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JUSTIÇA. “Magistrado não é para dizer o que acha, mas dizer o que a lei determina”, afirma Nelson Jobim

“As coisas vão andando e a lucidez começa a tomar, porque o que ocorre hoje no Brasil, principalmente em termos de política, é que tem uma variável nova que é o ódio. O adversário não é mais adversário, é inimigo… E a política é, claramente, o diálogo dos controversos”

Do jornal eletrônico SUL21, em entrevista de Fernanda Canofre. A foto é de José Cruz (Agência Brasil)

Há dois anos, Nelson Jobim se tornou sócio e membro do Conselho de Administração do Banco BTG Pactual. Banco que ganhou as manchetes quando um de seus fundadores, André Esteves, teve o nome envolvido em investigações da Operação Lava Jato. Desde que deixou o cargo de ministro da Defesa, durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), em 2011, Jobim saiu da cena pública. Dos 30 anos nela, quatro foram trabalhando com governos do PT, desde que o então ministro da Justiça, Tarso Genro (PT), o convidou para ajudar o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante a crise aérea de 2007. Segundo um perfil publicado na revista piauí, Jobim hesitou, conversou com a esposa e acabou decidindo dar o sim, comovido pelo acidente da TAM, no aeroporto de Congonhas, que matou 199 pessoas.

Antes disso, tinha sido homem de confiança de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), nos anos 1990. Foi ministro da Justiça e nomeado ao Supremo Tribunal Federal (STF) por ele. Filiado ao MDB desde meados dos anos 1970, Jobim dividiu apartamento com José Serra (PSDB), foi seu padrinho de casamento e votou no tucano nas eleições de 2010, mesmo ocupando o cargo no ministério de Lula, que iria manter com Dilma.

“Eu me dou com todo mundo”, disse ele durante a entrevista ao Sul21, realizada na sexta-feira (3), durante uma passagem por Porto Alegre, para um evento promovido pela Escola do Legislativo da Câmara de Vereadores. Essa seria a explicação para o porquê do seu nome ser cogitado como um nome de “união”, nas últimas crises institucionais de Brasília, acredita.

Natural de Santa Maria, formado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Jobim é filho de Hélvio Jobim, advogado eleito presidente da Arena na sua cidade natal, nos anos 1970, e neto do ex-governador do Estado e embaixador, Walter Só Jobim, que participou da Revolução de 1930 ao lado de Getúlio Vargas.

Em maio de 2017, quando os áudios de Michel Temer (MDB) conversando com o empresário Joesley Batista sobre a situação de Eduardo Cunha (MDB) vazaram, Nelson Jobim era o nome forte cogitado para ser colocado em uma eleição indireta para substituir o vice de Dilma. Hoje, ele diz que “não tinha o mínimo interesse” em aceitar.

Mesmo de fora, porém, continua sendo alguém com muito a dizer sobre o que acontece no cenário político brasileiro. Ainda pareça tomar cuidado na fala. Em entrevistas, avaliou como errada a decisão da presidente do STF, Carmen Lúcia, de votar o habeas corpus de Lula antes da questão da prisão após condenação em segunda instância. Homem que aproximou os governos do PT das Forças Armadas e conseguiu enterrar o debate sobre revisão da Lei da Anistia no Supremo, Jobim diz que o deputado Jair Bolsonaro (PSL) não representa o pensamento dos militares brasileiros.

Na entrevista abaixo, ele fala sobre o cenário atual da política e do Judiciário, porque decidiu ficar de fora do pleito deste ano e o que acha de como o Brasil lida com o passado da ditadura militar:

Sul21: Quando vazaram os áudios de Michel Temer com o empresário Joesley Batista, da JBS, se falava sobre a possibilidade de eleições indiretas, seu nome era apontado como um dos favoritos. O senhor teria aceitado se postular?



Nelson Jobim: Trabalhar com “se” é muito difícil. Aquilo foi ideia que surgiu de outros. Eu estou fora da política há muito tempo. Fiquei trinta e poucos na atividade pública, agora estou em atividade privada, não tinha o mínimo interesse em fazer isso.

Sul21: Seu nome era colocado como possibilidade porque o senhor era visto como alguém que poderia “unir”. O senhor se enxerga dessa maneira?



Jobim: Eu me dou com todo mundo. Esse é o juízo dos outros. Não avalio o juízo dos outros em relação a mim. Ou seja, eu tenho relação com todo mundo, passei por várias áreas, vários setores, fui razoavelmente bem em cada um deles, então, as coisas agora encerraram.

Sul21: Esse ano circulou na imprensa que o senhor teria perdido o prazo para regularizar sua situação partidária e ter possibilidade de ser o candidato do MDB. O jornal do O Estado de São Paulo disse que o senhor recorreria no Tribunal Regional Eleitoral.

Jobim: Não houve nenhum problema, estava tudo correto. Não lembro o que era, porque isso foi conduzido pelo partido em Santa Maria. Era só para regularizar a situação, porque eu não tinha nenhum interesse em ser candidato. Não aceitei, inclusive, qualquer tipo de candidatura. Está tudo regularizado agora, sou filiado desde 1970 e poucos. Só ficou suspensa a filiação durante o período que eu fui membro do Supremo Tribunal Federal.

Sul21: Intenção de ser candidato o senhor não tem?

Jobim: Nenhuma (risos).

