Manteiga na garrafa – por Tânia Lopes
O casal novinho fora morar no campo, com os sogros.
A moça citadina procurava aprender com a sogra os macetes da cozinha campeira.
De manhã cedo um empregado trouxe o leite no tarro de alumínio, que brilhava de tanto asseio.
A sogra pôs o leite a ferver numa panela grande:
– Hoje em dia se sabe que não dá para tomar o leite sem ferver… Por mais que se limpe tudo sempre é possível pegar doenças… Melhor ferver bem! Eu deixo levantar a fervura umas três vezes por garantia! – ensinou.
A nora balançou a cabeça aquiescendo, falando: – O cheiro de leite me enjoa um pouco…
Depois que o leite foi fervido a mulher afastou para um canto do fogão até refrescar para só então repartir nas vasilhas menores que seriam mandadas para os outros filhos casados que tinham crianças. Zelo de avó alívio para as noras que já recebiam o leite fervido!
O restante do leite ficou esfriando até juntar uma nata grossa que foi delicadamente retirada com uma espumadeira e colocada numa garrafa com o auxílio de um funil. Feito isso, bem tampada, a garrafa foi guardada no armário para esperar a coleta de mais nata nos outros dias.
Numa manhã o rapaz convidou a mulher para ver a safrinha do milho. Foram a cavalo, a mulher na garupa, medrosa, agarrou-se ao marido. Espirou o cheiro do seu homem, o cheiro do cavalo, aconchegou-se no macio do pelego. Mas sentiu um pequeno desconforto dos seios intumescidos batendo nas costas do cavaleiro. Pôs a cabeça no ombro do amado para criar espaço e conforto…
Quando chegaram, os dois admiraram o verdor do milharal. Ele arrancou uma espiga e viu que os grãos estavam estufadinhos e leitosos.
– Granaram bem…Vai dar um bom lucro! – falou.
– É bom… – disse a recém-casada – esfregando carinhosamente o ventre…
Ele olhou espantado, com a boca meio aberta… – Entendi bem? – perguntou cabreiro, abraçando-a.
– Estou achando que sim… – ela sorriu – mas não fala nada ainda, tá? Quero ter certeza…
Os tempos correm lentos no campo. A pressa fica para as cidades!…
– Pensava a mulher, agora com mais certeza do acontecido.
Noutra manhã a sogra lhe alcançou a garrafa de nata.
– É assim que se bate até virar manteiga – mostrou-lhe – sacudindo a garrafa na vertical. A moça pegou a garrafa e sacudiu na horizontal:
– E é assim se sacode criança pequena? – falou sorrindo.
– Ah!… É assim! – respondeu a sogra docemente – Eu já estava desconfiada!
E riram as duas com gosto.
A AUTORA
Natural de Itaqui e professora de Artes Plásticas da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Tânia Lopes é detentora da cadeira número 8 da Academia Santa-Mariense de Letras, cujo patrono é Érico Veríssimo. Já publicou mais de 11 obras e, em 2004, foi a patronesse da Feira do Livro Infantil de Santa Maria.
Este conto foi publicado com autorização da autora. Crédito da imagem no topo da página: Daniel Kirsch / Pixabay. Crédito da foto da autora: Lucas Linck / LABFEM-UFN.
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