Carta branca da Rosa dos Ventos – por Márcio Grings

Pode acreditar, ele nunca esteve tão bem. Da última vez que bateu com a cara no muro, trocou o marfim pelo celofane, torceu o pescoço e cortou o rosto nos arames. Depois do baque inicial, emergiu até a superfície e nasceu de novo.

Passou a borracha nos mandamentos, rasgou algumas páginas do livro da vida, inventou outra cor com um kit baleado de giz de cera, desenhou uma armadura, amarrou a alma em ossos trincados e cortou o fio de náilon que amarrava seus lábios.

Ele olha no espelho e vê um novo arquétipo de herói o encarando com invejável autoconfiança. Tudo voltando para seu lugar. Inclusive a lua nova, mais velha do que nunca junto ao ocaso da sua fase. O sul é passado. Olha para o lado esquerdo, o leste de si nunca esteve tão longe de onde está e o oeste dos seus sonhos diz adeus um milhão de vezes. E não tenha dúvidas: o norte representa a antevisão daquilo que já o espreita faz um bom tempo. Em plena epifania, ganha carta branca da Rosa dos Ventos.

Pode ter certeza, ele nunca esteve tão bem. De alguma forma implícita, avisou. Ele apenas nasceu de novo. Um espírito leve, inquebrantável e esvoaçante, isso é parte do agora ele é.

Hoje ele abriu os olhos assim. Como se toda a engrenagem do cosmo estivesse conspirando ao seu favor. É óbvio que cada um de nós não passa de um somatório de erros e acertos, sucessos e insucessos. O desafio é encararmos na boa o confronto da inocência versus cinismo, sem resvalar num mero exercício nostálgico. E, assim, forjamos o dia de hoje, certamente blindados de alguns equívocos e deslizes anteriores. Entretanto, quebrar as fuças faz parte do misancene da existência. Só assim entendemos certas lições. Não dá pra entregar os pontos antes do fim do jogo. Até por que há um tempo em que todo aquele monte de sementes plantadas, começa a germinar. Alicerces vivos apontando vitoriosos.

O ano foi difícil. Ele Sobreviveu. O que vem pela frente? Ninguém tem a mínima ideia. Certo é que a colheita está nas preliminares. Por isso, prepare os silos, limpe o celeiro e ajeite o galpão, pois enfim, chegou a tão aguardada época de apanhar os frutos.