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ARTIGO. Michael Almeida Di Giacomo, início do “mês da traição”, partidos e a tese das candidaturas avulsas

A “janela da traição”

Por MICHAEL ALMEIDA DI GIACOMO (*)

Amanhã, 5 de março, inicia o período no qual vereadores poderão trocar de partido, por justa causa, sem o temor de perda do mandato. Eu sei, não é uma relação trabalhista. Mas a justa causa pode ser invocada. A janela partidária vai até o dia 3 de abril. E como não podíamos fugir a nossa capacidade “criativa”, tornou-se senso comum nos referirmos a esse direito político-eleitoral como sendo a “janela da traição”.

O termo “traição”, na minha opinião, surge menos pelo que seja possível considerar como um ato de deslealdade do agente político e mais, em princípio, pelo suporte partidário que lhe foi disposto para alcançar êxito na eleição.

E quando falo em suporte partidário não estou a me referir diretamente aos aspectos de ordem econômica. Embora, em muitos casos, é de considerar que são fundamentais para a eleição. Mas, propriamente, na representação junto ao meio social e o quanto esse fator contribuiu de forma positiva estar filiado a determinado partido.

Nesse contexto, as nuances que devem ser consideradas são muitas. Como, por exemplo, o espectro político ideológico; a capilarização da estrutura partidária e a forma como o coletivo social se identifica com a agremiação. No entanto, essa é uma visão a partir do que poderíamos chamar de um mundo ideal. No mundo real, nos deparamos com outros conceitos que tornam o nosso processo político eleitoral, digamos, sui generis.

O fato é que a eleição, principalmente a proporcional, se dá com ênfase na personalidade do candidato e não na mensagem do partido. Aliás, são poucos os partidos nos quais seja possível identificar uma mensagem clara e coerente e essa é uma das variáveis a ser consideradas quando analisamos o processo eleitoral brasileiro.

Dessa forma, os programas políticos partidários acabam por se mostrar efêmeros aos olhos do eleitor. Com isso, a mensagem recolhida é a de que o que realmente importa é o candidato. O partido fica em segundo plano. Esse formato eleitoral, na minha opinião, é propício para que possamos discutir outros meios de representação. Refiro-me à candidatura avulsa ou candidatura independente.

O modelo que reconhece o direito aos cidadãos sem filiação partidária a disputar cargos eletivos é realidade há muito tempo em países como os EUA, Áustria e Islândia. E outras nações vêm promovendo essa experiência como a Itália e a Alemanha. Na última é possível destacar a eleição de Joachim Gauck à presidência, em março de 2012. Também em Portugal não há obrigatoriedade de filiação partidária para o cargo de Presidente.

No Brasil o debate sobre a possibilidade de candidatura avulsa ou independente não é recente. Atualmente está sob a guarda do Supremo Tribunal Federal o RE 1.238.853, que trata da matéria. E, segundo o Ministro Luís Roberto Barroso, poderá compor a pauta do Tribunal ainda no primeiro semestre de 2020.

A questão, como não poderia deixar de ser, gera muitas controvérsias. O cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma que “adicionar mais um elemento que aumenta a fragmentação na política brasileira torna o sistema mais pulverizado do que já é”.  Gilberto Martins, procurador-geral de Justiça do Pará, assinala que a possibilidade de candidatura avulsa significaria o reconhecimento de uma mudança corrente. Isso se dá, pois, “o povo já tem como referência grupos de eleitores e movimentos diversos das siglas partidárias”.

Em síntese, a participação política independente poderia favorecer movimentos sociais organizados, e também indivíduos que não queiram se submeter a regras e imposições internas de partidos políticos. Com o perdão pela figura de linguagem, seria possível ao eleitor diferenciar o Camelo do Dromedário, sem que isso fosse motivo de enfraquecimento da representação popular e também dos próprios partidos políticos.

(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestre em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.

Observação do editor: a imagem é uma reprodução de internet (AQUI, no original)

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Um Comentário

  1. Pois é Claudemir, as vezes a nossa idade tem suas vantagens, claro que as desvantagens vem junto. Quando no Brasil tinha o número bem pequeno de partido podia-se ver o político bem identificado com a filosofia do partido que integrava, mas agora com esse número excessivo de partidos me parece que a ideologia se perdeu. Não é incomum ver pessoas de um partido de esquerda e até mesmo de extrema esquerda se filiando a um partido de, pelo menos, centro direita. E claro vice-versa. Pessoas identificada como de direita indo para partidos de esquerda. A mim, que gosto de política e sou filiada ao PSDB desde sua fundação me parece que aquele que não consegue formar uma liderança num determinado partido pula pra outro onde pode ter melhor chance e até mesmo formar um novo partido. Outra coisa que para mim é muito claro é a questão do fundo partidário. Os partidos deveriam dividir igualitariamente o fundo partidários nas campanhas eleitorais. Nós dois sabemos muito bem que não funciona assim. O Fantástico mostrou bem como funciona, em alguns partidos, o tal fundo partidário. Sabemos que muitos partidos são sérios e investe segundo seus objetivos traçados para as próximas eleições, mas não podemos tapar o sol com uma peneira.

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