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“Guerra civil”. A crônica da derrota da sociedade

O jornalista Bob Fernandes, já citado aqui algumas vezes, é um dos melhores profissionais do pais. E, com certeza, está entre os textos mais corretos, equilibrados e fundamentais para quem gosta do bom jornalismo.

Ah, e é repórter – daqueles que observam com o devido cuidado e precisão. Nesta terça-feira ele dá mostra, mais uma vez, de sua incrível sensibilidade. Editor do site Terra Magazine, alojado no portal Terra ele fez a crônica de uma noite fantástica – a vivida pelos paulistanos. E sintetiza um sentimento horroroso, o da derrota da sociedade diante do crime. Vale a pena ler:

”Eles venceram

Sete da noite. A avenida Faria Lima está deserta. Nem uma pessoa em frente ao Shopping Iguatemi, que já cerrou as portas como outros 21 shoppings da cidade. Avenida Rebouças. Vazia. Ladeira que contorna o estádio do Pacaembu, deserta. Faculdade Alvares Penteado, portões cerrados. Bar Boim Bom, que disputa os alunos – e costuma vencer – da FAAP. Grades trancadas, luzes apagadas.

Barcelona, padaria de célebre pãozinho na Praça Vilaboim, no bairro de Higienópolis, vizinho ao Pacamebu. Fechada. O Drogão, aberto 24 horas, farmácia de preços que esfolam incautos, portas trancadas. Banca Vilaboim, jamais fechada em sua história de mais de duas décadas. Letreiro aceso. Só o letreiro.

Oito da noite. Home-vídeo, portas de ferro já abaixadas. Silêncio absoluto na Vilaboim. Shopping Higienópolis, à avenida de mesmo nome, vizinho à delegacia anti-sequestro. Tudo escuro, fechado.

Dezessete graus, oito e meia da noite. Das ruas Pernambuco, Maranhão, Bahia, Sergipe, desapareceram os seguranças – quase sempre PMs de folga – que juntam-se às grades e circuitos eletrônicos para garantir paz e tranqüilidade numa das regiões mais ricas de São Paulo.

Celso, ex-sargento PM, taxista na Vilaboim, atesta:

– Nunca, em 15 anos, vi a banca da Vila, fechar, em dia nenhum. Nunca vi esse silêncio aqui, nem na madrugada.

Digam o que disseram as autoridades, a cidade de 12 milhões de habitantes se rendeu a Marcola, Julinho Carambola e Gegê do Mangue. Eles venceram. Os paulistanos se trancaram em casa. Ao menos, desde o início da noite, se esconderam os que normalmente se exibem.

Festas e jantares de quem pode festejar foram cancelados. As assessorias foram avisadas e avisaram repórteres e fotógrafos: nesta noite os “famosos” não sairão às ruas. Aquela foto-surpresa previamente agendada não vai rolar. Operação Lavoisier para colunas e sites de celebridades; nada deve se perder, tudo deve ser reaproveitado. Inclusive aquela foto da semana passada.

Mergulho no túnel que dá acesso à avenida Paulista. Ali, onde o ex-prefeito Serra permitiu que se erguesse a rampa de concreto anti-mendigos. Vazio absoluto. Como testemunhas, vizinhas ao concreto anti-pobres, apenas duas crianças mortas.

Crianças Mortas, de Di Cavalcanti (1944). Pintadas no túnel, as duas imagens, justamente elas, na parede que antecede e se une em simbiose ao monumento anti-pobres. Alguém do marketing vacilou. Ou bem não faziam a rampa ou que providenciassem uma mão de tinta para enterrar as Crianças de Di, mortas de miséria e fome.

Avenida Paulista, em frente à entrada da estação Consolação do metrô. Um bloqueio, patrulha da PM. Jovens soldados, olhos arregalados, mãos nas armas, olham para os escassos automóveis que ainda teimam em circular.

Alameda Santos. Restaurante Massimo, nove e meia da noite. Luzes apagadas, portas cerradas. Ministro Rocha Azevedo. Spot, delicioso restaurante e bar, freqüência de paletó-gravata-advogado-stock brockers no almoço; na noite, descolados, e heterodoxos, em busca de alguma coisa, mesmo que só a busca. Tudo apagado. Um man in black se aproxima:

– Não pode fotografar.

– Como não? Aqui é…”


SE DESEJAR ler a íntegra da reportagem de Bob Fernantes, pode fazê-lo acessando a página do Terra Magazine na internet, no endereço http://terramagazine.terra.com.br/

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