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ARTIGO. Michael Almeida Di Giacomo e impunidade para os que cometem crimes contra a humanidade

O que nos conta a memória de um país

Por MICHAEL ALMEIDA DI GIACOMO (*)

A formação política, social e econômica de um país, a meu ver, passa também por conhecermos nossa história e o nosso legado para as gerações futuras. Desta forma, teremos capacidade cognitiva para compreender qual nosso papel no presente e em meio aos demais povos do mundo.

Nesse aspecto, no que se refere a direitos humanos e crimes cometidos contra a humanidade, no Brasil ainda há um longo caminho a ser percorrido. Alguns países já deram esse passo. É o caso da Argentina. O país vizinho, no ano de 2017, condenou 48 ex-militares por crimes cometidos durante o período da ditadura militar (1976-83). A pena, de prisão perpétua, teve por objeto, principalmente, os denominados “voos da morte”, em que oposicionistas eram jogados ao mar do alto de helicópteros das forças armadas.

Na Alemanha, país que sob o regime nazista sistematizou a eliminação em massa de judeus, desde a modificação do seu código penal, em 1993, negar o holocausto ou glorificar o nazismo, é motivo para sofrer uma condenação de até cinco anos de prisão ou pagamento de multas.

Masnão é somente no país alemão, pois, recentemente o Tribunal Europeu de Direitos Humanos decidiu, por unanimidade, rejeitar queixa de Udo Pastors, ex-deputado estadual alemão e membro do partido ultranacionalista de direita PND, que no exercício de se mandato difamou vítimas judias e negou o Holocausto.

O então deputado Pastors, em 2010, ao criticar um evento em memória ao Holocausto, afirmou que havia “uso político” e um “teatro de consternações” e “projeções de Auschwitz”. O parlamentar foi condenado pelo Tribunal da Comarca de Schwerin a oito meses de prisão, com pena suspensa, e pagamento de uma multa de 6 mil euros.

Ao recorrer à Corte Europeia restou estabelecido que o direito à liberdade de expressão não protege a negação ao Holocausto.  Há muitos outros exemplos de condenação na nação alemã. Aliás, o simples fato de fazer o sinal de cumprimento nazista é motivo para que você seja recolhido por um policial e responda pelo ato.

No Brasil, estamos vivendo um momento em que a falta de punição aos que cometeram crimes durante a ditadura militar (1964-85) serve como salvo conduto para que os partidários de violações de direitos humanos possam invocar práticas criminosas e totalitárias a fim de lidar com conjunturas políticas adversas sob um regime democrático.

Por consequência, um parlamentar federal ou mesmo um ministro de estado pode invocar o AI 5 a fim de tentar por medo aos movimentos sociais que se opõe ao governo. O próprio presidente da República, por meio de declarações nada republicanas, usa de uma verborragia ímpar ao invocar instrumentos de tortura praticados por seus colegas de farda durante o período militar. É possível perceber o tom de nostalgia na sua fala.

Por outro lado, reclama-se que a legislação penal brasileira é muito branda e leniente com o criminoso comum. O que é uma discussão possível de ser feita. No entanto, há crimes, como os citados, ainda mais nocivos ao povo de um país, e que não recebem atenção em nosso ordenamento. Porém, quem os pratica está no topo da cadeia alimentar. A esses, a brandura da lei é favorável.  É não há reclamações a respeito. A seletividade é inerente ao cidadão totalitário.

Enquanto nossa história não for realmente passada a limpo, mais e mais pessoas com sentimento de superioridade em relação aos seus iguais irão afrontar a democracia e os direitos humanos tão caros. Estejamos atentos.

(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestrando em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.

OBSERVAÇÃO DO EDITOR: A foto é do óleo sobre tela “Maus tratos e humilhações” (Freizeitgestalung), de Lise Forell. Nascida em Brno (Tchecoslováquia) em 1924, ela testemunhou cenas de violência e maus tratos. Amedrontada, fugiu com sua família para a Bélgica e de lá para a França, onde conseguiram vistos emitidos pelo embaixador brasileiro Souza Dantas. Partiram de Marselha em dezembro de 1940, mas foram presos e enviados para o campo de refugiados Sidi-El Ayashi, em Casablanca (Marrocos). Libertados, vieram para o Brasil onde desembarcaram em 25 de setembro de 1941. Acervo da autora -Arqshoah/Leer-USP, disponível AQUI 

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