Artigos

O jogo – por Bianca Zasso

Amor e morte parecem duas coisas muito distantes uma da outra. Mas uma simples história de amor foi a responsável por trazer até as telas um dos mais belos filmes sobre a morte. O sétimo selo, lançado em 1957 e dirigido por Ingmar Bergman só pode ser realizado porque o filme anterior do diretor, a comédia romântica Sorriso de uma noite de amor foi bem recebido no Festival de Cannes de 1956. Com o sucesso do longa, não faltaram ofertas de produtores para Bergman rodar aquele que seria um filme icônico em sua carreira cheia de grandes momentos.

Ingmar Bergman, um dos maiores diretores do cinema mundial e talvez o mais significativo nome da cinematografia escandinava, ao lado de Carl Theodor Dreyer, conduz com maestria a trama sombria de O sétimo selo. Em plena idade média, um cavaleiro volta para casa depois de participar das Cruzadas. Além dos ferimentos físicos, ele se depara com um mundo em decomposição, já que a peste negra assola seu país natal e a morte está em todos os cantos.

Seguindo a linha de seus contemporâneos, Bergman pega o tema do homem em crise e acrescenta o elemento fantástico quando dá um rosto e um corpo para a morte, que deixa de ser apenas um sentimento sufocante para tornar-se um ser que persegue o cavaleiro desiludido com a realidade que o cerca. E é nos traços expressivos do ator Bengt Ekerot que Bergman encontrou a face de seu personagem mais icônico.

Mesmo sendo ambientado no período medieval, O sétimo selo apresenta em seu roteiro um dilema típico do século XX: o ser humano já não encontra na fé um sentido para sua vida e sai em busca de novos nortes, novas possibilidades de seguir em frente com esperança. A religião, que guiava a escolha dos homens até então, das mais singelas até decisões grandiosas, estava saindo de cena. Em seu lugar, entra a crise. Quem somos? Para onde vamos? De onde viemos? Pelo que vale a pena lutar e viver? Perguntas aos montes e quase nenhuma resposta.

Está iniciado o labirinto. É numa dessas curvas de uma estrada aparentemente sem saída que nasce uma das cenas mais inesquecíveis do filme. Com a chegada da morte, o cavaleiro vacila e se diz inapto para morrer. Ao invés de discutir com a Morte, ele joga com ela uma partida de xadrez. Uma cena simples, sem efeitos especiais, com poucos diálogos e simplesmente impossível de esquecer.

Em uma de suas últimas entrevistas, Bergman, que morreu em 2007, revelou que viu uma imagem que retratava o jogo de xadrez entre a morte e um homem numa igreja da província de Uppland, na Suécia.

O sétimo selo foi lançado no auge da Guerra Fria e caiu como uma luva para um mundo em constante alerta com os perigos das armas nucleares. Mais do que um retrato metafórico e poético de sua época, o filme é uma obra de arte única, que nos coloca em xeque, perdidos no tabuleiro da vida. Em sua última cena, O sétimo selo nos presenteia com a dança da morte, executada a beira de um precipício. O público sai da exibição vivenciando um misto e encantamento e dúvida. Afinal, a morte está em todos os cantos e nosso encontro não costuma ter hora marcada. Como já diria um outro grande filme, a morte pede carona. E com mestre Bergman ela joga xadrez.

O sétimo selo (Det sjunde inseglet)

Ano: 1957

Direção: Ingmar Bergman

Disponível em DVD e Blu-Ray

 

 

 

Artigos relacionados

ATENÇÃO


1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.

2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.

3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.

4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.

5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.


OBSERVAÇÃO FINAL:


A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.

Um Comentário

  1. Guerra Fria, Anos de Chumbo no Patropi… Será que precisamos viver sob coação-tensão para que apareçam os gênios? A Suécia sentia-se pressionada por estar no meio do caminho entre URSS x EUA; e, no Brasil Militarista, surge um Chico Buarque com suas ‘construções’…

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo