Duas notícias com repercussão na mídia nacional no mês passado têm um ponto coincidente: o machismo. Em uma das situações a vítima, uma mulher, juíza, morta pelo ex-marido em frente às filhas. No outro caso, também uma mulher, vítima de violência doméstica e protagonizando mais uma violência, o juiz, que debocha da Lei Maria da Penha e discorre uma série de impropérios machistas e fomentadores da violência de gênero que ecoa em todo nosso país.
Nessa discussão, a pauta é uma só, a violência contra a mulher, as raízes do problema que ceifa a vida de inúmeras brasileiras em todo esse imenso Brasil. A magistrada Viviane Vieira do Amaral Arronenzi, carioca, foi morta a facadas pelo ex-marido, em frente às três filhas menores de idade, na véspera de Natal.
Viviane foi mais uma vítima de feminicídio, do ápice da violência doméstica, já tinha histórico de violência doméstica, inclusive com medidas protetivas de urgência deferidas. Crime bárbaro, violento, que acaba com a vida de milhares de mulheres todos os anos em nosso país. E, o mais trágico de todo esse contexto de violência é que ele é fruto de uma sociedade machista, doente, que trata mal suas mulheres, que despreza seus direitos humanos e as coloca no patamar de coisas, de objetos, disponíveis como quaisquer outros bens de que se possa ter a propriedade.
E essa cultura machista que sobrevive há décadas no Brasil, o que por vezes, torna o trabalho de persecução criminal, quase um enxugar de gelo, é fomentada pela própria sociedade, em todos os planos, sem respeitar nível sócio-cultural, de forma arrebatadoramente democrática.
É aqui que chegamos ao caso do juiz paulista, que debocha, desdenha e desqualifica a mulher vítima de violência doméstica, a qual estava participando de audiência virtual sobre pensão alimentícia e separação do marido agressor. O juiz fala à mulher: “Não tô nem aí pra Lei Maria da Penha”, “ninguém agride ninguém de graça” e outras asneiras de cunho extremamente sexista, preconceituoso, além de desrespeitoso.
Um juiz? Sim, o juiz faz parte da sociedade e a sociedade é machista sim. Agora, que é uma vergonha, é! É uma vergonha! Claro que a decepção/indignação é maior nesses casos, porque o juiz está representando o Estado, aí falamos de violência institucional. Assim, como qualquer agente que represente o Estado e no desempenho de suas funções inerentes ao seu cargo, tenha comportamento semelhante.
Todas essas digressões são pra dizer que enquanto não mudarmos a educação e a cultura não terá um fim a violência contra mulher em nosso país. A questão está arraigada, enraizada na sociedade. Devido a isso, deve ocorrer uma descontrução de valores desqualificadores de gênero. Há que se respeitar os direitos humanos das mulheres.
Essa afirmação parece ser redundante, ora se é uma mulher, os direitos delas são humanos e inerentes a ela, não se precisaria falar em “direitos humanos das mulheres”. Entretanto, é necessário afirmar que há de se respeitar os direitos humanos das mulheres porque a violação desses direitos é diária, é cotidiana e deve ser intolerável, enquanto não houver uma mudança radical em nossa sociedade, não teremos a diminuição da violência contra as mulheres, infelizmente.
Afirmação pesarosa, mas real. A desigualdade de gênero é combustível para a violência contra as mulheres, as matam todos os dias! Muda professor, muda pedreiro, muda balconista, muda banqueiro, muda bancário, muda juiz, muda Brasil!!!
(*) Débora Dias é a Delegada da Delegacia de Proteção ao Idoso e Combate à Intolerância (DPICoi), após ter ocupado a Diretoria de Relações Institucionais, junto à Chefia de Polícia do RS. Antes, durante 18 anos, foi titular da DP da Mulher em Santa Maria. É formada em Direito pela Universidade de Passo Fundo, especialista em Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes, Ciências Criminais e Segurança Pública e Direitos Humanos e mestranda e doutoranda pela Antônoma de Lisboa (UAL), em Portugal.
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