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ENTREVISTA. Marcos Rolim: ““Minha missão é abrir o Tribunal de Contas à sociedade”

 

Por Fritz Nunes (em colaboração especial para o sítio)

Marcos Rolim: uma tarefa inusitada (e para muitos surpreendente), na assessoria de comunicação do TCE
Marcos Rolim: uma tarefa inusitada (e para muitos surpreendente), na assessoria de comunicação do TCE

Ele é formado em jornalismo pela UFSM, mas, sua trajetória é marcada pela política e, nela, a bandeira dos direitos humanos. Marcos Rolim formou a primeira bancada petista na Câmara de Vereadores de Santa Maria, entre 1983 e 1988. Foi duas vezes candidato a prefeito (1988 e 1992) pelo PT, legenda pela qual foi deputado estadual por dois mandatos (1990 a 1994 e 1994 a 1998). Exerceu ainda um mandato como deputado federal, entre 1998 e 2002. Não reeleito em 2002, Marcos desistiu de concorrer a cargos públicos e foi fazer curso de pós-graduação na Inglaterra. Atualmente, além de doutorando em Sociologia e professor do Instituto Metodista de Porto Alegre, aceitou mais um desafio: prestar consultoria ao Tribunal de Contas do estado (TCE-RS), bastante desgastado a partir das denúncias contra o seu então presidente, João Luiz Vargas. Na entrevista a seguir, Marcos Rolim, já adentrando a um cinqüentenário de vida, fala de sua desfiliação ao PT, do apoio à candidata Marina Silva (PV) à Presidência da República, sobre o fim da exigência do diploma para jornalista e, sobretudo, sobre a nova tarefa que assumiu. Rolim diz que a sua “missão é abrir o TCE à sociedade”. Acompanhe a seguir:

– Em que consistirá o seu trabalho junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS)? Será um trabalho de recuperação de imagem, marketing ou vai além disso?

Uma política de comunicação não se confunde com a mera divulgação ou marketing. Ela auxilia a estruturar o próprio trabalho da instituição. Não apenas para prestar contas à sociedade das posições e dos resultados alcançados pelo TCE, mas para envolver a cidadania no trabalho de fiscalização. Penso, por exemplo, que devemos ter uma forma segura para receber denúncias anônimas de malversação do dinheiro público, em todas as áreas. Tradicionalmente, as Cortes de Contas no Brasil menosprezaram esta necessidade de uma articulação mais orgânica com a cidadania. Agora, penso que há condições para superar esta fase. O futuro presidente, Conselheiro João Osório, me convocou com a missão de abrir o TCE à sociedade; é o que farei.

– Os Tribunais de Contas, sejam os TCEs ou o TCU, funcionam essencialmente pela indicação política, e fazem parte desses órgãos políticos “aposentados”. Achas que esse modelo funciona bem ou deveria ser alterado?

Não está escrito em qualquer lugar que os parlamentos devam indicar políticos para as vagas dos Tribunais de Contas. Se quiserem, podem indicar qualquer cidadão, desde que de reputação ilibada. O problema não está exatamente na indicação de políticos, mas no fato de que a dinâmica atual permite que maus políticos possam ser indicados. Em 2003, o senador Luiz Otávio foi indicado para Ministro do TCU. Na época, ele respondia a um processo criminal, acusado pelo desvio de 13 milhões de reais do BNDES. Uma ação proposta por um auditor do TCU, entretanto, barrou a indicação e o Congresso foi obrigado a recuar.  Na dinâmica atual, há a possibilidade de que interesses espúrios articulem parlamentares e se sabe que vagas nos Tribunais têm despertado o interesse, por exemplo, de grandes empreiteiras.  O ideal seria encontrar outra forma de indicação. Se os partidos apresentassem seus nomes e houvesse uma agenda de debates com a sociedade civil, isto já seria um grande constrangimento àqueles que não possuem o perfil exigido. A imprensa poderia ajudar. Na Assembléia Legislativa, há propostas de alteração desta dinâmica – apresentadas pelo PT, aliás – que nunca foram votadas e que também nunca receberam qualquer destaque na mídia.

– Há até mesmo setores que defendem a extinção desses tribunais, pois o trabalho de fiscalização poderia ser assumido, se já não o é, pelo Ministério Público. Qual a sua avaliação?

Há cerca de 20 anos, eu sustentava esta opinião. Na época, desconhecia a complexidade do Estado moderno e desprezava o papel de órgãos de controle como instituições independentes. Já há muitos anos, entretanto, me dei conta de que em sociedades complexas e democráticas é preciso multiplicar as instâncias de controle e não concentrá-las. O papel do Ministério Público é completamente distinto das Cortes de Contas que atuam também na prevenção de irregularidades administrativas e contábeis – inclusive com medidas cautelares que podem suspender obras públicas. Além disso, o recurso das auditorias operacionais permite aos Tribunais de Contas que a eficácia de programas e de políticas públicas seja avaliada. Este, aliás, me parece ser o mais fascinante dos desafios aos Tribunais de Contas: avaliar a eficácia dos gastos públicos e, portanto, impedir que gestores irresponsáveis e incompetentes sigam jogando o dinheiro do povo pelo ralo.