Sul21: Há uma ala do MDB que gostaria de ter o senhor como candidato presidencial do partido.

Jobim: Houve sim, eu fui sondado diversas vezes. É aquelas coisas de sempre. Mas não é possível.

Sul21: Por que não, ministro?



Jobim: Porque já passou. Já passou e já virei a página.

Sul21: E a possibilidade de ser vice em alguma chapa? Em 2006, o senhor foi sondado para ser o vice de Lula na campanha de reeleição. 



Jobim: Fui, mas muito remotamente. Agora estou com mais de 70 anos, tenho que sossegar um pouco. Estou fora.

Sul21: Isso tem a ver com alguma frustração com a política?



Jobim: Não, eu viro a página. Não é frustração com a política, mas agora estou fazendo outra coisa. Gosto do que estou fazendo e ponto.

Sul21: Em entrevistas recentes, o senhor criticou a decisão da presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, em ter pautado a decisão sobre o habeas corpus do ex-presidente Lula antes de discutir a Ação de Declaração de Constitucionalidade (ADC), sobre execução da pena após condenação em segunda instância. Por quê?



Jobim: Ela tinha que julgar primeiro a matéria abstrata, ou seja, onde não era fulanizado o processo. Discutia-se a tese, em que havia, inclusive, a possibilidade de que essa tese fosse vencida. Mas, venceu colocar em pauta o habeas corpus que era uma questão específica. Tanto é que criou-se um ambiente difícil dentro do tribunal, inclusive, para a ministra Rosa Weber, que tem uma posição de obedecer o colegiado e ficou aquele problema: havia uma decisão do colegiado anterior, sobre o problema da segunda instância, que não tinha sido reformada, ela teve que votar contra o habeas corpus ao Lula, por isso. Mas, como seria se tivesse sido votada primeiro a matéria principal? Ou seja, o habeas corpus de Lula era uma matéria subordinada à decisão. Foi votado o subordinado antes do subordinante.

Sul21: O que o senhor achou do vaivém de decisões sobre outro habeas corpus de Lula, no dia 8 de julho?



Jobim: Eu não conheço bem o caso em si, mas foi algo que ficou marcado. Marcado pelo fato de que, num determinado momento, um juiz que estava em férias, decide interromper suas férias para voltar a tomar jurisdição. Não estou dizendo que a decisão tenha sido certa ou errada, sobre um habeas corpus que eu não conheço, mas acho curioso que, quem está sem jurisdição, porque está gozando de férias, acabe interrompendo as férias para se opor a uma decisão ou outra. Mostra que havia um certo tumulto ali.

Sul21: Como deputado constituinte, o senhor participou da comissão responsável por discutir a separação de poderes. Há poucos minutos, ouvimos o juiz Leandro Paulsen, presidente da 8ª turma do TRF4, que condenou Lula, falando que gostaria que o Judiciário fosse “menos ideológico”. Como o senhor observa isso? 



Jobim: Há uma certa disfuncionalidade. As instituições estão funcionando, mas há uma certa disfuncionalidade. A disfuncionalidade está na Câmara, no Executivo, no próprio Judiciário. Há um momento em que o velho está terminando e o novo ainda não pode nascer.

Sul21: Como se resolve isso?



Jobim: As coisas acabam se acertando. As coisas vão andando e a lucidez começa a tomar, porque o que ocorre hoje no Brasil, principalmente em termos de política, é que tem uma variável nova que é o ódio. O adversário não é mais adversário, é inimigo. Então, você obstruiu qualquer tipo de diálogo e a política é, claramente, o diálogo dos controversos. Ou seja, onde adversários têm que dialogar para criar uma solução alternativa que possa conduzir o país para frente…”

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4 Comentários

  1. Certa feita Jobim era ministro da defesa e foi a uma audiência na Câmara. Lá pelas tantas um parlamentar perguntou: ‘Exército fez uma manobra na Amazônia e o nome da operação era tal. Por que escolheram este nome?’. Primeira coisa que vem a cabeça é ‘que pergunta imbecil’. Resposta do ministro? ‘Não sei porque colocaram este nome, sou analítico-dedutivo e não aristotélico-tomista’. Filosoficamente é controversa a resposta, mas a cara dos deputados rendeu boas risadas. Tempo depois, alguém refez a pergunta em outros termos. Resposta: ‘A operação tinha que ter um nome, escolheram este, não tem importância’.
    Conclusão: nem todo(a) jornalista pode entrevistar qualquer pessoa. Não funciona,

  2. Manchete já pede a volta do juiz boca da lei, positivismo, etc. Problema é que quando o legislativo está tomado por gente que é corrupta, por gente incompetente e por gente que só pensa no próprio bolso e não nos interesses coletivos, as leis só servem para manter o que se vê por aí.
    Outro problema, num sistema podre, que busca a autopreservação, dizer que ‘eu me dou com todo mundo’ não é exatamente algo para se gabar (porque significa em certa medida algum tipo de compromisso). Ou seja, o discurso é conservador, trata como normal a completa anormalidade. Pior, prega que os envolvidos se comportem como se tudo estivesse no devido lugar, de forma burocrática.
    ‘As coisas acabam se acertando’ é uma obviedade, a menos que um meteoro atinja o planeta alguma coisa vai acontecer. Só não vai ficar ‘bem’ para todos.

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