamento de greves, como as do ABC paulista.

Essa lufada de ventos de liberdade repercute na sociedade, através de seus mais diversos setores sociais, que se mobilizam para conquistar cada vez mais espaços nessa “abertura”. Nas universidades federais não foi diferente, destaca Morais. “Cria-se a Associação Nacional dos Docentes de Ensino Superior (a ANDES, posteriormente ANDES-SN), e que estimula todas as IFES, Instituições Federais de Ensino Superior, a se organizarem internamente”, explica.

“Diretas, urgente, para reitor e presidente!”

Entre o final dos anos 70 e o início dos anos 80 já havia mobilização na universidade, rememora Paulo Pimenta, que ingressou em 1979 no Colégio Técnico Agropecuário, onde presidiu o grêmio estudantil. Segundo ele, os temas que cativavam as pessoas se relacionavam, entre outros pontos, contra a carestia, pelo direito de organização (sindicatos estavam sob intervenção), pela busca da revogação da Lei de Segurança Nacional (LSN).

No ano de 1984, ano da campanha das ‘Diretas Já’ para Presidente, Pimenta já estava no ensino superior. Cursava Agronomia na UFSM e integrava o Diretório Acadêmico do curso (DA). Ele lembra que havia uma grande mobilização em favor da eleição direta para Presidente, e esse foi o mote aproveitado para que fosse reivindicada a eleição direta para reitor. Foi criada até uma palavra de ordem que associava as duas bandeiras: “Diretas, urgente, para reitor e presidente!”.

Ele destaca que a reivindicação pedia eleição direta para reitoria, direções de centro, coordenações de curso, ou seja, eleições diretas em todos os níveis. Foi em 1984, também, no mês de abril, quando Pimenta pichava um muro em Santa Maria, em favor das eleições diretas, que foi baleado e esteve um bom tempo hospitalizado.

O alcance das eleições diretas para reitor, antes mesmo da eleição direta para Presidente, que só se daria em 1989, mostrou o tamanho da força da comunidade dessas instituições. Mas, essa mudança “não veio de graça, foi fruto de muita luta”, destaca Cerlene Machado (Tita), servidora técnico-administrativa da UFSM e que militou tanto na antiga Associação Beneficente de Servidores (ABS), como depois, no sindicato dos servidores (Assufsm).

Ela avalia que “não existia uma estrutura sindical forte” e a organização se fazia através das associações beneficentes, que não estavam preparadas para a tarefa, ou não assumiram a responsabilidade pelo encaminhamento de uma discussão que passasse pela mudança da forma de escolha dos dirigentes da Instituição. “Muitos dirigentes trabalhavam numa alternativa que, praticamente excluía os segmentos dos técnicos e discentes do processo decisório”, diz Tita.

Beto São Pedro, vereador do PT, fala para estudantes, em 1988, durante greve contra aumento da passagem (foto Arquivo/ME)

Para Beto São Pedro, servidor municipal aposentado e estudante de jornalismo entre os anos de 1973/78, os estudantes tiveram papel vanguardista nas contestações ao regime ditatorial, na busca por democracia em todas as áreas. “As primeiras contestações ao regime partiram majoritariamente dos estudantes, como vanguarda do movimento, ao lado, claro, dos segmentos de esquerda do espectro político-partidário e sindicatos de mesma orientação. E quando estas iniciativas conseguem trazer para a luta o conjunto democrático da sociedade, o movimento se torna ‘incontrolável’ e as pautas democráticas vão se impondo”.

Houve reação à democratização da universidade?

As conquistas e avanços democráticos foram alcançados, mas nunca sem luta, pois a disputa de poder sempre gera reação. Ricardo Rossato comenta que havia “reação externa e interna”. Na avaliação do professor e ex-vice-reitor, a reação era “tanto dos que estavam no poder como de seus apoiadores, que buscavam uma perpetuação do modelo, pois eles poderiam chegar a ocupar os postos mais altos”.

Ele lembra que “em muitas cidades, a universidade representava uma instância de poder muito significativa e ocupar seus postos-chave significava também ascender socialmente, ou abrir caminhos para eventual participação da vida política. “A mudança de uma direção na universidade poderia ter reflexo na sociedade e isto era extremamente malvisto”, analisa Rossato…”

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