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Uma guerra que se arrasta na Justiça… Futebol? – por Anderson Santos e Dijair Brilhantes

Coluna Além das 4 linhas –  edição da semana de 31 de maio de 2012 – por Anderson Santos (editor) e Dijair Brilhantes

A esta altura do ano já éramos para ter as quatro divisões do Campeonato Brasileiro em andamento. Como ocorre desde a reformulação da Série C, com a criação da Série D, as três primeiras divisões começavam um pouco antes: a A e a B, em maio; a C, em julho ou, nos últimos anos, também a partir de maio; e, por fim, a D, que até o ano passado iniciava no segundo semestre e que neste iniciaria em maio.

Porém, uma verdadeira guerra de proibições e liberações judiciais, em termos desportivos ou não, varreu o país a ponto de a CBF poder ser multada tanto se colocar quanto se retirar um mesmo time da Série C. Resultado: o STJD cancelou o início das Séries C e D até uma melhor resolução dos problemas.

O ESTÁDIO ESTADUAL E A INTERPRETAÇÃO

As confusões em torno da Série C começaram no ano passado. Com problemas na Arena da Floresta, estádio gerido pelo Governo do Estado do Acre, o Rio Branco teria que jogar em outro local suas partidas da Série C. O mesmo valeria para o representante acreano na Série D, o Plácido de Castro.

A Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor moveu um processo contra a presença de público no estádio, inaugurado há cerca de seis anos. O problema é que a obra não possui o Habite-se, que é outorgado pelo Poder Público municipal autorizando a utilização do imóvel.

Dentre os problemas levantados no ano passado, o laudo de engenharia apontou algumas anormalidades na construção, caso de vigas de ferro à mostra. O laudo de vigilância sanitária também apontaria diversas inadequações sanitárias.

Como proprietário do estádio, o Governo do Estado entrou com ação na Justiça Comum para que a Arena da Floresta pudesse ser utilizada, no entendimento que era uma questão estatal e não do esporte. Como isso não foi o entendimento do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, mesmo fazendo a melhor campanha em seu grupo na primeira fase da Série C, o Rio Branco foi eliminado do torneio durante a segunda fase, passadas duas rodadas.

Desde então, o Rio Branco tenta reaver a sua vaga na Série C. A Procuradoria Geral do Estado continua com suas tentativas na Justiça Comum para que a Arena seja utilizada; frente a um Ministério Público que pensa o contrário. Enquanto isso, o clube foi prejudicado.

Essa dúvida quanto ao rebaixamento do Rio Branco criou um imbróglio de quem deveria ser o substituto. Um acordo realizado entre o clube e a CBF recolocou os acreanos na Série C deste ano. Entretanto, Araguaína-TO, rebaixado do grupo na Série C, e Treze-PB, quinto colocado da Série D, sentiram-se prejudicados e disputam a vaga na justiça.

O Treze acionou o Tribunal de Justiça da Paraíba, conseguindo uma liminar nesta esfera jurídica. Caso a CBF não incluía o time paraibano no torneio, deverá pagar multa estipulada em R$ 50 mil diários, com limite de R$ 2,4 milhões.

Para piorar a situação, outra decisão no nível de Justiça Comum, desta vez de Tocantins, exige que a CBF inclua o Araguaína na Série C, com multa diária também em R$ 50 mil, só que com limite de R$ 500 mil.

Como as decisões são numa mesma esfera jurídica, elas têm o mesmo valor e, ao menos, o advogado que representa o Treze promete levar a questão para o Superior Tribunal de Justiça, único local capaz de resolver a situação.

A FALTA DE AVISO GEROU A SEGUNDA AÇÃO

O Grêmio Esportivo Brasil de Pelotas-RS foi punido com a perda de seis pontos no Campeonato Brasileiro da Terceira Divisão do ano passado, devido à escalação irregular do lateral-direito Cláudio. O caso ocorreu ainda quando o jogador atuava pela pelo Ituiutaba-MG (atual Boa Esporte Clube), na Série C de 2010.

Na partida final contra o ABC-RN, Cláudio foi expulso, como não atuou mais pelo antigo clube e não disputou nenhuma competição nacional, deveria ter cumprido a suspensão na primeira partida do Brasil de Pelotas pelo Brasileiro seguinte. O lateral-direito entrou em campo na primeira partida, a vitória de 3 a 2 sobre o Santo André, em São Paulo.

Os xavantes terminaram a primeira fase empatados com oito pontos com Santo André-SP e Caxias-RS, mas o time paulista seria rebaixado por conta do menor saldo de gols. Porém, os seis pontos a menos acabaram rebaixando o rubro-negro.

A batalha jurídica do Brasil começou logo após a decisão do STJD. De início, a justificativa do clube gaúcho era que não tinha sido informado sobre a punição ao atleta – o que seria um ato “amador” da diretoria –, perdendo as primeiras decisões sobre o assunto. A seguir, o próprio atleta teria comunicado que o seu antigo clube não o informou sobre o assunto, argumento o qual os dirigentes xavantes se apegam para evitar a perda dos seis pontos.

A CBF tentou estabelecer acordo parecido com o que fez com o Rio Branco, “oferecendo” a entrada do clube na Série C do ano que vem, mas os xavantes não aceitaram. O Brasil de Pelotas conseguiu uma liminar na Justiça Comum uma semana antes da estreia na Série C, substituindo o Santo André.

