Por Carlos Ismael Moreira e Lurdinha Mattos/Ascom SSP
Às 9h deste domingo (6), conforme o planejamento traçado pelas 28 instituições envolvidas ao longo do último mês, ocorreu a implosão da antiga sede da Secretaria da Segurança Pública (SSP), em Porto Alegre. O prédio foi atingido por incêndio em 14 de julho de 2021. No trabalho de combate às chamas naquela noite, morreram o tenente Deroci de Almeida da Costa, 46 anos, e o sargento Lúcio Ubirajara de Freitas Munhós, 51 anos, do Corpo de Bombeiros Militar (CBMRS).
Apesar do clima de melancolia que predominou entre os envolvidos na implosão, a operação de complexidade extrema foi considerada um sucesso. Do outro lado da avenida Castelo Branco, em uma área do cais às margens do rio Jacuí, o governador em exercício, delegado Ranolfo Vieira Júnior, acompanhou desde as 7h, na companhia das autoridades que formaram o Sistema de Controle de Incidentes (SCI) coordenado pela Defesa Civil Estadual, cada etapa do processo.
“O prédio foi implodido em uma megaoperação concluída com êxito. É mais uma importante etapa após o trágico incêndio que atingiu a estrutura na noite de 14 de julho. Manhã emocionante pelas lembranças de todos que, assim como eu, trabalharam neste prédio e tinham uma parte da sua história ali. Mas, acima de tudo, pela bravura dos nossos dois bombeiros que perderam a vida no combate às chamas, o tenente Almeida e o sargento Munhós. Agradeço a todas as instituições pelo empenho na realização desta importante ação que concluímos hoje”, disse Ranolfo.
No mesmo local, o caminhão do Departamento de Comando e Controle Integrado (DCCI) monitorou toda a atividade. Também a partir do amplo espaço no cais, a implosão foi eternizada pelas lentes e reportagens dos 80 profissionais de comunicação que se credenciaram para levar à veículos de todo o país relatos e imagens do acontecimento histórico. Foi a primeira implosão de um imóvel público em Porto Alegre e também a primeira operação do tipo desde a demolição do edifício das Lojas Renner, também destruído por um incêndio, em 1976.
Integração para superar complexidade da operação
As horas que antecederam a etapa final foram de intenso trabalho integrado para todos os envolvidos na operação. Ainda no final da tarde de sábado (5), profissionais da FBI Demolidora, empresa contratada para execução da implosão, finalizavam as conexões da rede de explosivos instalados nos pilares do prédio. Ao mesmo tempo, equipes da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) isolavam as áreas de estacionamento nas vias dentro do perímetro de segurança. À noite, foram montadas as estruturas do Posto de Verificação Veicular (PVV), entre a rua Comendador Álvaro Guaspari e o início da rua Santo Antônio, local que funcionou como área para posicionamento de viaturas das forças de Segurança e base das equipes de trabalho.
Às 7h deste domingo (6), efetivos da Brigada Militar e da Defesa Civil Estadual deram início à mobilização para desocupação de todos os imóveis num raio de 300 metros a partir do prédio da SSP. Notificados ao longo da semana anterior, moradores e trabalhadores da região deixaram aos poucos as edificações. Inclusive a rodoviária de Porto Alegre foi evacuada, e as chegadas e partidas de ônibus da capital passaram a ocorrer a um quilômetro dali, no terminal Conceição, embaixo do viaduto, entre as avenidas Farrapos e Alberto Bins.
As estações São Pedro, Rodoviária e Mercado do trensurb não abriram e o embarque e desembarque mais próximos da área central passaram a ocorrer apenas na estação Farrapos, onde ônibus foram disponibilizados pela EPTC para levar os cerca de 10 mil usuários do trem nas manhãs de domingo até o Centro da cidade.
Às 8h, quando o primeiro toque de sirenes avisou do encerramento de prazo para evacuação dos imóveis, equipes da fiscalização de trânsito municipal e efetivos da BM iniciaram os bloqueios em 14 pontos no entorno da área de segurança da operação. Ao mesmo tempo, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e funcionários da CCR Via Sul, concessionária da freeway, deram início aos desvios de veículos nas entradas da cidade no vão móvel e próximo da nova ponte do Guaíba, interrompendo por completo o fluxo na Avenida Castelo Branco.
Meia hora depois, ao segundo toque das sirenes, foi estabelecido bloqueio total à circulação de pessoas e veículos na região isolada. Mais 20 minutos e novo alerta sonoro deu por encerrada a inspeção final no perímetro. Cinco minutos depois, o penúltimo alerta pediu a atenção de todos. Faltando um minuto para às 9h, o toque final das sirenes deu início à contagem regressiva.
Excelência técnica para implosão segura
Cinco, quatro, três, dois, um. Acionado o botão do detonador, as explosões no térreo do prédio tiveram início praticamente instantâneo. À velocidade de mil metros por segundo, uma substância percorreu o tubo pirotécnico de 300 metros até o circuito de explosivos instalados em 1.184 perfurações de 1,02 metro de profundidade nos pilares dos quatro primeiros andares da edificação, dando início ao desabamento. Por segurança, a conexão principal com os cartuchos da marca Ibegel SSP – uma coincidência aleatória com a sigla da secretaria –, ligados entre si por 4,5 mil metros de cordel detonante, só foi finalizada momentos antes.
A queda da estrutura colapsada ocorreu conforme o plano elaborado pelo responsável técnico do serviço, o engenheiro de minas Manoel Jorge Diniz Dias, reconhecido na área como o profissional com maior know-how do país. O sucesso da operação se soma ao já celebrado currículo do expert, hoje mais conhecido pelo apelido de “Manezinho da implosão”, em virtude dos mais de cem trabalhos do tipo já executados.
