Abortar PL 1904 – por Orlando Fonseca
A estupefação trazida “a mim e a grande parcela da população atenta”
Sempre tenho cuidado em usar certos termos, como identificar algo trabalhoso com “um parto”. Isso porque, desprovido de útero, não tenho a menor condição de estabelecer tal similaridade (afora que o parto é uma das atividades humanas carregada do mais sublime mistério: trazer à vida um ser humano).
Há quem diga, nesses casos, que o sujeito não tem “lugar de fala”. Que seja. No entanto, me permiti usar a metáfora do título, diante da minha estupefação pelo que o PL 1904 trouxe a mim e a uma grande parcela da população brasileira atenta. E estamos debatendo isso nos dias de hoje, quando, não contente com as bizarrices do negacionismo, os fundamentalistas neopentecostais estão trazendo a Idade Média para o século XXI.
As políticas sobre o corpo feminino estão entrando em uma zona obscura, como o foram os anos da Inquisição e das perseguições às “bruxas” (daí também que o termo “caça às bruxas” carece de cuidado).
Etimologicamente, a palavra aborto deriva do latim “abortus’”: “ab” indica privação e “ortus” significa nascimento. Já há algumas décadas, a medicina entende aborto como o procedimento de interrupção da gravidez até 20ª ou 22ª semana. Deve-se ter em conta este tempo, pois não se pode estabelecer a existência de um “ser humano” sem considerar as condições da formação neural.
Quando se fala em “morte cerebral”, o oposto da vida, por óbvio, fala-se em completa e irreversível parada de todas as funções do cérebro, ou seja, ausência das funções neurológicas. Se é assim que o indivíduo atinge o ponto de não retorno à vida, pela falência de seus sistema neural, isso significa que, estando este formado, é o ponto para indicar quando se nasce. O início da vida não é logo que ocorre a concepção, mas, sim, quando o sistema nervoso do feto ganha características mais complexas, deixando de ser primitivo.
Para coibir uma violência, homens, muito bem assentados em seus mandatos, decidem cometer mais violência. Se não, vejamos: equiparar o aborto legal a homicídio traz no seu bojo a penalização da vítima de estupro, que já sofre uma violência sexual e na sequência é condenada a dar à luz um filho indesejado. Na maioria dos casos, são meninas entre 10 e 14 anos submetidas à função de mãe sem condições para tanto.
Logo, se está condenando também uma futura criança à adoção ou aos abrigos. E não adianta alegar que, se a mãe não quer o filho nascido, que o entregue, pois não se trata de uma situação simples assim. Os rejeitados desenvolvem traumas psicológicos sem conseguir superar o trauma social, correndo o risco de serem jogados na marginalidade.
Por que trazer este tema agora, se não é para criar uma casuísmo político? O próprio Congresso deixou de elaborar leis para a proteção de mulheres e meninas submetidas à violência, que, nos últimos anos explodiu em nosso país. No ano passado, houve um total de 2.687 casos de aborto legal, segundo informou o Ministério da Saúde. Desse número, 140 foram de meninas até 14 anos de idade; de 15 a 19 anos, foram 291 abortos.
De outro lado, no ano passado também, o Brasil registrou 74.930 estupros, o maior número da história, sendo 56.820 contra vulneráveis. O tema de projeto de lei deve ser tratado como questão de saúde pública e não de um caso de polícia.
Também se deve investir em educação: a socióloga e pesquisadora Jacqueline Pitanguy explica que meninas estupradas, na maior parte das vezes, são violentadas por pessoas com quem convivem (pais, padrastos ou outros familiares), e sequer imaginam que podem estar grávidas, e mesmo nem sabem o que é gravidez, salienta a professora.
Afora a defesa fanática (e por vezes hipócrita) de grupos fundamentalistas, a proposta gerou reações na sociedade, levando às ruas muitos grupos reivindicando os direitos das mulheres em políticas públicas que tratam de seus corpos.
Por isso, volto a repetir, o projeto de lei deve ser abortado (com o perdão do mau uso da palavra), e o Congresso deve se voltar para a solução dos graves problemas sociais que levam à violência e à ignorância (de toda ordem). Esses sim, são os impeditivos de se criar um país grande e generoso para todos.
(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.
Eles querem deixar nascer o “indesejado” pra matar depois de adulto, ou muitas vezes, bem antes disso. Mas se dizem a favor da vida, os mesmos do slogan bandido bom é bandido morto. E não raro, a vida vale nada também para os que pensam diferente. Coisa de gente escrota. É o que mais tem, atualmente, no congresso.
E, para não deixar de falar das flores. Convenção Americana de Direitos Humanos, Pacto de São José da Costa Rica. Artigo 4º. ‘Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção.’
Pauta de costumes é cortina de fumaça faz tempo. Esta semana é a liberação da marijuana.
Fora dos circulos polarizados não é algo que chame atenção. Muda nada na vida do(a) afegão(ã) médio. Grande massa quer tocar a vida e não tem tempo para ficar tentar usar o Estado para policiar a vida dos outros. Não é questão que tenha resposta certa tampouco.
‘[…] são os impeditivos de se criar um país grande e generoso para todos.’ Nenhuma surpresa, afirmação infantiloide.
‘[…] o projeto de lei deve ser abortado (com o perdão do mau uso da palavra), e o Congresso deve se voltar para a solução dos graves problemas sociais que levam à violência e à ignorância […]’. Não existe censura previa legislativa. Projeto dever correr seu curso e cair no STF se for o caso. Hoje é o aborto, amanha meia duzia de gatos pingados vai impedir qual projeto de tramitar?
‘[…] a proposta gerou reações na sociedade, levando às ruas muitos grupos […]’. Basicamente vermelhos e uma parte do juridico.
‘De outro lado, no ano passado também, o Brasil registrou 74.930 estupros, o maior número da história, sendo 56.820 contra vulneráveis.’ E um problema. Mas nem todo estupro resulta em concepção. Para efeitos de propaganda foi unificado o crime de estupro com atentado violento ao pudor (ato sexual sem conjunção carnal). Numero subiu ‘demais’ e dai criaram o crime de importunação sexual.
‘No ano passado, houve um total de 2.687 casos de aborto legal, segundo informou o Ministério da Saúde’. Brasil tem 105 milhões de mulheres. Truque velho da esquerda, foca nas minorias. Enquanto isto acontecem mutirões para diminuir a fila da mamografia e mais de um milhão esperam procedimentos eletivos. Estatisticamente mais da metade são mulheres.
‘ O início da vida não é logo que ocorre a concepção, mas, sim, quando o sistema nervoso do feto ganha características mais complexas, deixando de ser primitivo.’ Afirmação sem pé nem cabeça. Não existe definição cientifica de ‘inicio da vida’. Alas, lembrando biologia, existem seres unicelulares que estão vivos.
‘[…] a mim e a uma grande parcela da população brasileira atenta.’ Ou seja, a grande massa da população que esta defecando para o assunto é ‘desatenta’. Uma cortina de fumaça com tentativa de mobilizar a militancia e tentar conquistar adesão dos ‘desatentos’.
‘Há quem diga, nesses casos, que o sujeito não tem “lugar de fala”.’ ‘Lugar de fala’ é uma invencionice de Djamila Ribeiro, militante negra feminista. Obviamente existe uma salada de palavras para ‘justificar’ o conceito. Serve para delimitar o debate, quem pode falar sobre o quê, cria ‘autoridades’ ad hoc sobre determinados assuntos. Um mote para só militantes de esquerda falarem e ‘ensinarem’ os outros sobre determinados assuntos. Alguns isentões invertebrados da urb ligados ao campo juridico aderiram,