ESPORTE. Conheça Vinícius Dias, o “Bebê”, ex-atleta profissional que, após lesão, se recupera no futebol 7

Por Pedro Pereira

Na história do esporte, existem inúmeros casos de atletas que sofrem lesões e, drasticamente, precisam abandonar o ofício e procurar outras ocupações. Há também aqueles casos em que, apesar da gravidade, os indivíduos conseguem dar a volta por cima, como Ronaldo Fenômeno, no início do milênio e, mais recentemente, Neymar, na Copa do Mundo de 2014. O santa-mariense Vinícius Dias, o Bebê, vive atualmente a etapa de recuperação de uma situação parecida com a dos craques.

Ex-jogador do Internacional de Santa Maria com passagens por diferentes clubes tradicionais do futebol gaúcho, ele decidiu abandonar a carreira profissional em 2017 para cuidar do filho, que logo iria nascer. No fim de 2018, jogando na várzea para completar a renda, acabou levando uma entrada dura no joelho direito, que o ocasionou diversas consequências físicas, como também psicológicas.

Aos “trancos e barrancos”, foram quatro anos para Bebê conseguir realizar a primeira cirurgia a fim de “resolver” seu problema. Já o segundo procedimento aconteceu há aproximadamente doze meses. No dia 20 de janeiro, quando foram realizados os jogos do Gauchão de Clubes de Camisa de Futebol 7 na cidade, o santa-mariense fez sua reestreia nos gramados após cerca de seis anos do ocorrido. À vista disso, conheça a história do guerreiro que luta para voltar a jogar com “alegria nas pernas”, sem medo de ser feliz.

A decisão

Dias revela que sempre teve o sonho de ser jogador de futebol, mas essa possibilidade passou a valer apenas quando colocou os pés no Estádio Presidente Vargas. “O ano eu não vou lembrar, mas eu era jovem. Eu entrei no Inter-SM na categoria dos nascidos em 1993 e eu sou de 1995. Na temporada seguinte a que cheguei, subi para o profissional e comecei a treinar”.

A passagem de Bebê no Alvirrubro durou três anos. Depois, rodou por clubes como Tupi, de Crissiumal, São José, de Porto Alegre, e o próprio Riograndense, de Santa Maria. Ele jogava na posição de meio-campista: “o famoso 10”, em suas palavras. O adeus à essa vida aconteceu quando vestia as cores do Aimoré, na Copa FGF de 2017.

O santa-mariense conta que sua esposa ficou grávida de seu filho, Gabriel, e então decidiu deixar de vez a vida de atleta profissional. Entretanto, a ideia de “pendurar as chuteiras” já rondava seus pensamentos há um tempo. “Com essa função de a gente geralmente jogar só no primeiro semestre e, no segundo semestre, não ter o que fazer por não ter clube, e os que têm pagarem pouco, eu já tava largando. Não queria mais, sabe?”, afirmou.

O fatídico dia

Ainda que tivesse definido que não seria mais jogador de futebol, Bebê não havia desaprendido a dominar a bola com os pés e acreditou que seria bom utilizar isso a seu favor. Então, passou a fazer parte do universo das partidas de várzea em Santa Maria e região até o fim de 2018, quando chegou o dia em que sua vida virou de cabeça para baixo.

Dias conta que a situação aconteceu no duelo de volta de uma série de mata-mata. No confronto de ida, realizado em São Pedro do Sul, seu time venceu por 1 a 0 com gol do santa-mariense que, ao celebrar o tento, fez um gesto que incomodou os adversários. “Eu fiz a comemoração que sempre fazia, imitando uma máscara. Depois disso, eles passaram a semana toda me ameaçando no Facebook. Todo mundo falou para eu não ir no jogo, só que, como era uma grana boa, eu fui”.

No segundo embate, que aconteceu no Coração do Rio Grande, dito e feito: com 15 minutos de partida, Bebê sofre uma entrada violenta de um atleta da equipe rival e precisa ser levado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA). Inicialmente, o médico que o atendeu lhe deu três dias de atestado. Quando liberado, foi para casa repousar.

Passados três dias e sem conseguir firmar a perna no chão, foi a um novo profissional, que o indicou fazer um exame de ressonância magnética. Para passar por todos os desafios e arcar com os custos, Dias destaca que recebeu muita ajuda, inclusive financeira, de seu time, o “Maringá”, e de outras pessoas. O resultado do procedimento mostrou que o santa-mariense havia rompido todos os ligamentos do joelho.

