A política externa dos Estados Unidos – Parte 3 – por José Renato Ferraz da Silveira
Da luta contra o ‘eixo do mal’, por Bush, ao (bom) resultado interno de Obama
“It’s not enough to change the players. We gotta change the game!”
Barack Obama
Os Estados Unidos utilizaram – e bem pragmaticamente – os atentados de 11 de setembro como justificativa a uma “cruzada mundial contra o terror” em defesa da “paz mundial” e da sua segurança interna (produzi um ensaio modesto sobre a reação norte-americana quanto ao 11 de setembro intitulado “11 de setembro: um estudo de análise de política externa acerca da irracionalidade e imediatismo da opinião pública estadunidense”).
O 11 de setembro configura um turning point no estudo das Relações Internacionais na ordem mundial pós-Guerra Fria. De fato, é uma época caracterizada pelo entrechoque da multipolaridade em construção e a busca de unipolaridade norte-americana. É um período no qual notamos que o emprego militar assume novas feições num contexto mais complexo, abrangente e de indeterminações. E, somado a isso, o terrorismo que se torna tema obrigatório da agenda internacional.
Os Estados Unidos começam uma “guerra contra o terrorismo”. E nesse entendimento, os governos que dessem apoio/abrigo aos terroristas e os países que desenvolvessem – supostamente – armas de destruição em massa e que contestassem o poder norte-americano, foram colocados como os principais alvos da nova doutrina de segurança nacional.
Passaram a ser classificados em um agrupamento denominado “Eixo do Mal”.
Num primeiro momento, de forma declarada, constavam neste grupo o Iraque, o Irã e a Coréia do Norte, já que o Afeganistão já havia sido ocupado pelas tropas norte-americanas.
A expressão “Eixo do Mal” foi utilizada pelo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, em seu discurso anual no Congresso norte-americano em 2002, para se referir a três países (“Estados vilões”) que constituíam uma grave ameaça ao mundo e à segurança dos Estados Unidos: Coréia do Norte, Irã e Iraque.
Estes países, segundo Bush, desenvolviam armas de destruição em massa ou patrocinavam o terrorismo regional e mundial, ou faziam as duas coisas ao mesmo tempo.
Segundo Pecequilo, “mais tarde, os Estados Unidos incluíram também Cuba, Líbia e Síria a este seleto grupo de países. A expressão “Eixo do Mal” é uma dupla referência histórica: Eixo lembra o eixo Berlim-Roma na Segunda Guerra Mundial. e mal retoma o termo império do mal, forma como o governo Reagan se referia à União Soviética durante a Guerra Fria. Um Eixo do Mal mantém latente a ameaça exterior e justifica a necessidade de manutenção de um expressivo orçamento, do governo Bush, na defesa”.
A Doutrina Bush – a guerra preventiva
Em 2002, o presidente George Bush divulgou o documento “A estratégia de segurança nacional dos Estados Unidos”, que ficou conhecido como “Doutrina Bush”. Este documento apresentou as estratégias político-militares que passaram a ser adotadas pelo país em nome da defesa nacional, frente às ameaças a que poderiam estar sujeitos o território e o povo norte-americanos.
O documento revela a intenção dos Estados Unidos em agir militarmente, por conta própria e decisão unilateral em nome do direito de autodefesa, de maneira preventiva e antecipada: atacar antes e perguntar depois.
Dessa forma, os Estados Unidos, em nome do antiterrorismo e do combate de países considerados e avaliados como ameaçadores aos seus interesses, justificaram as suas ações e procuraram torná-las legítimas diante da opinião pública norte-americana e internacional.
Bush reverteu uma popularidade em constante queda. Ele foi agraciado com índices de aprovação superiores a 80%, demonstrando-se uma disposição firme ao combate. Quase 90% dos norte-americanos apoiavam a retaliação imediata, estando aí uma operação terrestre com envio de tropas (aqui, o índice de apoio caí para 65%). Foram consideradas como aceitáveis por mais da metade da população medidas temporárias de exceção que restrinjam as liberdades e aumentem o poder e o orçamento das agências federais envolvidas no combate aos inimigos do país. O estado de nova Iorque adotou a pena de morte para os crimes de terrorismo e, além disso, aventou-se a suspensão de direitos civis e o endurecimento de leis de imigração. Adicionalmente, a CIA e o FBI destacaram a importância do monitoramento de todas as comunicações internas, individuais e públicas, e ampliação de práticas de investigação.
No plano econômico, a economia norte-americana dava sinais de desaceleração, alertando para o risco de uma recessão, e muitos cortes na taxa de juros. Expectativas negativas sobre o futuro. Diminuíam os níveis de confiança internos e externos. Diversas companhias aéreas anunciaram demissões em massa. 10, 30 mil vagas.
Depois de quase uma década de prosperidade e crescimento, os Estados Unidos se veem ante um cenário marcado pela incerteza. O desemprego cresce. Meio milhão de norte-americanos fora do mercado. Uma grande parcela dessas pessoas não tem direito a benefícios de seguro social. Medidas tímidas de corte nos juros e incentivo ao consumo não foram suficientes para promover a recuperação. Os democratas chamaram esse período de “recessão dos republicanos”. Bush enfrenta o mesmo dilema que seu pai enfrentou no período da Guerra do Golfo: bom líder de política externa, deixando a desejar na resolução de problemas domésticos.
A sociedade norte-americana manteve seu apoio, mas há sinais de impaciência, pedindo soluções para a crise econômica e as ameaças terroristas que ainda pairavam sobre o país. Bush vence e é reeleito. Decisão polêmica da Suprema Corte Federal, que suspendeu a recontagem manual de votos na Flórida por 5-4. Houve questionamentos sobre a legitimidade do processo. Bush conquistou o colégio eleitoral com 271 votos contra 267 dos democratas. Quem ganhou entre a população, por mais de 500 mil votos, foi o Al Gore.
Temos a crise de 2008 “a maior crise que atingiu a economia norte-americana desde 1929. Essa crise foi causada por uma bolha imobiliária resultante da concessão de créditos excessivos pelos bancos para a compra de imóveis, o que gerou uma falsa valorização no mercado imobiliário. Em razão do aumento dos juros dos empréstimos e da estagnação na renda dos trabalhadores, milhões de norte-americanos não conseguiram pagar seus empréstimos, o que levou esses bancos à falência”.
Barack Obama como 44° presidente dos Estados Unidos
A eleição de 2008 marcou a escolha de Barack Obama para ser o 44º presidente dos Estados Unidos a partir de 2009. Essa escolha foi resultado de uma longa campanha política que se iniciou ainda em 2007, quando Obama decidiu se candidatar à presidência. Na época, ele era senador pelo estado de Illinois.
Após decidir concorrer à presidência, Obama teve que disputar as primárias do Partido Democrata, sendo Hillary Clinton sua principal concorrente. O resultado foi uma vitória apertada do senador por Chicago e, uma vez vitorioso, ele teve de enfrentar John McCain, o candidato do Partido Republicano.
A vitória de Obama nessa eleição foi relativamente fácil, uma vez que ele teve quase 10 milhões de votos a mais que seu concorrente e obteve 365 votos no Colégio Eleitoral. Vale lembrar que, na eleição norte-americana, um candidato, para ser vitorioso, precisa obter pelo menos 270 votos no Colégio Eleitoral.”
O governo de Obama “tomou uma ação para promover a recuperação da economia norte-americana. A principal ação foi o Reinvestment Act of 2009, quando foi aprovado um pacote de estímulo no qual o governo injetou 800 bilhões de dólares na economia do país. Entre as ações do governo de Obama estão os cortes fiscais para cidadãos e empresas, auxílio econômico para cidadãos de baixa renda, investimento em infraestrutura e pesquisa científica, entre outras. As ações de Obama tiveram bom resultado, sobretudo na questão do desemprego, que caiu de 10% para 4,6%. Foi registrado também aumento do PIB dos Estados Unidos”.
De acordo com Pecequilo: “quando Obama encerrou seu governo, em 2017, pesquisas apontavam uma alta popularidade do presidente dos Estados Unidos. Ainda assim, ele sofreu fortes críticas por determinadas ações”.
a) Em 2013, informações vazadas apontaram que o serviço de inteligência dos Estados Unidos, a NSA, espionava uma série de países, incluindo o Brasil.
b) A política do governo Barack Obama no Oriente Médio também foi alvo de críticas. O seu governo anunciou a retirada das tropas norte-americanas do Iraque e do Afeganistão e adotou uma postura menos invasiva. Os Estados Unidos passaram a realizar apenas ações de inteligência e promover ataques com drones em supostos locais de atividade terrorista.
c) Os ataques realizados por drones aconteceram no Iraque e Afeganistão, mas também em outros países, como Somália e Paquistão. Essas ações foram responsáveis pela morte de centenas de civis em diferentes partes do planeta.
d) Obama também recebeu críticas pela sua falta de ações mais enérgicas contra o surgimento do Estado Islâmico. As principais ações tomadas contra esse grupo ocorreram no cenário da Síria, país que passava pela Guerra Civil Síria. Os Estados Unidos deram início a uma série de bombardeios contra instalações do Estado Islâmico e apoiaram alguns grupos, como os curdos, para lutar contra o califado.”
A vitória de Trump
Após oito anos de governo, Barack Obama realizou a transição de poder – nos Estados Unidos. Como é sabido, é permitida apenas uma reeleição ao presidente.
Barack Obama transmitiu a presidência para o republicano Donald Trump, candidato considerado ultraconservador e que venceu a eleição presidencial de 2016, derrotando a candidata democrata Hillary Clinton.
Referências
KISSINGER, Henry. A Diplomacia das Grandes Potências. Trad. Saul S. Gefter; Ann Mary Fighieira Perpétuo. Rio de Janeiro. Livraria Francisco Alves, 1999.
KISSINGER, Henry. Precisará a América de uma política externa? Uma diplomacia para o século XXI. Trad. Fernanda O´Brien, Jorge Simões, Lucília Filipe e Maria José Figueiredo. Lisboa. Gradiva, 2003.
PECEQUILO, Cristina Soreanu. A política externa dos Estados Unidos. Porto Alegre. Editora da UFRGS, 2003.
(*) José Renato Ferraz da Silveira, que escreve às terças-feiras no site, é professor Associado IV da Universidade Federal de Santa Maria, lotado no Departamento de Economia e Relações Internacionais. É Graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP e em História pela Ulbra. Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP.
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