JUSTIÇA? Morte da garota, liberdade ao motorista e a suprema dificuldade de entender, do cidadão comum
Até o momento em que esta nota é publicada, Franciéli da Silva Melo, 22 anos, segue internada em estado grave na UTI do Hospital Santa Luzia, em Capão da Canoa. Na manhã de Natal, ela sobreviveu ao acidente que matou a companheira dela, Manoella da Silva Teixeira, de 19 anos.
A tragédia conseguiu ficar maior (como se fosse possível), pela liberação do motorista causador do acidente fatal, por conta da falta de “atestado de óbito”, como relata o noticiário. Muito se noticiou a respeito, desde então. Mas ninguém pegou melhor o espírito da coisa, na opinião deste editor, do que o jornalista Juremir Machado. Vale, meeeesmo, conferir, o que ele escreveu em seu blogue, na versão online do jornal Correio do Povo. A foto é de Divulgação, da Brigada Militar. A seguir:
“O homem comum, como eu, espera da justiça decisões com critérios. Os homens incomuns, categoria na qual se inserem os especialistas e os membros do judiciário, trabalham com uma noção mais sinuosa: a justiça é uma só, mas os juízes são muitos. Cada um pode ter um entendimento diferente. É isso. O que torna a justiça incompreensível para os leigos é o entendimento. Eu, por mim, abolia o entendimento. Seria melhor um robô julgando. Ficaríamos livres do entendimento. O judiciário gaúcho vai ao STF pedir a manutenção do imoral auxílio-moradia para a magistratura alegando que a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul não pode derrubar medida do STF.
Faz sentido. Mas continua indecente. O que deve prevalecer? A decência.
Enquanto isso, uma desembargadora anulou o aumento do salário mínimo regional. O governador deveria ter mandado o projeto de aumento no primeiro semestre de 2014 por ser ano eleitoral. Não mandou, segundo se sabe, para não parecer eleitoreiro (ou, segundo a oposição, para não fechar as portas das empresas financiadoras de campanha). Mandou depois das eleições. Eleitoreiro não ficou. Mas as empresas, que não querem pagar, arranjaram motivo para contestar. Faz sentido. Mas continua chocante. O mesmo judiciário que luta pelos seus privilégios encontra motivos para atrapalhar a vida da plebe.
Um motorista bêbado entrou na contramão e matou uma jovem em Capão da Canoa. Houve flagrante. A juíza não homologou o flagrante por faltar o atestado de óbito. Está de brincadeira. O que pensa o homem comum, o sujeito, que como eu, quer um papo reto: o motorista era branco e de classe média alta. Dirigia uma EcoSport. A moça que morreu era pobre e homossexual. Ia para o batente cedo num feriado. Um leitor me pergunta: como quem se identifica quem tem a tarefa de julgar? O criminoso vai responder em liberdade. A família está revoltada. O homem comum também. O sujeito não quis fazer o teste do bafômetro. Para o homem comum, como eu, isso tem valor de confissão. Ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Então ninguém poderia ser obrigado a passar no Raio-X de aeroporto. É diferente? Não vejo como. É a máquina que produz a prova? Fala sério, cara!
A lei precisa mudar. Envolveu-se em acidente: bafômetro. Estou cansado do entendimento. Li a minuta do projeto que altera a Lei Orgânica da Magistratura. Está no STF. Os juízes querem uma dúzia de bolsas (creche, alimentação, inclusive em férias, educação para filhos até 24 anos, formação em nível de pós-graduação, tudo). Se ganharem, virarão semideuses. Não digo deuses para evitar um processo e o pagamento de indenização. Devo ter entendido mal. O problema é sempre o entendimento. A gente não entende o judiciário com tantos juízes e tantos entendimentos. Sou positivista. Acredito que é possível ter regras claras aplicáveis objetivamente para situações equivalentes. Entendo que a razão humana permite saber quando as situações são equivalentes. É um mistério da natureza humana. Pretendo dedicar o resto da minha vida a combater o entendimento, inclusive o meu.
Quando há muito entendimento, ninguém entende mais.”
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Bueno, pode ficar pior. Outro dia o STF decidiu que processos penais em curso não podem ser considerados maus antecedentes. Coisa fina, mas pela lógica atual do sistema é coerente.
No judiciário não vale fio de bigode. Se o pedido do flagrante embasou-se no óbito, tem que ter o atestado. Não pode ficar na palavra. Quem alega tem que provar. No direito penal, formalidade é garantia. Falhou quem não anexou o documento.
E, compreensivelmente, as pessoas só se preocupam com as regras quando aperta o sapato. Mudar não precisa, só é necessário um "jeitinho", uma exceção.
Na última eleição a população, preocupada com a segurança pública, elegeu um sem número de policiais e militares. Diagnóstico dos luminares: o Congresso está mais conservador.
Conferi e, humildemente, concordei.