“Foi muito parecida com a lesão do Ronaldo Fenômeno, me disseram”. Em função de todos os impasses, Bebê recebeu a notícia que provavelmente nunca mais poderia jogar futebol. Este fato desencadeou diversos problemas mentais na vida do ex-atleta: “Tive depressão, precisei investir grana em psicólogo, tive que me tratar, não sair de casa, não ir a jogo algum… Foi um momento bem difícil”.

A cirurgia custaria 32 mil reais. Para atingir o valor, o santa-mariense promoveu uma “vaquinha”, como também fez, com o apoio de sua família de amigos, alguns eventos de pagode. O primeiro procedimento aconteceu somente quatro anos depois do acidente, em 2022, em Porto Alegre. Caso optassem por esperar pelo SUS, o procedimento estava previsto para acontecer em 2023. Para a segunda parte do processo, foram mais 11 meses esperando “de muleta”, segundo o ex-jogador.

A vida afastado

Para iniciar o plano de retorno aos gramados, Dias fez fisioterapia e, aos poucos, foi se fortalecendo – “mas bem aos poucos”, como realça. Neste meio-tempo, ele precisou procurar maneiras de tapar o buraco do futebol com outras atividades. Uma forma que achou de preencher foi virando treinador de futsal na escolinha “SER Santos”, do professor Enio Santos, para uma equipe de jovens de 15 a 16 anos.

Contudo, o que realmente o fez suprir a necessidade do esporte foi a loja de roupas virtual que montou, a Bebê Shop. “Comecei vendendo cueca, depois boné, camisetas, essas coisas e parei de pensar um pouco em futebol e aprendi a conviver com a dor, tanto a mental quanto a física. Foi meu refúgio. Eu fazia loucuras para entregar as peças. Eu ainda não tinha carro e ia de muleta, no calorão. Eu precisava me sentir dolorido, cansado, coisas que o futebol faz a gente sentir, então eu fazia isso. Era para eu me sentir vivo”.

Voltando aos poucos

Atualmente, enquanto retorna calmamente aos gramados, o santa-mariense atua como motorista de aplicativo. Vendo sua trajetória da época que ingressou no Inter-SM aos dias de hoje, Dias afirma: “Não me arrependo de nada. Eu vi meu filho caminhar, falar a primeira vez, e não se troca isso por nada. Eu sabia que se eu jogasse eu não ia estar perto e nem ver ele, porque ele nasceu em maio, quando a gente tá no meio de uma competição. Isso vai estar na memória dele pra sempre”.

Porém, ao que tudo indica, Bebê não descarta totalmente o retorno ao futebol profissional, caso se recupere. Ele afirma que recebeu convites para fazer parte de alguns clubes do Rio Grande do Sul, inclusive de equipes que disputarão o Campeonato Gaúcho Série A2 deste ano – tradicionalmente conhecido como Divisão de Acesso”. Mas, em sua opinião, seria muito difícil participar das competições neste momento.

“Eu ainda quero ver como é que eu estou, porque pegar o ritmo e outras coisas novas é complicado, é uma rotina de treino muito intensa. Mas quem sabe… Ainda tenho mais uns cinco anos para jogar. Eu me cuido, não fumo, não bebo, nunca estive acima do peso. Hoje em dia eu tô mais forte por causa da academia, então, quem sabe…”, declarou o santa-mariense.

Em 2024, Dias tem compromissos com o futebol 7. Pelo Postural Fit/Avenida, de Restinga Sêca, empatou em 3 a 3 com o The Black’s/Inter-SM e perdeu pelo placar de 4 a 0 para o JA Sports/Juventude, do município de Flores da Cunha. Ele afirma que ia fazer parte do elenco do Juventus/Riograndense, mas não se sentiu confortável. “Os guris tão muito acima”, relatou.

Como é amigo pessoal de Renan Fernandes, proprietário da equipe restinguense, acabou fechando com o time para o certame. A próxima partida do esquadrão que retrata o clube de Santa Cruz do Sul é neste sábado (3), contra o elenco do Internacional, de Porto Alegre, em Novo Hamburgo. Os próximos passos do mais novo atleta ainda estão a ser definidos.