O que é racismo? Por que a manifestação no show do Seu Jorge é criminosa? – por Débora Dias
O caso do clube da capital e indignação: “vergonhosa, triste e criminosa ação”
Esses breves comentários não têm a pretensão de ser um artigo jurídico, mas sim lançar idéias para debate, para reflexão. Mas ao mesmo tempo em que se tem esse objetivo, não há como desvincular de um raciocínio jurídico mínimo, básico, para que se saiba que a manifestação ocorrida no show do Seu Jorge é criminosa.
Eu diria, a princípio, que a conduta poderia ser enquadrada como injúria racial, sem maiores conhecimento sobre os fatos,; esse conhecimento maior somente com a investigação policial. Assim, conforme disposto no Código Penal, art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
…
§ 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência
Pena – reclusão de um a três anos e multa.
Essa é a definição de injúria racial para fins do Direito Penal, para fins de conduta criminosa. Mas também pode-se discutir se não é possível o enquadramento por racismo, artigo 20 da Lei de Racismo. Por que, da maneira como foi, não atinge toda uma coletividade? Isso ficará a cargo da Delegada Andréa, responsável pela instrução do inquérito.
Por outro lado, não há dúvidas sobre a conduta criminosa e racista de pessoas que estavam em um show de um cantor negro, as quais passaram a fazer sons e coreografias imitando macacos, inclusive gritando: macaco.
O fato ocorreu no dia 14/11/2022 no Grêmio Náutico União e foi vergonhosa e triste manifestação de racismo. E quando assisti, na televisão, a notícia do fato, tive um sentimento inicial de tristeza, depois vergonha, por ver tanta gente preconceituosa, criminosa, junta, exalando seu preconceito, a feiúra do preconceito, em um ambiente público, quero dizer, tinha muita gente gritando junto, fazendo gestos imitando macacos.
De maneira alguma quero dizer que se fosse a ambiente privado seria permitido, não seria crime. Não, de qualquer forma a conduta é racista. Mas o que choca é um grupo unido na intolerância, na discriminação, no preconceito.
E a pergunta que não quer calar? O que esse povo feio de coração, de alma, de caráter, acha que é superior, melhor do que alguém? A resposta é não, não são melhores; são piores, são seres que incitam o preconceito, o ódio, a discriminação pelo simples fato da cor da pele, inadmissível. E quando falam que o nosso país não é racista, sério?! Isso é sério mesmo?!!!
Fiquei com uma vergonha imensa pelo nosso estado, pelas pessoas boas que não fazem parte desse grupo criminoso, fiquei consternada em saber que eles (os racistas) têm coragem de se manifestar assim, de forma tão aberta, tão clara, querendo ser ovacionados. Isso é o pior e o mais complicado, o mais grave.
O perigoso é um grupo reunido, racista, não é uma manifestação isolada, que seria já criminosa, mas o grupo. Esse povo tem que saber que existe lei, a lei deve ser aplicada de forma implacável.
O caso está com a Delegacia de Intolerância de Porto Alegre, que tenho certeza que vai buscar a identificação dos participantes desse ato criminoso, já há inquérito instaurado e investigação em andamento.
Fica apenas uma brevíssima manifestação de alguém que recebe quase todas as semanas ocorrências de manifestações racistas, seja pelo delito do artigo 20 da Lei de Racismo, seja pela injúria racial, do artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal. E essas condutas banalizadas, “normalizadas” dentro da nossa sociedade, não podem ser aceitas, não podem fazer parte do cotidiano de uma sociedade evoluída, uma sociedade que deve respeitar os direitos humanos de todos os humanos, sejam eles de que cor, étnica, procedência, sexo, credo forem!
(*) Débora Dias é a Delegada da Delegacia de Proteção ao Idoso e Combate à Intolerância (DPICoi), após ter ocupado a Diretoria de Relações Institucionais, junto à Chefia de Polícia do RS. Antes, durante 18 anos, foi titular da DP da Mulher em Santa Maria. É formada em Direito pela Universidade de Passo Fundo, especialista em Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes, Ciências Criminais e Segurança Pública e Direitos Humanos e mestranda e doutoranda pela Antónoma de Lisboa (UAL), em Portugal.
Como a lei deve ser aplicada é para quem tem jurisdição. Ação Penal, exceptuando o STF, é prerrogativa do MP. Art. 20 da referida lei é discriminação ou preconceito. Alás, a lei engloba ‘religião’ também. Nos antigamente ‘racismo’ era a crença (furada, óbvio) de que determinados grupos eram superiores aos outros por conta de caracteristicas geneticas. Semana que vem ninguém mais lembra, daqui duas semanas outro caso vira manchete. Não há justificativa, mas existe explicação. Ambiente polarizado clube não deveria ter contratado artista militante de esquerda. Clube não deveria ter aberto a publico externo (dizem que era 500 pila por cabeça). Artista não deveria (vestimenta e cigarro ficam para lá) ter feito manifestação politica que, obviamente, pareceu provocação (pelo lugar). Muitos destes elementos retirados da equação evitaria a confusão. No mais, cumpra-se a lei.