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Algumas ponderações sobre as mulheres em tempos de guerra – por Elen Biguelini

Assim como existe uma falácia machista de que mulheres não trabalhavam (quando se sabe que a prostituição/trabalho do sexo foi a primeira profissão a existir na sociedade, que as camponesas nunca pararam de trabalhar, e que o trabalho de cuidar de uma criança é exaustivo e complexo), existe um mito de que mulheres não participaram (e participam) na guerra.

Esta questão voltou a mente da articulista esta semana, quando o mundo novamente se vê diante de uma invasão militar. Não discutiremos aqui a guerra da Ucrânia em si, mas sim a noção de que mulheres não tenham tido participação ou ação em tempos de guerra.

Muito antes de existir o conceito de “nação” que é hoje a parte mais importante para a guerra, as mulheres já participavam nos embates.

Não há relatos do primeiro conflito entre tribos/vilas/civilizações, mas esta articulista duvida muito que uma mulher não tenha pego em armas e defendido sua caverna e seus filhos de um invasor, assim como as senhorinhas ucranianas estão tentando fazer hoje.

Já falamos aqui das brasileiras Jovita Feitosa e Maria Quitéria, também mencionamos Joana D’Arc e Mulan, bem como a portuguesa Antónia Rodrigues e a espanhola Monja Alferes. Piratas também foram nosso foco em uma coluna.

Rainhas, princesas, condessas, etc. todas estas tiveram influência sobre seus reinados. A italiana Christine de Pizan escreveu sobre a Guerra dos Cem anos e o tema de nossa coluna anterior, a marquesa de Alorna, foi exilada para à Inglaterra por se posicionar contra Napoleão durante a invasão francesa de Portugal.

No mito criacional romano, o “Rapto das Atualmente temos presidentas, primeiras ministras, etc. Sabinas” representa que mulheres foram, inclusive, razões de guerras.

Segundo este mito, os descentes dos gêmeos criados por uma loba que fundaram a cidade de Roma, teriam invadido uma cidade próxima (e abusado e raptado suas mulheres), devido à falta de mulheres naquela que seria posteriormente a capital italiana.

A verdade é que, mesmo proibidas de participarem ativamente nos campos de batalha, mulheres agiram por trás: as espartanas faziam armas, existia todo um número de “chinas” que acompanhavam as batalhas da Farroupilha – nesta revolução há também um nome feminil importantíssimo, o de Anita Garibaldi-, na segunda guerra mundial eram enfermeiras, dirigiam veículos – a própria Rainha da Inglaterra, Elizabeth II, participou ativamente da II Guerra-, ou assumiram os postos de trabalho e fizeram com que os países cujos homens haviam partido para o campo de batalha não estagnassem economicamente.

E mesmo que nada tivessem feito, porque a função única de cuidar das crianças não é considerada atividade proativa em defesa de uma nação? Não são as crianças o futuro do mundo?

Bem, claramente, na atualidade, há discussões muito mais relevantes a serem feitas do que negar a participação e ação feminina em momentos históricos. Infelizmente, no entanto, apesar dos avanços da sociedade, o “machismo nosso de cada dia” ainda é presença diária no cotidiano feminino. E ouvir que mulheres não podem ter opiniões sobre as guerras, “porquê não as lutam” é apenas mais uma destas visões machistas que ignoram a realidade da sociedade atual e do passado.

(*) Elen Biguelini é doutora em História (Universidade de Coimbra, 2017) e Mestre em Estudos Feministas (Universidade de Coimbra, 2012), tendo como foco a pesquisa na história das mulheres e da autoria feminina durante o século XIX. Ela escreve semanalmente aos domingos, no Site.

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Um Comentário

  1. Mulheres não trabalham nunca ouvi, sempre vi e ouvi papeis diferentes. Não se sabe qual a primeira profissão simplesmente porque não há como saber. Alusão a prostituição é só mais um chavão. Mitos de mulheres guerreiras sempre existiram. Referencia mais recente acho que é o livro sobre as Amazonas de Adrianne Mayor. Nele aparecem até achados arqueologicos, tumbas de mulheres guerreiras (citas se lembro bem) achadas não longe da Ucrania. No Brasil lembro um livro de capa verde, não lembro o autor. O rio tem este nome não por acaso. Uma expedição desceu do Peru e no meio do caminho teria sido atacado por mulheres. Livro também aborda o fato de que existiam fortes indicios de que as tribos, ao menos por lá, teriam sido matriarcados. Não diferente de muitos lugares do mundo, no filme (e no livro) ‘O 13 Guerreiro’ existe alusão a isto. O rapto das Sabinas (existe um problema no texto acima, ou seja, nem o editor leu) é uma referncia a uma das tres tribos fundadoras, latinos, etruscos e sabinos. O rapto teria acontecido, de fato, pela falta de mulheres, algo que não era incomum em certas epocas. Os gemeos foram criados por uma loba, mas há quem especule que tenha sido uma prostituta. Motivo simples, ‘lupa’ era giria para profissional do sexo. Não para ai, russas lutaram na SG Mundial e no oriente medio, recentemente, entre os peshmerga. No Exercito Brasileiro existem mulheres que saltam de paraquedas. Opinião das mulheres sobre guerra é bem conhecida, a maioria é contra. No mais, qualquer um pode ter a opinião que quiser, sera julgada de acordo com o conhecimento sobre o assunto. Opinião de um(a) causidico(a) sobre educação, saúde, informatica, etc. não vale quase nada, por exemplo. Alguns membros da academia também se acham oniscientes.

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