– Em entrevista recente a um jornal de Santa Maria, o sr. falou que se desfiliou do PT porque esse partido, hoje, não tem mais nada a ver com o partido no qual o sr. militou. Falou também de que o PT não tem mais projeto. Em que o momento o sr. acha que o PT teve um projeto para o país e em qual momento abandonou esse projeto?

O que afirmei é que o PT não possui, já há muito tempo, posição sobre qualquer tema relevante. Ao longo de sua formação o PT consolidou um programa de governo com ideias generosas e com uma vocação transformadora. Havia, também, muitas lacunas neste processo. Temas centrais como a reforma do Estado, o desenvolvimento sustentável, a política criminal e a própria reforma política nunca foram definidos pelo partido. Estas lacunas foram sendo preenchidas por um discurso ideológico que galvanizou a militância e inflou o País de esperança. Uma vez no governo, entretanto, o PT fez uma clara opção pelo pragmatismo. Ao invés de construir um caminho, preferiu o atalho. Isto não significa que o governo Lula não tenha desenvolvido iniciativas meritórias. Pelo contrário, estou entre aqueles que consideram muitas das políticas públicas do atual governo importantes para o Brasil. O problema é que ao preferir “operar por dentro” da tradição, o governo fixou seus próprios limites, em termos que, para mim, não são aceitáveis eticamente. Neste atalho, o PT foi engolido. A paixão e a firmeza de princípios se retiraram, sendo substituídas pelo cinismo e pela militância a soldo. O resultado é que o PT virou um deserto de ideias e os sacripantas se sentiram em casa.

– O sr. também fala em apoiar Marina Silva (senadora do PV, que já foi do PT). No seu entendimento, o PV tem um projeto para o país? Votaria em Marina Silva mesmo com o P-Sol na candidatura a vice?

O PV está sendo refundado. O ingresso da senadora Marina se deu a partir do entendimento de que é preciso renovar o programa do partido. Nas eleições, de qualquer modo, o programa de Marina Silva será a única alternativa transformadora. Todas as demais candidaturas serão versões conservadoras do atual modelo político e econômico. Quando votei em Lula, o vice era do PRB. Porque não votaria em uma chapa com o vice do P-SOL? Aliás, muito melhor o P-SOL que tem desempenhado importante papel na luta contra a corrupção. Quem vai enfrentar dificuldades, neste particular, é a candidatura Dilma (Roussef) que terá na vice a banda podre do PMDB.

– A sua trajetória é historicamente marcada pela defesa dos Direitos Humanos. Como avalias a recente criminalização dos movimentos sociais, em especial, do MST?

O atual governo do estado fez uma opção pelo confronto com os movimentos sociais, desde seu início. Agora, a polícia que se encontra sucateada e com milhões de inquéritos inconclusos é convocada pelo governo a indiciar lideranças sindicais. A opção já evidencia o tamanho do governo que temos. Quanto ao MST, penso que algumas de suas ações têm permitido a erosão de seu patrimônio político e moral, porque situadas à margem da lógica democrática. Por conta disso, seus tradicionais inimigos têm tido sua tarefa facilitada. Penso que ser “radical” é ser capaz de mudar a realidade. Quando nossas ações dificultam a mudança e isolam o movimento, é sinal que algo vai mal. Por outro lado, há quem imagine que a repressão e o direito penal derrotarão o MST. Quem jogar suas fichas neste caminho, entretanto, perderá a aposta.

– O sr. se formou em jornalismo pela UFSM. Como se sentiu quando soube que fundações de dentro da universidade e nomes importantes da instituição se envolveram no escândalo do Detran?

Como todos, fiquei chocado e, sobretudo, triste. Penso que os fatos abalaram não apenas a imagem da UFSM, mas da própria cidade.                                          

– E por falar em jornalismo, como avalias o fim da exigência do diploma para exercer a profissão, e ao mesmo tempo, a tentativa de aprovar uma emenda constitucional que restabeleça essa obrigatoriedade?

Diplomas não oferecem garantias de competência ou decência, mas a não exigência deles deprecia e degrada a atividade profissional do jornalismo. Por isso, espero que o Congresso Nacional restabeleça a obrigatoriedade e corrija esta aberração.

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2 Comentários

  1. grande nome! grande político! boa sorte ao companheiro rolim!
    sua tarefa será de grande importância para a sociedade gaúcha!

  2. Esta é uma figura que se pode dizer de fundamento. Lembro com alegria que em 1992, apoiamos o Marcos para Prefeito. Não me arrependi. Sua trajetória diz tudo. Quando estive Diretor do CCSH/UFSM me coloquei lado-a-lado na luta pelos direitos humanos e seu projeto na AL. Valeu.

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