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A lei da vida – por Bianca Zasso

Almodóvar já não é mais o mesmo. Perdi a conta de quantas vezes ouvi essa frase da boca de amigos tão cinéfilos quanto eu. Não posso negar que há muito de verdade nessa afirmação, mas acho que não existe melhor maneira de explicar o presente do que dar uma conferida no passado.

Revi há poucos dias A lei do desejo, um dos primeiros trabalhos de Almodóvar. As lembranças que eu tinha do VHS gasto que me permitiu o primeiro contato com o filme sumiram. Não sei se foi o tamanho da tela ou a melhor qualidade da imagem, mas o impacto foi grande. A lei do desejo é loucura, personagens tão intensos que trazem um eterno desespero no olhar, mesmo nos momentos de felicidade. Isso sem contar o flerte com o suspense hitchcockianos e as atuações incríveis de Carmem Maura e Antonio Banderas. Rever A lei do desejo me trouxe a vontade de rever Matador, Mulheres à beira de um ataque de nervos, Que fiz eu para merecer isto, Labirinto de Paixões, De salto alto e A flor do meu segredo. Ou seja, os primórdios de Almodóvar. E tudo isso por culpa do tempo que passa.

É normal, quando se começa a sentir o peso da idade, ter arroubos de juventude. É como se quiséssemos enganar a nós mesmos. Tentamos ser jovens ao extremo para não aceitarmos que é a velhice que está chegando e não a adolescência. A lei do desejo é como o início da vida: amargo, arrebatador e confuso. A história da paixão doentia do jovem Antonio pelo cineasta Pablo vai além e se torna uma metáfora de como somos passionais em nossos primeiros amores. Passionalidade essa que vai abrandando com o tempo, até nas personalidades mais fortes.

Almodóvar ficou mais “light”, não há como negar. Mas continua sendo Almodóvar. O sexo sem pudor, a paixão, a Espanha liberta, as mulheres, a música e o cinema continuam lá, mas em outros formatos. Almodóvar passou de jovem rebelde e chocante para um homem livre e refinado. Suas lágrimas têm novos motivos para surgirem. Almodóvar cresceu e preservou sua essência. Não quis, como muitos de sua geração, forçar a barra em nome de um estilo. Seus medos mudaram, seus sonhos mudaram. Não é natural que seus filmes mudem também?

Gosto muito de Almodóvar. De todos os que existem dentro dele. De Pepi, Luci e Bom até A pele que habito. Um novo trabalho seu está previsto para estrear em 2013, chamado Os amantes passageiros e será uma comédia. Agora ele quer fazer o público gargalhar. Nada mal para quem gostava de chocar até em cenas de romance. Almodóvar continua o mesmo, meus caros. Nada mudou no espanhol. Ele só está seguindo a lei da vida. Que é movida pelo desejo, sempre.

 

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