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Como é possível estar quebrado em meio a um esporte milionário – por Dijair Brilhantes e Bruno Lima Rocha

Coluna Além das 4 linhas, 02 de agosto de 2010 – por Dijair Brilhantes ([email protected]) & Bruno Lima Rocha ([email protected])  

Ta demorando a engrenar 

Passado o período de Copa do Mundo, os clubes, mídias, e torcidas parecem estar demorando um pouco a retomar o foco no campeonato nacional. Há raras exceções, dentre elas se incluem Corinthians, Internacional, Ceará, e Fluminense que fazem campanhas empolgantes e têm boa média de público.

Com a abertura da “famosa janela” que causou tanta polêmica, alguns clubes trouxeram reforços do exterior que estavam sem ritmo de jogo, outros acima do peso, implicando nisso a necessidade de um trabalho exclusivo na preparação física em meio à temporada. Talvez este seja um dos motivos para a falta de qualidade dos jogos e a demora na engrenagem das equipes. Mas o fato é que a ausência de grandes craques que trocam o Brasil, hoje não só por grandes times da Europa, mas também por equipes sem expressão alguma no futebol mundial, implica em problema “futebolísitico”, com caneladas e perebices abundantes dentro de campo.

Uma das causas dessa venda exagerada se deve a falta de organização e planejamento dos dirigentes que presidem os chamados grandes clubes. Outra, com certeza, atravessam a nada republicana conduta e postura da maior parte da cartolagem – que intermédia os investidores dos clubes – e os procuradores ou representantes legais dos boleiros – que na sanha de uma comissãozinha iludem a molecada para irem jogar em lugares inóspitos, com frio absurdo para os padrões brasileiros – mesmo sendo de gaúchos uma parte do “pé de obra exportado”. Assim, terminam por zanzar entre centros inexpressivos, segundas divisões européias, até serem repatriados. E, como sempre, alguém tira da cartola um coelho de pelúcia falsificado, garantindo a pérola que: “A baixa qualidade técnica do futebol nacional sempre acarreta em velhas discussões sobre a mudança do calendário para os moldes europeus”. Quanta baboseira.

Sem recursos financeiros a qualidade é baixa

Como é possível estar “pelado, liso, duro, quebrado” em meio a um esporte milionário, com cifras astronômicas? É como um cassino dar prejuízo (e acreditem, tem alguns que dão prejuízo porque uns espertalhões desviam…), é inimaginável. A crise de liquidez (não há dinheiro em caixa, os preços estão descolados dos ingressos de renda) instalada há tempos no futebol brasileiro é um dos principais motivos da falta de qualidade técnica do campeonato nacional. O problema é de simples diagnóstico e de difícil solução no curto prazo. Os clubes seguem o modelo de negócio de vender jogadores como principal fonte de renda. Ressaltamos que, muitos destes boleiros, sequer chegam a jogar no Brasil entre os profissionais. Enquanto não abrem as janelas ou temporadas de contratação, o grosso do caixa é bancado pela venda (coletiva) dos direitos de transmissão. Na metade da temporada o dinheiro escasseia, porque muitos já pediram a antecipação das cotas de TV para saldar dívidas. Como há pouco dinheiro em caixa e as categorias de base cada vez formam menos (pelo fator indicação de conselheiro ou padrinho de peneira; retornaremos ao fato noutras ocasiões), se torna quase impossível formar grandes times.

Alguns clubes, dentre eles Santos, Internacional e Corinthians, buscam como alternativas, participar ou se associar aos “fundos de investimentos” (como os geridos pelos Grupos Sonda ou o Traffic), para manter ou adquirir jogadores com custos elevados. O problema nesse tipo de negócio acaba sendo que os clubes além de obedecerem as regras absurdas impostas pela TV Globo (como datas e horários) devido aos direitos de transmissão dos jogos, passam a ser escravos também desses investidores, pois são os verdadeiros donos dos atletas. Estas empresas usam o futebol jogado no Brasil apenas como vitrine para futuras vendas e bons milhões de euros em suas contas bancárias.

Afinal, para que serviu a Lei Pelé? O objetivo não era libertar os jogadores? Os atletas apenas mudaram de dono, antes eram dos clubes agora são dos empresários. Transformar os clubes em “empresas” até agora na prática resultou apenas nas frustradas tentativas de obter lucros. Instituições como Vasco e Flamengo têm dívidas superiores a R$ 300 milhões de reais, o que, se auferido com rigores da Receita ou outro tipo de fiscalização, causaria a falência de qualquer empresa que não tivesse fortes conexões com Brasília e os respectivos governos estaduais.

Paixão Cara

Explorar a marca! Esse é um dos argumentos dos dirigentes e dos departamentos de marketing para impor os elevados valores dos produtos oficiais dos clubes. Uma camiseta oficial da temporada em andamento, produzida pelo fornecedor do material esportivo custa em torno de R$170,00, independente de ser o 1º, 2° ou 3° uniforme. De tão caro, os detentores do licenciamento (os próprios clubes), resolveram criar a segunda linha de si mesmos. Devido ao valor elevado destas camisas e para evitar a pirataria, foram criadas as peças alternativas com valores que não chegam à metade das tradicionais. Não contam com os produtos do fornecedor oficial, mas são devidamente licenciadas pelos clubes. Esta medida simples – para caber no bolso de quem ama muito, recebe pouco e já está mais que pendurado em crediários e parcelamentos – acabou aumentando consideravelmente os lucros, pois torcedor paga menos e acredita estar ajudando na receita do time do coração. Em 2009, só o Grêmio faturou mais de 10 milhões de reais em sua loja (conforme dados divulgado pelo próprio clube) com seus produtos tanto da linha original quanto licenciada.

O futebol custa muito caro ao torcedor de um país da semi-periferia do capitalismo como o Brasil. Os ingressos saem em torno de R$ 50,00, o que é muito para uma família das classes C e D. Os lugares mais baratos, mais populares nos nossos estádios, obrigam o torcedor a ainda sentar na pedra e tomar chuva na cabeça (isso quando não voa o líquido quente e amarelo, vindo do anel superior…). A dificuldade se mantém nos horários em jogos noturnos que chegam próximos do dia seguinte. As chamadas super-quartas são feitas para heróis ou jovens cheios de disposição e recém saídos da adolescência. E para completar, parece loucura, mas a busca pela auto-sustentação dos clubes resultou em ainda mais exclusão. É compreensível a meta de uma grande agremiação em querer ao menos zerar as despesas com a receita programada através do débito em conta ou do boleto do torcedor associado. Mas, ao criarem o chamado sócio-torcedor que paga uma taxa mensal para ter o direito de comprar antecipados os ingressos para os jogos, os clubes inibem o deslocamento e a relação do torcedor mais avulso. O que é uma excelente idéia (o sócio-torcedor) termina operando como força de sucção (feito vaca “nadando” em enchente) no rodamoinho do consumo e do endividamento da população.

A lógica aparente é terrível. O poder aquisitivo passando por cima da paixão; assim, o amor clubístico virou sofrimento para pessoas com baixas rendas. Não compram produto licenciado, alimentam a pirataria, não conseguem mais pagar ingresso para ir aos jogos e terminam excluídas, acompanhando tudo apenas através da mídia: assistem pela TV e ouvem a crônica esportiva. Para os clubes mais ricos, a impressão é de que os brasileiros mais humildes não merecem assistir futebol, porque não trazem nenhum lucro.     

Quem escreve: Dijair Brilhantes é estudante de jornalismo e é muito interessado em futebol e na crônica esportiva em particular; Bruno Lima Rocha é editor do portal Estratégia & Análise

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