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ARTIGO. Luciano do Monte Ribas e a fala presidencial acerca da (falta de) fome entre os cidadãos brasileiros

A fome dos outros

Por LUCIANO DO MONTE RIBAS (*)

O mesmo homem que deseja garantir benesses ao próprio filho em decorrência do cargo que “papai ocupa” declarou hoje, dia 19 de julho de 2019, que alguém “falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira”.

A frase em si dispensaria comentários, não fosse por ela ter saído da boca daquele que, por um desastre da história, ocupa a presidência do país que mais vinha reduzindo a pobreza extrema. Nesse caso, “vinha reduzindo” é a construção exata, pois desde que paralisaram o país para garantir a queda do governo Dilma (sim, é isso mesmo o que ocorreu, não importando o blá-blá-blá usado para tentar mascarar os fatos; conversa que, possivelmente, também será reproduzido aqui por algum comentarista) a vida dos mais pobres voltou a piorar. Muito, ressalte-se. E, com a desumanidade que ocupa o poder nesse momento, o que era uma “piora” tende a se transformar em tragédia de grandes proporções.

Mas não acreditem no que escrevo. Digitem “mapa da fome no Brasil” no Google e explorem os resultados. Basta isso para constatar a dimensão continental da asneira dita pelo néscio, numa confissão de desprezo pelo outro por parte do presidente que se diz “cristão”.

Aliás, eu gostaria de saber em qual Evangelho o egoísmo e a hipocrisia têm status de virtude. No de Mateus, por exemplo, certamente não é. Ele relata que Jesus Cristo teria dito, numa das passagens mais bonitas do Novo Testamento, um desígnio ético muito importante até para este ateu que vos escreve (mas que culturalmente é mais cristão do que a maioria dos que se dizem religiosos):

                        “Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber;

Era estrangeiro, e hospedastes-me; Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me;

estive na prisão, e foste me ver.

                        Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te          

demos de comer? ou com sede, e te demos de beber?

E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? ou nu, e te vestimos?

E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te?

                        E, respondendo o Rei, lhes dirá:

Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes” (Mateus 25:35-40).

Diante do núcleo do pensamento cristão, não há como relativizar a barbárie; por isso não me venham com “ah, mas ele quis dizer isso ou aquilo”. Mesmo se houvesse uma “boa intenção” por trás dessa parede de ignorância, ela não anularia a força do que foi efetivamente dito, de tudo o que é negligenciado e, principalmente, dos absurdos que são feitos. Sem se esforçar para disfarçar, esse é um governo “terrivelmente maldoso” na sua “racionalidade” excludente.

O pior de tudo, porém, talvez seja a constatação de que o néscio não está sozinho. Na semana que finda, aqui mesmo na aldeia, alguns membros de uma pseudo elite decadente promoveram uma ofensiva contra o projeto Esperança/Cooesperança, a Feicoop e a irmã Lourdes Dill. Um deles pediu explicitamente o boicote à Feira, sem levar em conta que boicotá-la significaria agir agressivamente contra as pessoas que comercializam sua produção artesanal e familiar nos espaços do projeto idealizado por Dom Ivo Lorscheiter. Ou seja, seria um tijolinho a mais na muralha da fome e da exclusão social.

Não me surpreende em nada, pois quem não estende a mão aos “pequeninos irmãos” para transformar-lhes a vida se contenta em puxar o saco dos muito ricos.

(*) LUCIANO DO MONTE RIBAS é designer gráfico, graduado em Desenho Industrial / Programação Visual e mestre em Artes Visuais, ambos pela UFSM. É um dos coordenadores do Santa Maria Vídeo e Cinema e já exerceu diversas funções, tanto na iniciativa privada quanto na gestão pública. Para segui-lo nas redes sociais: facebook.com/domonteribas – instagram.com/monteribas

OBSERVAÇÃO DO EDITOR: A foto, também do autor do artigo, é do monumento Cristo Redentor, no Rio de Janeiro.

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