Qual o tamanho da influência da CPI da Covid nas eleições de 2022? – por Carlos Wagner
“Pelo seu ineditismo e grandiosidade, a pandemia será o grande assunto”
As informações do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19 do Senado, a CPI do Covid, sobre o que ocorreu entre as quatro paredes do governo federal durante a pandemia são uma preciosa contribuição para a precisão das reportagens a respeito desse inédito período da história do Brasil.
Independentemente do destino que esse relatório terá nos tribunais brasileiros e internacionais, as informações ali contidas, até que se prove em contrário, são a verdade dos fatos e foram obtidas de maneira transparente e televisionadas em tempo real durante as sessões da CPI.
Lembro que a precisão jornalística é uma arma poderosa que temos em épocas que o cotidiano dos nossos leitores é impregnado por fake news disparadas da boca de autoridades, como foi o caso da postagem nas redes sociais (quinta-feira, 21/10) da fala do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) associando o desenvolvimento do vírus da Aids com a vacina contra a Covid.
Facebook, Instagram e YouTube retiraram do ar as postagens do presidente e o puniram. Mas o que ele falou já tinha se espalhado. Lembro aos meus colegas, principalmente aos mais jovens, que quando publicamos uma informação é como se tivéssemos apertado o gatilho de uma arma. Depois que a bala é disparada, ela não volta mais para o cano da arma.
Pelo seu ineditismo e grandiosidade, a pandemia será o grande assunto durante a disputa eleitoral de 2022. Como diriam os antigos editores dos tempos das máquinas de escrever nas redações dos jornais: será o pano de fundo. E as outras questões, como desempenho da economia, desemprego, corrupção e sacanagens de um modo geral, vão girar ao redor dela.
Daí a importância do repórter fazer o tema de casa e ler pelo menos os pontos mais importantes das 1.289 páginas do relatório. Aqui lembro o seguinte. Os comentaristas políticos da imprensa compraram o peixe vendido pelos operadores do mercado de que o presidente ideal para o Brasil é uma pessoa de centro. E que a radicalização na disputa entre Bolsonaro e o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP) não é boa para os negócios nem para o país.
Não são os operadores do mercado e muito menos os comentaristas políticos das redações que decidirão o que é bom para o Brasil. Serão os eleitores. E a nossa tarefa como repórter é mantê-los informados com fatos reais, e escritos de maneira simples e elegante, para que todos os entendam. E a realidade brasileira é simples e muito cruel.
Graças ao negativismo do presidente Bolsonaro em relação ao poder de contágio e letalidade da Covid morreram mais de 600 mil brasileiros e vivemos momentos horríveis, como foi a falta de oxigênio hospitalar em Manaus (AM) e cidades do interior do Pará, que causou a morte por asfixia de dezenas pessoas.
E o atraso na compra das vacinas, que além de contribuir para a morte de muita gente, também retardou a retomada da economia. As razões de como tudo isso aconteceu e quem são os culpados podem ser encontradas no relatório da CPI da Covid.
Fui lembrado por um jovem repórter que as eleições de 2018 tiveram como pano de fundo as ações da Operação Lava Jato contra a corrupção que aconteciam na 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), comandadas pelo então juiz Sergio Moro – a história está toda contada em várias reportagens disponíveis na internet.
Seis meses depois das eleições, em junho de 2019, o site The Intercept Brasil começou a publicar mensagens trocadas pelo aplicativo Telegram entre Moro, agentes da Polícia Federal (PF) e procuradores da República combinando ações contra os investigados. Graças a essa ilegalidade e outras, o trabalho da Lava Jato desmoronou como um castelo de cartas – há matérias na internet.
O jovem repórter me perguntou se corríamos risco com o trabalho da CPI da Covid? Respondi que não. Por quê? São situações completamente diferentes. Vejamos: a Lava Jato usou para ganhar a simpatia popular a prática de vazar informações para a imprensa. Muitas dessas informações eram mentiras que foram publicadas como se fossem verdades.
Os fatos cavados pelos senadores da CPI foram expostos na nossa frente e do grande público pela televisão. O que está sendo discutido sobre o relatório dos senadores são os crimes nos quais os indiciados, incluindo o presidente Bolsonaro, foram enquadrados. Isso é uma discussão técnica.
Há outra conversa entre os jornalistas sobre o destino da CPI. Digo que isso será decidido com o tempo. O fato é que o relatório final da CPI da Covid é uma “batata quente” que os seus autores colocaram nas mãos do procurador-geral da República, Augusto Aras, dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), do Tribunal de Haia, do Senado e da Câmara dos Deputados.
O que essas autoridades vão fazer com a “batata quente”? Não poderão sentar em cima e muito menos fazer corpo mole porque esse relatório lida com fatos concretos, como a morte de mais de 600 mil brasileiros e as cenas dramáticas dos parentes exibidas pelos noticiários noturnos das emissoras de TV. Só com o tempo saberemos o que eles farão.
Agora, no presente, o que temos são as informações de como tudo aconteceu e quem são os responsáveis. E também uma bem montada e azeitada máquina de fake news tentando convencer as pessoas de que tudo não passa de mentiras contra o governo federal.
Como disse lá no início da nossa conversa. Quando publicamos uma informação é como se tivéssemos apertado o gatilho de uma arma. Depois que a bala é disparada ela não volta mais para o cano da arma. Os caras da fake news apostam nisso. Daí a importância de se ler o relatório para escrever com segurança para o nosso leitor.
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(*) O texto acima, reproduzido com autorização do autor, foi publicado originalmente no blog “Histórias Mal Contadas”, do jornalista Carlos Wagner.
SOBRE O AUTOR: Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela UFRGS. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 67 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.
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