Além do prédio da SSP, o engenheiro foi responsável pelas implosões do edifício Palace II, no Rio de Janeiro, em 1998, da penitenciária do Carandiru, em São Paulo, em 2002 (com uma segunda etapa realizada em 2005), do edifício Berrini, também em São Paulo, em 2008 – considerada uma das operações mais difíceis já executadas no Brasil – e do Estádio da Fonte Nova, em Salvador, em 2010.
A Secretaria de Obras e Habitação do Estado (SOP) foi responsável pela elaboração do parecer técnico que indicou a implosão como o método mais adequado e seguro. Coube também ao Departamento de Obras Públicas da SOP a fiscalização dos serviços.
As explosões ocorreram do primeiro para o quarto andar, com um intervalo de meio segundo entre um e outro. Em cada andar, a sequência foi a mesma. Começou pelos pilares centrais da edificação, de forma que parte já colapsada da estrutura deu início ao movimento de queda. Depois, seguiram em direção às duas extremidades laterais do prédio, com intervalo de 0,4 segundo de um pilar para o outro.
A sucessão de explosões também foi programada de forma que, além da direção horizontal do meio para as pontas, ocorreu primeiro nos pilares mais próximos da fachada principal, voltada para a rua Voluntários da Pátria, e seguiu até os que ficavam mais perto da face posterior do prédio, voltada para o Jacuí. Dessa forma, a ação da gravidade fez com que as duas torres de sustentação laterais cedessem em movimento diagonal para o centro e na direção do interior do terreno da SSP, evitando impacto na avenida Castelo Branco.
Limpeza do terreno deve ser concluída em até 30 dias
Tão logo a nuvem de poeira formada pelo desabamento do prédio assentou, equipes da FBI, da Defesa Civil Estadual e da SOP vistoriaram imóveis num raio de 50 metros, considerado área de alto risco, para certificar a inexistência de danos. A liberação do perímetro isolado teve início às 9h30.
A partir desta segunda-feira (7), começa o processo de remoção das 20 mil toneladas de entulhos que restaram no terreno. A remoção dos escombros e o descarte adequado faz parte das obrigações do contrato assinado pela FBI com o Estado, no valor de R$ 3.150.000.
Um conjunto de escavadeiras de 22 metros de comprimento e 23 toneladas será utilizado para carregar caçambas de caminhões que irão transportar o entulho. A localização do terreno, próximo a uma das principais vias de saída da capital, favorece o trabalho. Conforme estimativa da empresa, a limpeza da área deverá estar concluída em até 30 dias.
Duas décadas de história da segurança pública gaúcha
O prédio em que funcionava a antiga sede da SSP teve a construção concluída em 1972. Antes de pertencer ao Poder Executivo gaúcho, a área era da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA). Foi adquirida pelo Estado por meio de Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda, de Promessa de Cessão de Direitos e Transferência de Posse e outros pactos firmados com RFFSA em dezembro de 1998.
A inauguração da sede da SSP ocorreu no dia 5 de julho de 2002. Até então, o comando da pasta estava em prédio situado na rua Sete de Setembro, na área central da capital. O prédio na rua Voluntários da Pátria, 1.358, chegava a receber cerca de 2 mil pessoas em um único dia, entre servidores, colaboradores terceirizados, visitantes, autoridades em reuniões e alunos de capacitações.
Quando José Paulo Bisol, primeiro secretário de Segurança que se instalou no prédio, chegou em seu novo gabinete o nome da secretaria ainda era outro, Secretaria de Justiça e Segurança Pública (SJS). Em 2007, com o secretário José Francisco Mallmann, a secretaria voltou a adotar a nomenclatura que usa até hoje, SSP. Em 19 anos, passaram pela antiga sede, ao todo, 12 secretários, entre os quais Ana Maria Pellini, que chefiou a Segurança Pública por apenas 10 dias, sendo a única mulher até então a ocupar a cadeira de secretária de Estado na SSP.
Na inauguração, a SSP tinha em sua estrutura, além do gabinete do órgão central, o gabinete da Polícia Civil e o comando da Brigada Militar. No mesmo ano, a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) também ocupou o prédio.
Ao longo dos 19 anos da sede da SSP, na Voluntários da Pátria, diversos órgãos da Segurança Pública atuaram no local. O Comando de Policiamento da Capital (CPC), o Instituto-Geral de Perícias (IGP), o Departamento Estadual de Trânsito (DetranRS) e, mais recentemente, o Departamento de Comando e Controle Integrado (DCCI) da pasta.
Inaugurado em junho de 2014, o DCCI foi projetado para atender as demandas de segurança para a Copa do Mundo realizada no mesmo ano. A construção da central de videomonitoramento e atendimento de emergências, que ocupava dois andares do complexo (térreo com anexo e 2º andar), foi financiada pelo governo federal.
Depois da Copa, o DCCI se tornou a referência em videomonitoramento do Estado. Na época da competição entre seleções, eram 101 câmeras que podiam ser acessadas pelos operadores de segurança. Hoje, com os investimentos destinados à pasta, além de convênios firmados entre prefeituras e outros órgãos, como Trensurb e CCR Via Sul, o DCCI tem possibilidade acessar imagens de aproximadamente 2 mil câmeras.
A SSP funcionou na Voluntários da Pátria, 1.358, por 6.949 dias até o incêndio de 14 de julho de 2021. Passados 235 dias, deixa de existir fisicamente, mas permanecerá para sempre na memória histórica da capital.
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