Sem medo do escuro – por Bianca Zasso
A atriz Audrey Hepburn tinha o título dos mais belos olhos castanhos do cinema. Acompanhado por um sorriso encantador, o olhar da belga conquista o público sem grande esforço. Foi esta beleza delicada que rendeu a Audrey uma infinidade de convites para interpretar mulheres elegantes e sedutoras. Ela cumpriu sua função e tornou-se um ícone não só do cinema, mas também da moda. Porém, foi longe dos figurinos glamorosos e dos trejeitos espevitados que ela realizou a melhor interpretação de sua carreira.
O diretor Terence Young (responsável por três exemplares da franquia 007) construiu em Um clarão nas trevas um exemplar de suspense inteligente, sem frescuras e com atuações que dispensam qualquer efeito especial. A trama, inspirada na peça teatral homônima de Frederick Knott, envolve Suzy, uma jovem que perdeu recentemente a visão, e três bandidos em busca de uma boneca recheada com heroína. O brinquedo caiu nas mãos de Sam, marido de Suzy, na chegada ao aeroporto, onde Lisa entrega a nada inocente bonequinha acompanhada de uma desculpa esfarrapada.
Lisa, no caso, é esposa de um dos bandidos, o excêntrico e sádico Roat, que está disposto a recuperar seu material. A relação entre os personagens parece confusa, mas poderia ser resolvida com muitas cenas de sangue, perseguição e gritaria. Terence Young, apoiado em um roteiro impecável assinado pela dupla Robert Carrington e Jane-Howard Hammerstein, nos leva para outro caminho.
Em determinado momento da história, que pode ser considerado um clímax mais longo que o normal, Suzy e Roat travam um embate que vai além do mocinha e bandido. Audrey Hepburn e Alan Arkin, os intérpretes, só precisam de seus rostos para deixar a plateia sem ar. A angústia de Suzy, com um bandido dentro de casa, que confunde seus sentidos apurados, está nos olhos de Audrey, aqueles mesmos que seduziram o mundo.
Há sedução, não se pode negar, mas ela é cinematográfica. Ao apagar todas as luzes da casa e colocar Roat em pé de igualdade, Suzy acende um fósforo de tempos em tempos, a cada momento de luz demonstrando mais medo e deixando o público mais tenso. Rompendo com a ideia do cinema, a arte da imagem, Terence Young nos deixa no escuro e, mesmo assim, continua contando uma história. É daqueles momentos que marcam a vida de qualquer cinéfilo.
Um clarão nas trevas, apesar de ter sido lançado em 1967, ainda guarda alguns resquícios de cinema clássico, percebido no final feliz que quebra um pouco o clima construído ao longo de pouco mais de uma hora e meia de filme. Mas nem o hábito de criar uma aura mágica nas cenas finais estraga o poder da produção, que além de ser um ótimo entretenimento, é uma aula sobre como é possível fazer um grande filme com poucos cenários, mudanças sutis e atores sem maneirismos.
Em tempos de computação gráfica, cenários digitais e terceira dimensão, Um clarão nas trevas ilumina nossa esperança no cinema.
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