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ARTIGO. Michael Almeida Di Giacomo e o que muda com a MP da “Liberdade Econômica”: conta não fecha!

O país oficial e o país real

Por MICHAEL ALMEIDA DI GIACOMO (*)

Na última semana foi aprovada, na Câmara dos Deputados, a Medida Provisória da Liberdade Econômica. O texto agora repousa no Senado Federal (**). Ao empregador está liberado contratar com previsão de trabalho aos domingos. Assim, a cada quatro domingos, o trabalhador poderá ter uma folga remunerada. No entanto, se nesse período o empregador der a folga em outro dia da semana, não precisará pagar 100% pela hora trabalhada no domingo.

O ponto eletrônico – que é um meio de o trabalhador comprovar que exerceu seu labor durante o período exato ao contratado – agora só será obrigatório para empresas com mais de 20 funcionários. Ou seja, quem irá controlar, ou como comprovar os excessos? Não importa.

Estes são dois pontos a flexibilizar a legislação trabalhista. Há outros mais, porém os dois são emblemáticos e servem para que nós possamos perceber o grau de retrocesso que o Brasil está a trilhar.

O que se quer é aliviar a carga sobre a classe dirigente e, em mesmo sentido, vilipendiar a força de trabalho. A contrapartida vem com a promessa – mais uma vez – de que em poucos anos a reforma – mais uma – irá gerar 3, 6 milhões de novos postos de trabalho. Se somarmos com a última reforma trabalhista, 6 milhões de novos postos, o problema do desemprego no Brasil estará resolvido em pouco tempo. É a narrativa.

O problema é que a conta não fecha, pois há anos continuamos acima da casa dos 10 milhões de desempregados. Isso em dados oficiais, pois no mundo real o número certamente é bem maior.

Nesta (des)construção, o ser humano é só mais uma peça em uma engrenagem a cada dia mais desumana. E esse contexto é fruto do conservadorismo de uma classe dirigente submissa ao capital, a qual não consegue propor uma saída para o Brasil retomar o crescimento econômico.

O discurso da liberdade é o mantra oficial. Mas, assim como nas revoluções iluministas, está ao alcance de poucos e é a salvaguarda para o capital especulativo.

A narrativa é: “você prefere ter emprego ou direitos?”.  Eu, particularmente, prefiro que as pessoas sejam respeitadas em sua dignidade. E isto, no meio laboral, significa ter acesso a qualificação e, assim, estar apto as oportunidades. É ser parte na distribuição do “bolo” e não somente servir de massa para o seu crescimento.

Ao governo cabe a obrigação de, a partir dos recursos disponíveis e da riqueza gerada no país, implantar políticas econômicas que combinem a geração de postos de trabalho com atenção ao bem-estar das pessoas.

Enquanto isso não ocorrer, nós continuaremos a viver em um país que, como escreveu Machado de Assis, pode ser visto sob dois aspectos: um, o país oficial, formado por privilegiados, que é caricato e burlesco; o outro, é o país real, formado pelo povo.

A diferença entre os dois conceitos é possível de perceber com uma breve ilustração: no país oficial, o deputado Marco Feliciano teve reembolsado pela Câmara Federal o valor de R$ 157 mil, pagos em um tratamento dentário, pois sofria de bruxismo. No país real, 11% da população não tem nenhum dente – perto de 16 milhões de pessoas, segundo o IBGE/2015.

Eu confesso que não acredito que as pessoas não consigam perceber o gigantesco abismo entre o país oficial e o país real. Entre a casa grande e a senzala. Entre o burlesco e a tragédia. Enquanto isso, ao povo que, à letra de Machado de Assis, “revela os melhores instintos”, cabe olhar com mais acuidade para o que está acontecendo.

(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestrando em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.

(**) ao escrever o artigo, a MP era o 1º item da pauta para ser debatida no dia 20 de agosto.

OBSERVAÇÃO DO EDITOR: A foto que ilustra este artigo é é um recorte da pintura ” Prelúdio de uma civilização”, do artista romeno Victor Brauner, e foi reproduzida deste do site da revista Prosa Verso e Arte: AQUI

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