Quantas cidades do RS ainda vão desaparecer nesta pandemia?
Por VALDECI OLIVEIRA (*)
Diz o ditado popular que errar é humano, permanecer no erro é diabólico. A frase teria sido cunhada por Santo Agostinho no século IV. Há outras versões que apontam que continuar no erro é burrice ou, ainda, afastar-se de Deus. A autoria não importa, o fundamental aqui são as consequências que os erros, quando insistentes e perpetrados pelas autoridades públicas, causam às pessoas ou populações.
Infelizmente no Brasil, e no RS em particular, estamos vivenciando um desses momentos. Mesmo com a pandemia ainda em pleno curso e os testes com vacinas ainda não concluídos – alguns, inclusive, apresentando problemas colaterais -, nossos governantes avaliam que basta usar máscara e andar com um tubinho de álcool em gel no bolso que os nossos problemas desaparecem. Santa Maria e região têm registrado números que deveriam colocar a todos em alerta. Tem sido triste receber notícias de que parentes e amigos de longa data, aqueles que já tiveram uma relação muito próxima a nós, têm ido antes do tempo, de que estariam vivos não fosse esse inimigo invisível.
Mas, enquanto esse cenário for lido como “números” e não como vidas, a tendência é olhar para o lado e seguir em frente, participando de uma verdadeira loteria, cujas chances de “ganhar” são inúmeras e o prêmio todos sabemos qual é.
É público e notório que, no início de toda essa crise mundial, o Brasil optou por esperar pelos acontecimentos e não tomou as medidas necessárias baseadas na ciência. Assistiu ao vírus tomar conta dos países europeus a partir do final de janeiro. O alerta soou primeiro na Itália, a partir do péssimo exemplo de Milão, que desdenhou do isolamento social e, em questão de dias, registrou uma explosão no número de óbitos. Em março, o Reino Unido também teve de rever a sua débil política de enfrentamento à Covid-19 a partir da proliferação de casos e de mortes. o que obrigou o governo a rever suas ‘práticas”. O mesmo aconteceu na Espanha e na França. Na Alemanha e Portugal, onde os gestores levaram a questão mais a sério, os danos foram significativamente menores.
O que vimos na sequência foi que, depois aprenderem com seus erros e de terem tido certo sucesso no controle – não absoluto – da pandemia, esses mesmos países se sentiram seguros, relaxaram suas medidas restritivas de isolamento, retomaram as atividades econômicas, voltaram às aulas e a população começou a frequentar bares, boates, cafés e restaurantes. Porém, a conta chegou, e a Europa, que foi o epicentro seis meses atrás, está vivenciando neste momento uma segunda onda de contaminações e mortes. Lá, estão voltando atrás e retomando as restrições anteriormente tomadas, pois, no último domingo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) apontou um número recorde de casos diários, com 54 mil novos registros em apenas 24 horas.
E, por aqui, com um semblante de mero espectador alheio ao perigo, continuamos a não enxergar as falhas do Velho Continente e permanecemos no erro de não aprendermos com as falhas dos outros – e com as nossas próprias. E com essa postura corremos o sério risco de sequer passarmos pela chamada primeira onda. O que a lógica nos mostra é que emendaremos a segunda a essa, pois sequer chegamos a dispensar os recursos – tanto humanos como financeiros – necessários ao combate à pandemia que foram disponibilizados naqueles países.
Na prática, por questões ideológicas, políticas e econômicas, estamos insistindo nas posturas de outras nações que deram resultados erráticos. É compreensível que a população esteja estressada com todas as limitações, uma situação que um gestor público não pode se dar ao luxo de ter. Mas enquanto não houver segurança, testagem em massa, rastreamento de casos e uma droga que nos imunize é uma irresponsabilidade impor a retomada a uma vida normal como estão fazendo os governos federal, estadual e inúmeras prefeituras. Aqui no Rio Grande, na semana que vem, começarão a ser retomadas as aulas presenciais na rede pública. Haverá EPIs, álcool em gel, sabão e até papel higiênico à disposição dos alunos, professores e servidores?
Nesta sexta-feira (16), estaremos registrando 153 mil óbitos pelo novo coronavírus. Isso é mais da metade da população de Santa Maria. Essa trágica contabilidade é a soma das populações de São Gabriel e Santo Ângelo. É como se os habitantes todos dessas duas cidades, polos em suas regiões, simplesmente desaparecessem do mapa. Isso é muito grave e muito triste. Se não nos remobilizarmos contra a pandemia, o “desaparecimento” de cidades e de levas de gaúchos e gaúchas seguirá sabe-se lá por quanto tempo.
(*) Valdeci Oliveira, que escreve sempre as sextas-feiras, é deputado estadual pelo PT e foi vereador, deputado federal e prefeito de Santa Maria. Também é Coordenador da Frente Parlamentar em Defesa da Duplicação da RSC-287
Observação do editor: a imagem (sem autoria determinada) que ilustra este artigo é uma reprodução da internet.
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