Todos os cisnes são brancos – por José Renato Ferraz da Silveira

“Não é possível discutir racionalmente com alguém que prefere matar-nos a ser convencido pelos nossos argumentos”.

Karl Popper

Desde o meu primeiro thauma (θαύμας) – espanto ou admiração na acepção da palavra grega – na graduação em Relações Internacionais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998), Sir Karl Popper me acompanhou nas inúmeras leituras, escritos, aulas, entrevistas, bancas de Graduação, Mestrado e Doutorado ao longo de 26 anos.

Acredito – firmemente – que me acompanhará durante toda a minha trajetória acadêmica.

Pois bem, lembremos que Popper apresentou na base da filosofia do conhecimento uma premissa que é uma observação muito simples e que nos faz refletir sobre a “assimetria dos enunciados universais”.

Esta assimetria, segundo João Carlos Espada (num belíssimo e tocante texto introdutório a Karl Popper numa homenagem merecida), “reside no fato de que, enquanto nenhum número finito de observações (positivas) permite validar definitivamente um enunciando universal, basta uma observação (negativa) para invalidar ou refutar”.

Em outras palavras, o exemplo clássico é que “por mais cisnes brancos que sejam encontrados, nunca podemos ter certeza de que todos cisnes são brancos (pois, amanhã, alguém pode encontrar um cisne preto).

Enfim, basta encontrar um cisne preto para ter a certeza que é falso o enunciado universal “todos os cisnes são brancos”. Este é um exemplo do Problema de Indução ou Problema de Conhecimento Indutivo. Ou seja, como partimos de instâncias específicas até conclusões gerais. Acreditamos no nosso dia a dia, como disse Hobbes, que “antecedentes semelhantes fluem consequências semelhantes”. Acreditamos nos benefícios incondicionais da experiência passada.

O texto prometido e maldito

Nesse sentido, no tema prometido da semana passada, podemos dizer – numa lógica popperiana – que a “Extrema Direita Global” possui muitas semelhanças e também diferenças agudas. Isso é inquestionável!

Contudo, na Ciência Política e nas Relações Internacionais (como em qualquer ciência), buscamos padrões, relações causais, sequências e tendências. A busca por padrões, sequências e tendências obedecem a critérios lógicos, racionais e observáveis empiricamente. Embora haja também injunções e contradições.

A partir dessas premissas é possível comprovar – indubitavelmente – que há muitos traços característicos e que os frequentes eventos da Conservative Political Action Conference (CPAC) reforçam essa argumentação.

Exploraremos essa variável – dos eventos periódicos da CPAC – no próximo texto.

Os pontos comuns da Extrema Direita no Mundo

Enfim, listemos 4 pontos decisivos e comuns da Extrema Direita no Mundo:

a) A extrema direita possui retórica antiglobalização. Diz que a mesma afeta os interesses dos países em diversas questões. Assumem uma postura isolacionista e unilateral. Vale destacar a atuação de muitos governos da Extrema Direita durante a pandemia e o questionamento irresponsável, doentio e anticientífico em diversos temas securitários.

b) O nacionalismo está no cerne dessa Nova Direita porque rejeita o multiculturalismo e a adesão dos Estados pelas redes supranacionais decorrentes da globalização. Outro aspecto relevante relacionado é a oposição à imigração, vista como causa da falência do Estado porque esses imigrantes supostamente “roubam” os empregos dos nacionais e causam o caos social subvertendo as leis estabelecidas. “Até comem animais domésticos (gatos e cachorros), segundo o novo e velho presidente Trump”.

c) Na questão da economia defendem o liberalismo, o Estado mínimo, o livre mercado e a privatizações de estatais. Nesta visão, o Estado é responsável por apenas dar as condições básicas (mínimas) para os indivíduos e as empresas conduzirem a economia. O aumento da pobreza e da indigência não é culpa do Estado e sim do indivíduo, da família e da sociedade.

d) A Extrema Direita arroga o papel de defensora dos princípios morais conservadores. Ou seja, os valores da família tradicional (pai, mãe e filhos) são altamente encorajados, o que geralmente leva à subjugação feminina, pois, o patriarcado é visto como o sistema social ideal e à não aceitação da homossexualidade, percebida como um “mal a ser combatido e proibido a todo custo”. 

Retornamos, no próximo texto, a partir da análise das reuniões do evento periódico Conservative Political Action Conference (CPAC) o que evidencia a unidade de um grupo com um ideário e com estratégias eleitorais políticas populistas e similares.

(*) José Renato Ferraz da Silveira, que escreve às terças-feiras no site, é professor Associado IV da Universidade Federal de Santa Maria, lotado no Departamento de Economia e Relações Internacionais. É Graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP e em História pela Ulbra. Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP.