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Suicídio e Silêncio – por Liliana de Oliveira

Na minha família, suicídio foi por muito tempo um tema proibido. Nas reuniões de final de ano em família quando alguns bebiam e lembravam-se do passado, meu pai sempre falava do pai dele e se emocionava. Lembro-me sempre de ver meu pai emocionado a ponto de lhe faltar a fala. Só depois de muitos anos, viemos saber que meu avô (que era quase tema proibido) havia se suicidado.

Há muitos suicídios e muitos silêncios. Esse é um tema do qual não se fala. É um tema que parece nos envergonhar quase como uma desonra ou uma incapacidade de perceber o outro e impedir que o suicídio ocorra. Acreditamos na nossa onipotência e acreditamos que poderíamos deter o outro no gesto humano desesperado e libertador de acabar com a própria vida. Sim, libertador para aquele que sofre as dores do mundo e que sente o peso da existência.

Sempre ouvi que o suicídio era um ato de covardia e durante toda minha infância e parte da adolescência acreditei nisso. Depois de ler o Sofrimento do Jovem Werther, de Goethe, de ler textos filosóficos e perceber que talvez esse seja o grande tema da filosofia e de ter encontrado algumas pessoas que sistematicamente pensavam em suicídio fui obrigada a repensar e desacreditar que o suicídio era um ato de covardia.

O suicídio é o ato desesperado daqueles que sofrem de tristeza, angústia e infelicidade. E confesso que ele sempre me choca profundamente. Me choca a possibilidade que temos de acabar com a própria vida. Me choca essa força que contraria aquilo que é mais forte em nós, que é nosso movimento em direção à vida. Me choca pensar que em alguns a infelicidade é tamanha que não encontram outra alternativa que não a morte. Me choca pensar que para alguns tantos a vida não se justifica por ela mesma. Me choca, mas eu compreendo.

Compreendo que vivendo num mundo onde a incapacidade de ver o outro é frequente, onde o corpo não é incorporado, onde as relações são fluidas, onde o sentido está naquilo que se consome, a perda de sentido impera. As doenças psiquiátricas aumentam consideravelmente e a taxa de suicídio (segundo o relatório do World Health Organization) cresceu 60 % nos últimos quarenta anos.
Pergunto-me: o que aconteceu nos quarenta anos? Acredito que estejamos vivendo a epidemia do sofrimento psíquico. Por isso, precisamos falar sobre suicídio, precisamos dar visibilidade às doenças psíquicas, precisamos repensar nosso modo de vida, precisamos nos repensar enquanto humanidade. Talvez assim, consigamos nos reconectar com nós mesmos e constituirmos um movimento de afirmação da vida.

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