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ANÁLISE. Pesquisas de ZH, Datafolha e Sensus são corretas. Mas não são assim tããão neutras

Recebi um texto bastante interessante, e elucidativo. Trata-se de uma análise feita por Roberto Garcia, pós-graduado em Sociologia e Ciência Política e sócio-fundador da Studio Pesquisas – que, a título de informação adicional, fez os primeiros levantamentos eleitorais no início da década em Santa Maria, e com grau de acerto de 100%.  

Garcia faz uma avaliação crítica das pesquisas feitas pela empresa Fato (para Zero Hora), Datafolha (Folha de São Paulo) e Sensus (Confederação Nacional do Transporte). Sobretudo, ele mostra como os resultados poderiam ser até diferentes – dependendo da forma como são feitas as consultas e as perguntas aos entrevistados. Enfim, pesquisas, até elas, podem conter componentes nem tããão neutros assim. Vale a pena conferir, a seguir:

 

 

“Lá e aqui!

 

            Sem dúvida as pesquisas de opinião realizadas pela RBS, em escala estadual, e pelo Datafolha e CNT em escala nacional orientarão a movimentação do conjunto dos atores da cena política gaúcha nesta semana.

 

A pesquisa da RBS:

            Na quinta e sexta-feiras da semana passada a Fato realizou pesquisa de opinião para a RBS acerca das percepções sobre a crise política que vive o RS. As informações disponíveis não são muito amplas, especialmente no que diz respeito à análise dos resultados da pesquisa em função de variáveis demográficas tradicionais como sexo, idade, escolaridade, renda e outras que conferem maior robustez à análise de um levantamento de opinião pública. Em todo o caso, salta aos olhos incongruências entre os resultados divulgados e a leitura que a empresa contratante realizou no editorial da edição de domingo do jornal Zero Hora.

O jornal publicou respostas dos entrevistados a cinco perguntas, não divulgou a ordem em que as mesmas foram feitas, e ignorando o resultado às outras quatro, baseou-se em apenas uma delas para dar o tom do seu discurso: “A crise do Estado é também uma crise de credibilidade dos políticos” (…) “a rejeição aos políticos é inequívoca”. Depois de referir que “o governo Yeda Crusius está pessimamente avaliado, mas os partidos políticos, tanto da situação quanto da oposição, também aparecem mal nas tabelas”, o jornal concluiu:

            “Quem, então, pode ajudar o Rio Grande a superar a crise? Afora os veículos de comunicação (…) aparecem bem cotados a Polícia Federal, o Ministério Público, o Poder Judiciário, empresários/setores produtivos e sindicatos de servidores públicos. Na parte inferior da tabela, estão partidos de oposição, secretários de Estado, governadora, partidos da base do governo, vice-governador, deputados federais e senadores, e Assembleia Legislativa. Paradoxalmente, os eleitores apoiam expressivamente (79,4%) uma CPI para investigar o governo”.

Vejamos as perguntas na ordem em que foram divulgadas:

1.            Qual o grau de confiança que você tem nesta instituição/pessoa para auxiliar na superação da crise política do RS?

2.            A atual crise política no RS atrapalha ou não atrapalha o desenvolvimento econômico do Estado?

3.            Você tem conhecimento das denúncias de corrupção envolvendo o governo do Estado?

4.            Você acredita que as denúncias de corrupção atribuídas ao atual governo do Estado são todas verdadeiras, algumas são verdadeiras, outras não, OU são todas falsas?

5.            Você é favorável ou contrário à proposta de criação de uma CPI para investigar o governo de Yeda Crusius?

Se o objetivo da pesquisa era avaliar as percepções dos gaúchos sobre a crise política provocada pelas investigações realizadas (ou em curso?) pela Polícia Federal e pelas denúncias que se sucederam, não parece razoável abordarmos alguém desavisadamente na rua e fazermos estas perguntas nesta ordem. Parece mais lógico perguntar primeiramente se o entrevistado tem conhecimento das denúncias. Algo mais ou menos assim:

1.      Você tem conhecimento das denúncias de corrupção envolvendo o governo do Estado?

2.      Você acredita que as denúncias de corrupção atribuídas ao atual governo do Estado são todas verdadeiras, algumas são verdadeiras, outras não, OU são todas falsas?

3.      A atual crise política no RS atrapalha ou não atrapalha o desenvolvimento econômico do Estado?

4.      Qual o grau de confiança que você tem nesta instituição/pessoa para auxiliar na superação da crise política do RS?

5.      Você é favorável ou contrário à proposta de criação de uma CPI para investigar o governo de Yeda Crusius?

Talvez esta simples providência produzisse resultados distintos à pergunta na qual a RBS se baseou para destilar sua amargura sobre os políticos. A quem convém ampliar o desencanto sobre a instituição que neste momento pode aprofundar as investigações iniciadas pela Polícia Federal e o Ministério Público? Todavia, ainda que não saibamos a ordem em que as perguntas foram feitas, os resultados apresentados são claros, eloqüentes e inequívocos: 80% da população tem conhecimento das denúncias e mais de 87% acredita que pelo menos algumas delas são verdadeiras. Vejam que, pela forma como as informações foram publicadas, podemos concluir que mesmo quem não tomou conhecimento das denúncias acha que há algo de podre sob o vestido da ‘progenitora maior do Estado’. Mais de 90% dos entrevistados acha que a crise política atrapalha o desenvolvimento do Estado, e 4 em cada 5 gaúchos declaram-se favoráveis à criação de uma CPI para investigar o governo de Yeda Crusius.

      O paradoxo aqui não é o apoio da população à CPI. Aliás, não há nesta pesquisa paradoxo algum! O que talvez possa existir seja uma estratégia para diluir o significado de resultados que, pela sua potência, possam ter causado algum desconforto. A idéia de que oposição e situação, executivo e legislativo, chimangos e maragatos são todos iguais, neste momento só interessa aos réus, aos reais e principalmente aos potenciais.

 

As pesquisas do Datafolha e do CNT/Sensus:

As pesquisas nacionais traçaram um panorama de recuperação do elevado patamar de aprovação do Governo Lula que havia caído ligeiramente no auge da crise, e redução da vantagem de José Serra – mais evidente postulante à sucessão pela oposição – sobre Dilma Rousseff.

            A análise da composição dos cenários propostos pelo Datafolha para a Folha de São Paulo e pelo Sensus para o CNT é tão reveladora quanto os resultados destes levantamentos. A julgar pelas informações disponibilizadas no site do instituto, os cenários do Datafolha sempre apresentaram o nome de Ciro Gomes pelo PSB ao lado de um nome representando o PT. O CNT também apresentou aos seus entrevistados um cenário com Ciro e Dilma, mas nos demais cenários PT e PSB não aparecem simultaneamente. Desta forma o CNT pode nos proporcionar o resultado de uma simulação com Serra, Dilma e Heloísa Helena na qual a queda da diferença de Serra sobre Dilma é mais expressiva: de 29,4% para 16,9% entre março e maio (antes e depois do anúncio da doença da ministra).

Além da evidente diluição do potencial eleitoral dos candidatos da base de sustentação do Governo Lula – produzida pelo Datafolha ao colocar os nomes do PT e do PSB lado a lado em todos os cenários desenhados – a comparação dos resultados de cenário idêntico obtido nos dois levantamentos revela diferença expressiva (fora da margem de erro) no posicionamento de Dilma e Ciro entre os dois institutos. Vejam os números:

 

 

Datafolha

CNT/Sensus

José Serra

38

39

Dilma Rousseff

16

22

Ciro Gomes

15

9

Heloísa Helena

10

10

Branco/Nulo/Nenhum

13

11

NS/NR

8

9

 

Outro aspecto que chama atenção é que no Datafolha o nome de Aécio Neves aparece apenas em duas situações: 1) no lugar de Serra, ao lado de Dilma, Ciro e Heloísa; e 2) junto com Serra, Dilma, Ciro e Heloísa. Dois cenários, dois recados: 1) no lugar de Serra, Aécio encolhe o PSDB de 38% para 14%; e 2) no PMDB Aécio seguraria a lanterna com HH. A informação que a Folha ficou devendo aos seus leitores, porque o Datafolha não perguntou, é o resultado de uma simulação com Aécio, Dilma e HH, sem Ciro a dividir a base de Lula: graças ao CNT sabemos que neste cenário Dilma Rousseff lidera a corrida com nove pontos de vantagem sobre Aécio Neves.

            O Datafolha foi o único a inserir o nome de Lula em um dos cenários, e foi também o único a sondar os nomes de Fernando Haddad e Antonio Palocci. Até o momento o instituto não divulgou prognósticos para um eventual segundo turno. Segundo o CNT, nos dois últimos meses a diferença entre Serra e Dilma neste cenário recuou onze pontos, de 32,2% para 21,0%:

 

2º turno – CNT/Sensus

PRESIDENTE 2010

MAR 09

MAI 09

José Serra

53,5

49,7

Dilma Rousseff

21,3

28,7

Branco/Nulo

15,2

13,4

NS/NR

10,1

8,3

 

            O CNT/Sensus, como tradicionalmente faz, aferiu a avaliação e as expectativas dos entrevistados em relação a um conjunto de políticas públicas que atingem a maioria da população. Indagou também a respeito da condução que o Governo Federal está dando ao tema da crise financeira internacional. Desta forma ficamos sabendo que a elevação da aprovação ao Governo Lula está relacionada com a percepção de que o Governo tem conduzido satisfatoriamente o País em meio à turbulência mundial, e com a melhoria da avaliação e expectativa com à situação do emprego, renda, saúde, educação e segurança.

            O Datafolha analisou a influência do Presidente Lula na sua sucessão, o apoio a um eventual terceiro mandato, a repercussão da doença da ministra Dilma e a importância que os eleitores dão a determinadas características ao escolherem um candidato à Presidência. Vejam alguns dos atributos investigados pelo instituto: a) Nunca tenha se envolvido em casos de corrupção; b) Tenha experiência administrativa; c) Tenha um passado político conhecido; d) Não tenha problemas de saúde; e) Seja religioso; f) Seja casado. Poucas vezes o desenho de uma pesquisa revelou com tanta eloqüência a quem ela serve. Para sorte da ministra Dilma, a lista está em ordem decrescente de importância.

 

Porto Alegre, terça-feira, 02/06/2009

 

 Roberto Garcia.

Pós-graduado em Sociologia e Ciência Política

Sócio-fundador da Studio Pesquisas

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