Em meio a tantos processos e decisões que até mesmo se contrapõem, o presidente do STJD, Rubens Aprobato, resolveu impedir por tempo indeterminado o início das Séries C e D.

O PROBLEMA VAI ALÉM

O parágrafo primeiro do artigo 217 da Constituição Federal afirma que:

“§ 1o O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei”.

Além disso, por ter constitucionalmente garantida a independência de atuação e gerenciamento, os clubes e associações de futebol não poderiam ter uma “interferência” de qualquer Poder antes da justiça desportiva. Algo que a FIFA também não aceita – não é à toa que seus presidentes já “paqueraram” grandes ditadores… – o que gera exclusão quase que automática dos clubes e das seleções em que isso ocorreu.

Os times que entraram na justiça para ocupar a vaga do Rio Branco levantam o argumento que foi decisão do STJD excluir o clube acreano da Série C, o que não estaria sendo cumprido devido à decisão na justiça comum que possibilitou o acordo do clube com a CBF.

Um boato vindo do último Congresso da FIFA, realizado na semana passada – e que demonstrou que as promessas de transparência não passarão tão cedo à prática da entidade – dava conta de que os times que entraram na Justiça Comum, até então Brasil e Treze, estariam suspensos de qualquer campeonato de “football association”.

Isso foi desmentido a seguir, mas nesta semana, a Confederação Sul-americana de Futebol (Conmebol) teria exigido que os clubes que entraram na Justiça Comum fossem excluídos de torneios oficiais… Muita água vai rolar ainda sobre o assunto, que não é velho.

DOIS EXEMPLOS

Em 1999, por conta de uma legislação que punia o clube com jogador “dopado” com a perda de pontos, com uma dúvida sobre se os pontos da partida iam para o outro time – em caso de empate ou derrota –, Gama e Botafogo duelaram no STJD e na Justiça Comum para não serem rebaixados.

Com uma ação na justiça comum em favor do clube brasiliense, a CBF estava ameaçada de ser excluída de competições oficiais, e todos os seus clubes, por dois anos. Para “enganar” a FIFA, os clubes organizaram um torneio nacional por “conta própria”, a Copa João Havelange e os seus três módulos, que possibilitaram, por exemplo, que o vice-campeão da Segunda Divisão disputasse a final do Brasileiro no mesmo ano, o São Caetano.

Outro caso se deu após o encerramento do polêmico Brasileirão de 2005, em que a “Máfia do Apito” gerou o cancelamento de doze partidas do campeonato, modificando os rumos do mesmo – mesmo naquelas que não houve interferência sobre o resultado .

Um torcedor do Internacional entrou com uma ação na justiça por se sentir prejudicado pelo STJD, que anulou as partidas porque o ex-árbitro Edilson Pereira de Carvalho estava envolvido numa fraude com jogos de apostas internacionais – afinal, por onde anda o homem que por um tempo era sinônimo de juiz ladrão nas torcidas Brasil afora?

Sob a ameaça de ser suspenso de competições oficiais pela FIFA, a direção colorada conseguiu convencer o torcedor retirar a ação. O presidente do Corinthians na época, Alberto Dualib, chegou a afirmar em telefonemas captados pela Polícia – por conta da relação com Kia Joorabchian e Boris Berezovski e Pini Zahafi num suposto esquema de lavagem de dinheiro – que o título de 2005 deveria ser do Inter…

NADA ATINGE A PODEROSA FIFA

Independente do mérito, sabíamos que isso não iria acabar bem. Quando saiu a notícia que o Brasil de Pelotas e o Treze ganharam a vaga numa instância da Justiça Comum era previsto que a toda poderosa não aceitaria a decisão – ainda mais se levarmos em conta o “tamanho” desses clubes.

A entidade máxima do futebol mundial tem suas próprias leis e consegue achar brechas para se impor quando necessário. Basta vermos a Lei Geral da Copa, em que alguns itens impostos pela FIFA ferem as leis vigentes no país. O exemplo mais claro será a venda de bebidas alcoólicas dentro dos estádios durante a Copa do Mundo FIFA, o que antes e depois do evento será proibido.

Óbvio que os clubes têm que lembrar das suas relações de força e se abastecer de uma forte proteção jurídica antes de entrar com ação na Justiça Comum, não podendo cometer erros de “não saber que o jogador estava suspenso” ou coisas do tipo, mas quando a definição vai para os tribunais e não dentro de campo, os grandes prejudicados são os torcedores.

As Séries C e D seguem paradas e os outros clubes que nada têm a ver com isso também acabaram no prejuízo, sem poder entrar em campo e gerar receita.

 (Para quem quiser nos ajudar criticando e/ou sugerindo novas propostas e assuntos, entre em contato através dos e-mails [email protected] e [email protected])

QUEM ESCREVE:

Anderson Santos é jornalista e mestrando em comunicação social na Unisinos ([email protected]), Dijair Brilhantes ([email protected]) é estudante de jornalismo & Bruno Lima Rocha ([email protected]) é editor do portal Estratégia & Análise (www.estrategiaeanalise.com.br).

Twitter da coluna: @alem_das4linhas

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