Os constrangimentos diários do povo humilde – por Marionaldo Ferreira
A servidora pública, a intimação e os “discursos hipócritas sobre honra ferida”

No Brasil profundo, onde a vida pulsa entre as frestas da desigualdade, o povo humilde acorda cedo, bem antes do sol. Não por escolha, mas por necessidade. O maior constrangimento não é ser abordado por uma câmera, mas sim abrir os olhos e não ter um trabalho certo, não saber se a comida da manhã vai se repetir no jantar. É sair com esperança e voltar com frustração.
São milhares de homens e mulheres que enfrentam, todos os dias, olhares de desconfiança ao entrarem num shopping, portas fechadas ao pedirem emprego, humilhações veladas ou explícitas no transporte, nas filas, nas entrevistas. Gente que engole o orgulho para pedir fiado, para aceitar qualquer bico, para ouvir sermões de patrões arrogantes. Isso, sim, é constrangimento.
Constrangimento é uma mãe que precisa escolher qual dos filhos vai comer melhor naquele dia. É um pai que mente dizendo estar tudo bem, quando o estômago reclama em silêncio. É um jovem negro que ao sair de casa precisa pensar na roupa que vai vestir para “não parecer suspeito”. É uma idosa que trabalhou a vida inteira e hoje mal consegue pagar os remédios.
E enquanto isso, vemos uma elite política e econômica tratando como tragédia pessoal um simples cumprimento do dever legal – como no recente caso em que uma servidora pública, no exercício de sua função, entregou uma intimação ao ex-presidente da República e foi acusada de “constranger” alguém que ocupou o cargo mais alto do país. Ora, isso não é constrangimento. Isso é justiça em funcionamento.
O verdadeiro constrangimento, o que fere a dignidade humana todos os dias, está nos rostos das pessoas esquecidas pelas políticas públicas. Está nos bairros onde a saúde não chega, onde a educação é sucateada, onde a segurança é ausente. Está nas mãos calejadas de quem só quer uma chance, uma porta aberta, um país mais justo.
Que não confundam a dor do povo com narrativa. O Brasil real não vive em Brasília. Vive nos morros, nos vilarejos, nas periferias. E esse povo merece respeito, oportunidade e dignidade – não migalhas nem discursos hipócritas sobre honra ferida.
(*) Marionaldo Ferreira é servidor aposentado da UFSM. Tecnólogo em Processos Gerenciais, Especialista em Administração e Marketing, Psicanalista em formação e tem, também, MBA em Gestão de Projetos. Seus textos são publicados nas madrugadas de segunda-feira.
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