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Futuro Indicativo – por Pylla Kroth

Com a velocidade que a coisa anda às vezes me assusto. Lembro de mim menino, deitado na sala, aprendendo a ler e a compreender as notícias, debruçado sobre o Jornal Correio do Povo, que a vizinha emprestava para minha mãe um dia depois da publicação. Eu era do tamanho do jornal, pois este era impresso em formato standard, ou seja, o dobro do tamanho tablóide tradicional dos dias atuais. Que saudades daquele cheiro de tinta e papel jornal!

Quem nunca tomou um café da manhã com um jornal aberto ao lado?

Sinceramente, não creio no fim da era impressa na comunicação, mas a cada dia os diários intensificam migrações para a internet. De todo o modo, menos mal que isso ainda não significa o fim do jornalismo. Mas que esta área anda carente de bons profissionais, ah isto anda!

Houve um tempo em que o jornalista era quase uma autoridade, era tratado com nobreza. Espero que o prazer da leitura nunca tenha fim em mim! Amo ler jornais, às vezes eu leio até jornais velhos, tenho essa mania. Torço para que se perpetue esse hábito. A ecologia da mídia sempre será a mesma e isso já vem de 50 anos atrás: “o peixe grande come o peixe pequeno” (risos); e tem coisas que nunca mudarão: jornalismo político, que sempre deu prestígio, mas nunca receita (exceto em época de eleição). O que mantém um jornal são as páginas de celebridades, esporte e polícia, assim entendo.

E quanto aos livros penso o mesmo, que embora tenha surgido e ascendido o formato digital, nunca deixará de existir em sua tão adorada forma impressa. Assim como o cinema não acabou quando apareceu a televisão, esta arte que envolve toda a mítica e o fetiche por uma seção: o cheiro da pipoca, a companhia e o pretexto de sair de casa e esquecer por algumas horas os problemas da vida pós-moderna, ou ficar ao lado daquela amiga, que certamente tem um bom motivo para estar algum tempo ao seu lado. E cito também a evolução fonográfica que verticalmente ascendeu novas mídias tais como o CD, DVD, MP3, etc, e ainda assim não acabou com o bom e velho disco de vinil.

Acho mesmo que esses avanços são devidos à velocidade do mundo. E nisso não posso discordar. A civilização precisa ser ágil e rápida. Porém, isso não me tira o direito de me lembrar dos dias de luta que compartilhei com meus colegas. Pra quem não sabe, trabalhei por mais de uma década em oficinas de jornais, dentre os quais o saudoso Jornal A Razão.

Na redação, havia se não me engano no mínimo dez máquinas de escrever em ação quando eu entrava no expediente.  E por ali passava rapidamente antes de me dirigir para as oficinas e começar a confecção do referido diário. Ouço até hoje o barulho, a sinfonia que as máquinas faziam produzindo uma sonoridade incrível, todas em ação ao mesmo tempo. A fumaça do cigarro dos concentrados jornalistas, o cheiro forte do cafezinho sempre fresco, me trazem um gosto do tempo passado na garganta. A habilidade na datilografia dos danados era algo espantoso, cada qual com seu jeito de tocar o instrumento: até os “pipoqueiros” eram rápidos.

Mais ao fundo na sala da redação existia uma “geringonça” que era uma máquina da IBM que imprimia automaticamente informações Nacionais e Internacionais via Telex e esta parecia a bateria da banda dos jornalistas: de quando em quando o editor, que era o cantor do grupo, o chefe,  se dirigia até ela e fazia uma geral, separava as notícias fundamentais e com isso aliviava o volume de papel impresso acumulado.

A matéria era solicitada pelo editor em laudas que eram aproximadamente 300 palavras em 25 ou 30 linhas, se não estou enganado, e ali eram pautadas as matérias. Aprendi com vários jornalistas, velhos amigos, a atenção para cinco padrões básicos de uma pauta: assunto, fundamentação, problematização, de onde veio a notícia, e conclusão. Ou não, como diria Caetano. Do jornalista ia para o editor, que fazia os reparos e ajustes e posteriormente para o diagramador, que calculava os tipos e mandava para a composição. A máquina de composição era foto mecânica, digitava-se o texto e depois tirava-se o cartucho com cuidado para não velar o material, e assim se revelava o texto. Este era entregue ao revisor de textos compostos, para logo depois cair na mão do montador, que já tinha em mãos o espelho das páginas calculadas pelo diagramador, e conseqüentemente procedia as colagens dos textos tal como os títulos das notícias. Era neste momento que eu entrava em campo. Montava, deixava os espaços para as fotos e baixava para o fotolito. Muitos textos, por erro de diagramação, foram cortados no ofício. Alguns descobertos pelo chefe, muitos outros não. Depois era hora de mandar para o fotolito, também foto mecânico, que revelava em um filme as páginas, já em tamanho original. O resultado gerava um negativo para o montador de fotolitos, que assim fazia a montagem do dito, para logo depois casar as páginas a serem reveladas, desta vez em chapas de aço alumínio para a máquina de impressão.

Vejam bem – quanto trabalho e quantas pessoas envolvidas! Qualquer erro sobravam reclamações e “mijadas” para todos setores. Que diga Claudemir Pereira, meu editor chefe por vários anos e comandante de todo esse exército! Fato é que seguido ele era julgado e crucificado por todo batalhão, incluindo eu. (risos)

Hoje, com a evolução tecnológica, apenas uma pessoa por setor dá conta de fazer todo processo. Mas cá comigo penso que existem peças insubstituíveis. O bom jornalista, com toda certeza. Como poetizava um velho amigo jornalista: ”Ser jornalista é saber persuadir, é hipnotizar informando e informar hipnotizando, é ter um pé sempre atrás e a pulga atrás da orelha, é pensar o que ninguém pensou, é enfrentar reis, papas, prefeitos e presidentes, quanto mais chato melhor o jornalista, ser jornalista é ser ator, meio médico, meio advogado, meio atleta, meio tudo. Porque no fundo quem não gostaria de ser um pouquinho jornalista?”

E, bem, fico afinal por aqui com meu saudosismo de um tempo que não voltará jamais e desejando vida longa ao jornal impresso! Salve o jornalismo de verdade! Salve a liberdade de imprensa!

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