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Plásticos convencionais x plásticos biodegradáveis – por Marta Tocchetto

O meio ambiente não suporta mais a carga diária de lixo, escreve a articulista

As restrições impostas pelas leis que proíbem o uso de plásticos convencionais e liberam os biodegradáveis não resolvem o problema ambiental, apenas o recodifica.

O site do Supremo Tribunal Federal publicou decisão tomada pela corte no dia 19 de outubro, semana passada, a respeito da constitucionalidade da exigência estabelecida, em 2011, pelo município de Marília (SP) quanto a substituição de sacos e sacolas de plásticos de polímeros derivados de petróleo pelos de materiais biodegradáveis.

Para o relator do processo, ministro Luiz Fux, a norma é compatível com a Constituição Federal e os municípios têm competência para definir leis que tratam sobre a proteção ambiental. A decisão unânime terá repercussões em todo o país, tendo em vista que ao menos sessenta e sete processos tinham controvérsia similar.

A argumentação para a decisão se baseou no tempo de degradação dos materiais plásticos e na preocupação mundial com o crescente uso e impactos decorrentes dos resíduos. No final de 2019, foi apontado que as sacolas plásticas já eram banidas em noventa países e em outros trinta e seis o tema estava em discussão. Após a aprovação do STF, os estabelecimentos comerciais de Marília têm doze meses para se adequar.

Os sacos e sacolas plásticas biodegradáveis levam até dois anos para se decompor, por outro lado, os derivados de petróleo levam centenas de anos. Enquanto não se degradam, entopem bueiros, poluem as águas e o meio ambiente, matam aves e outros animais. Sem falar nos microplásticos que, comprovadamente por estudos científicos, ingressam na cadeia alimentar tendo sido identificados inclusive, no leite materno humano.

Na onda da preocupação, surgem novidades quase diariamente. São plásticos produzidos a partir do abacaxi, maracujá, além dos já conhecidos de mandioca, milho, batata e trigo e, também de cana de açúcar.

Eles têm uma grande vantagem. São produzidos a partir de vegetais, os quais podem ser renovados a cada safra ou estação. Diferentemente do petróleo, que demora milhões de anos e necessita de condições especiais para se formar. Além disso, as matérias vegetais são biodegradáveis. Significa dizer que os microrganismos presentes no ambiente conseguem degradá-las.

Os plásticos convencionais não são biodegradáveis, por isso demoram tanto tempo para se decompor. Todas estas inovações no campo dos polímeros são positivas, mas isso não quer dizer que elimina a poluição. Este alerta raramente é informado. A impressão é que o problema estará resolvido, pois ao entrarem em contato com o ambiente, inclusive com o mar, as bactérias irão “comê-los”.

É bom que se esclareça que neste processo também são gerados produtos de decomposição. Se continuarmos consumindo com a voracidade atual, a matéria orgânica resultante também causará impacto ambiental – processo similar ao que acontece com os restos de comida. É por este motivo que não basta a troca. O problema não está resolvido!

Não resolve trocar seis por meia dúzia. O meio ambiente não suporta mais a carga diária de lixo. A capacidade de assimilação, inclusive dos biodegradáveis, é limitada. As restrições impostas pelas leis que visam apenas proibir o uso de determinados produtos e liberam outros não resolvem o problema ambiental, apenas o recodifica.

A vida moderna, atribulada e sem tempo, somada ao evento de pandemias cada vez mais frequentes trouxeram um aumento no uso de descartáveis. O crescimento no consumo não se reflete na destinação correta – coleta seletiva para posterior reciclagem. Resíduos biodegradáveis, incluindo os plásticos, devem ser encaminhados à compostagem ou à biodegradação para aproveitamento energético.

O processo de educação ambiental deve caminhar ao lado da destinação correta e ser exercido por todos, inclusive pelos estabelecimentos comerciais levando o consumidor à reflexão. Me causa estranheza que redes de supermercados, lojas, restaurantes e distribuidores de alimentos que tanto falam em sustentabilidade e meio ambiente não possuam programas de recebimento de sacolas e embalagens usadas em parceria com as associações de catadores – logística reversa prevista pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.

É uma forma simples e de custo muito baixo ou, praticamente nenhum, com ganhos ambientais, sociais e de marketing muito expressivos. Ao lado do impulso aos plásticos biodegradáveis, reduzir a geração de resíduos e repensar o modo de consumo são fundamentais. O planeta não pode ser tratado como uma grande lata de lixo com capacidade ilimitada para absorver nosso modo de vida insustentável.

Antes de substituir e reciclar é fundamental não gerar ou, se for inevitável, gerar o mínimo possível para reduzir os impactos socioambientais, econômicos e à saúde, provocados pela elevada carga poluente despejada diariamente no planeta. Dizer não às práticas consagradas e impensadas de distribuição “gratuita” de sacolas e sacos plásticos, canudos, mexedores de café, copos e outros descartáveis de uso único representa transformação de atitudes e de comportamentos.

Educação ambiental também se faz com boas práticas e atitudes, aparentemente, simples e pequenas, devendo ser incentivada em toda a cadeia de produção, de distribuição e de consumo. Os municípios têm competência e devem promover a defesa do meio ambiente, bem como zelar pela saúde de todos os indivíduos indistintamente.

(*) Marta Tocchetto é Professora Titular aposentada do Departamento de Química da UFSM. É Doutora em Engenharia, na área de Ciência dos Materiais. Foi responsável pela implantação da Coleta Seletiva Solidária na UFSM e ganhadora do Prêmio Pioneiras da Ecologia 2017, concedido pela Assembleia Legislativa gaúcha. Marta Tocchetto, que também é palestrante em diversos eventos nacionais e internacionais, escreve neste espaço às terças-feiras.

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