Ócio administrativo versus pulsão social – por Atílio Alencar
Sou um entusiasta das iniciativas que abordam a cidade como um ambiente vivo, repleto de nuances, avesso à linearidade que um tipo de gestão em voga quer impôr aos espaços urbanos. Santa Maria, na contramão dos melhores exemplos atuais do urbanismo mundial, é uma cidade cuja administração não investe na qualidade do convívio público.
Vivo dizendo isso, e duvido muito que mesmo o mais aguerrido defensor – ou correligionário – do atual governo tenha coragem de contrapor essa impressão.
De todo modo, e isso me interessa ainda mais que a prepotência e incapacidade administrativas, tudo o que acontece de mais interessante no sentido de vitalizar o espaço público parte diretamente da sociedade civil. A melhor virtude de um bom governo é captar essas tendências vivas e arranjá-las em forma de política pública, investimento, cuidado coletivo.
Em Santa Maria, ideias e práticas as mais diversas ocupam os espaços e ressignificam os itinerários quadrados, conferindo-lhes real valor público através do uso criativo, essencialmente dinâmico, das ruas, praças, parques.
A trágica prova de que o poder público local é insensível aos anseios da população é a incapacidade histórica de negociar soluções não-proibitivas para a concentração festiva dos calouros na praça Saturnino. Claro que o tema é complexo e quem acredita ter uma solução pronta está sendo simplesmente precipitado ou reducionista. Mas é incrível que sazonalmente sejamos obrigados a assistir ao mesmo alarde, as mesmas medidas reativas e – infelizmente – o agravamento dos problemas crônicos gerados pela incapacidade administrativa de lidar com uma tradição estabelecida na cidade.
Mas pra não dizer que não falei das flores: essa semana conversei com a arquiteta Ana Paula Nogueira, uma das criadoras e responsáveis pelo projeto Cinemando, que propôe a experimentação de espaços urbanos em desuso através da fruição cinematográfica.
Espécie de cineclube itinerante, o Cinemando funde cinema, arquitetura, sociologia e artes visuais num mesmo laboratório, explorando o que Ana descreve como os “efeitos colaterais” da urbanização e da especulação imobiliária: ruínas, casas e pátios abandonados, paredes cegas, pontes, viadutos – tudo pode servir como sala de cinema improvisada.
É o tipo de iniciativa que não cativa empresários, nem merece espaço nas campanhas de valorização da cidade. Mas com certeza, na sua efemeridade e dimensão, contribuem para que Santa Maria se aproxime um pouco mais da legenda de cidade cultura.
OBSERVAÇÃO DO EDITOR: a imagem que ilustra este artigo é uma reprodução obtida na Comunidade Cinemando no Feicebuqui.
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