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Écsa – por Orlando Fonseca

Em uma postagem no Facebook, alguém registrou, em foto, uma gurizada de camiseta da seleção, torcendo pela conquista da sexta copa do mundo. No alto, bandeirinhas verde-amarelas, no muro e em uma parede ao fundo, uma pintura tosca da bandeira nacional. No asfalto, à frente deles estava escrito: Que venha o écsa. A forma idiossincrática usada pelos brasileirinhos torcedores me levou a um outro tipo de reflexão a respeito do momento em nosso país. A palavra que usei para o título comporta, no caso, uma polissemia (uma ambiguidade), pois também me remete a uma onomatopeia que simula a expressão de nojo, de ojeriza ou desprezo. E assim é que sintetiza muito do que sinto, neste período pós-eleições e véspera da estreia de nosso escrete em campos do Catar. Por um lado, a conjuntura nacional não recomenda uma festa como grande parcela da população (aliás, a maioria – pois é, não parece) pretende. Por outro, as notícias que nos chegam do país sede da Copa 2022 não são nada animadoras, quanto ao tratamento dado aos trabalhadores das obras para o Mundial.

No primeiro caso, todos estamos assistindo, desde as eleições de 2018, a usurpação dos símbolos nacionais, apropriados por um grupo que reivindica a hegemonia, a exclusividade do patriotismo. Não basta que elejam o seu correligionário, pretendem impor a sua ideologia quanto ao conceito de Pátria. E não fica por aí, querem colocar acima Deus, e dizer aos demais o que se deve entender por Família. Como sabemos, o slogan formado pelas três palavras não é apenas o resultado de uma “feliz” combinação, pois sintetizam o programa de partidos fascistas ou neofascistas mundo afora. E não é de hoje, pois os correligionários de Mussolini na Itália, e seus simpatizantes Integralistas no Brasil, ainda na primeira metade do século passado, também já falavam nestes termos.

É bom que esse pessoal que só se informa pelas redes de WhatsApp se informe melhor sobre o que acontece no resto do planeta. Nos últimos anos, cresceu uma consciência entre jovens empreendedores a respeito dos direitos humanos. Isso tem influenciado na emergência de um novo capitalismo, quem vem impulsionando uma nova ordem mundial. Um reflexo disso foi o que vimos nos noticiários: vários artistas se recusaram a cantar na abertura dos jogos, como boicote pelos maus tratos havidos nos canteiros de obras para a construção dos estádios no Catar. Aliás, como é rotina por lá, onde não subsiste um estado democrático. Pois é, a colombiana Shakira, que fez sucesso na abertura da Copa de 2010, na África do Sul, recusou o cachê desta edição. Assim como ela, Dua Lipa, Rod Stewart e Mel C.

E para um cara como eu, que adora assistir aos jogos de futebol, a copa é o suprassumo do espetáculo esportivo. Como fico? Faço boicote e fico sem participar deste momento de alienação universal que só o futebol é capaz de proporcionar? Claro que não falo da alienação política, mas do prazer estético que uma boa partida de futebol proporciona. Ora, também tenho direito a um dia, como canta o Chico Buarque, de ser feliz – ele se referia ao carnaval, mas em nosso país é quase a mesma coisa. Logo agora que, a meu juízo, sendo um espectador aficionado pelo esporte bretão, temos uma das melhores gerações de jogadores dos últimos campeonatos mundiais. Ou seja, é bem real nossa chance de apagar de uma vez por todas o vexame daqueles 7×1 para a seleção alemã.

Vou ter de fazer algumas concessões, porque deixar de olhar não vou. Talvez não saia, se for o caso, enrolado na bandeira, nem vista uma camiseta canarinho, mas vou ficar na torcida por um bom espetáculo de nosso time. Que venha o écsa, ou o hexa, na hora eu decido como vou chamar o resultado que espero. Não vou, de jeito nenhum, compartilhar com os que estão querendo que se repitam aqueles 7×1 na semifinal. Indo à final já estará de bom tamanho.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

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6 Comentários

  1. Alás, bafafá semana passada em Itaara. Completamente irrelevante. Voltando, é da natureza humana inventar desculpas para si mesmo. Não deixa de ser uma contradição. Muita gente que nunca usou o Verde e Amarelo para absolutamente nada (uns já usaram muito vermelho) reclamam da ‘apropriação indébita’. Alas, Simone Tebet aconselhou a sumir com o Vermelho que foi trocado pelo branco da paz. Helas, teve uma eleição passada na qual todos os partidos esconderam as proprias cores. Resumo da opera: se a economia for para o vinagre o governo eleito não dura 2 anos. Simples assim. Assume Alckmin. Aquele que era da TFP e da Opus Dei. Agora é ‘aliado’.

  2. Só porque a imprensa tradicional deu enfase, e muito sermão, a um assunto não significa que a população deu a mesma importancia. Estado democratico ou não, mortes (se a Copa sai no inverno por conta da temperatura iriam contruir quando? maltratos é narrativa), artistas (que são entretenimento e não conjunto de intelectuais), etc. Maioria está c@g@ndo para isto tudo e vai ver ou não os jogos conforme cada um entenda que deva. Simples assim. Parece uma ananá que vai para a tv dizer ‘vacinem-se vacinem-se’, acha que alguém vai mudar de opinião só porque ela esta falando. Vermelho que não seja narcisista não existe.

  3. ‘[…]emergência de um novo capitalismo, quem vem impulsionando uma nova ordem mundial.’ Sim, tem toda a chance. Jovens empreendedores irão falar tudo o que acharem que resulta em dinheiro no caixa.

  4. Simbolos nacionais são de todos, não cabe à esquerda dizer quando o uso é legitimo ou não. Obvio. Familia no contexto atual é bandeira dos cristãos que apoiam o movimento. Por que não tem nada a ver com Integralismo ou Facismo? Porque estes dois tem em comum com os Vermelhos uma caracteristica bem definida: o papel do Estado. Os tres são anti-liberais. Não dá para ser fascista e ‘defender o Estado Minimo’. A conta não fecha. Inclusive um imbecil que gosta de mandar os outros ‘estudar’, um que fica usando citações de livro como muleta para pensar o que vai dizer depois, afirmou por aí que não dá para chamar de facista ou comunista. Pois bem, lendo o estatuto do PCdoB ‘Organização política de vanguarda consciente do proletariado, guia-se pela teoria científica e revolucionária elaborada por Marx e Engels, desenvolvida por Lênin e outros revolucionários marxistas.’ Desconfio que sejam comunistas. Melhor estudar mais um pouco.

  5. Também não foi ‘desde a eleição de 2018’. Jornadas de 2013, no rastro das Revoluções Coloridas (nada a ver com Collor), mostrou a adesão ao Verde e Amarelo. ‘Minha bandeira jamais será vermelha’. Em alguns lugares, há materias na internet como diz o outro, queimaram bandeiras petistas. 2013 ficou mal resolvido. Não se sabe no que vai dar.

  6. Primeiro desqualificação do pessoal de verde e amarelo. ‘Analfabetos’. Depois, algo que aconteceu semanas atrás, mensagens vazadas de Simone Tebet. ‘”Não é vai dar PT. O povo está votando contra [Jair] Bolsonaro, e não no PT”. Obvio. Vermelhos têm problemas cognitivos ficam repetindo ‘narrativas’ que todos vêem não corresponder a realidade.

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