Coluna

Uma bela dama – por Bianca Zasso

biancaManter a pose. Muitos tentam, uns tantos conseguem e quase todos são desmascarados. Seja por vaidade ou para honrar um nome dito importante, muitas são as estratégias para se manter intacto nas loucas voltas que o mundo dá.

Basta lembrar de Blanche DuBois, da clássica peça de Tennessee Williams Um bonde chamado desejo. Não aceitava a passagem do tempo e construiu um castelo de mentiras para encarar seus dias no sul dos Estados Unidos e precisa seguir em frente com elas ao ir morar junto da irmã e do cunhado na quente New Orleans. Décadas depois, Woody Allen segue seu passeio cinematográfico fora de Nova York utilizando a obra de Williams como principal inspiração.

Blue Jasmine, lançado em 2013, é um filme dos tempos de crise. A protagonista, interpretada de forma impecável por Cate Blanchet, tinha o casamento dos sonhos com um milionário que não fazia nada além de mimá-la com joias caras e viagens sem fim. Descoberta a fonte ilegal da fortuna do marido, a socialite se vê com duas malas Louis Vuitton e nenhum tostão no bolso.

A saída? Pedir asilo na casa da irmã que ela julga perdedora Ginger, vivida pela inglesa Sally Hawkins. Jasmine (que nasceu Jeannete, mas trocou de nome no meio do caminho) precisa de um emprego. De uma casa. De uma vida comum. Seria o ponto de partida perfeito para se reinventar. E ela o faz. Do seu jeito.

Isto significa inventar profissões glamorosas, desejar um retorno à faculdade de antropologia e fazer de conta que seus problemas não passam de uma dor de cabeça insistente. Jasmine é blue, Blanche era branca como pó de arroz. Enquanto a personagem de Um bonde chamado desejo queria manter a beleza e o poder de conquista de sua juventude, Jasmine quer continuar sua caminhada a bordo de sapatos Chanel e vestidos Dior como se não houvesse amanhã.

Woody Allen apresenta o caminho que levou Jasmine à decadência por meio de flashbacks que acompanham suas crises nervosas, onde fala sozinha relembrando diálogos dos tempos de luxo. A mulher que surge na tela arrogante e um tanto estereotipada, torna-se humana para o público.

Que a direção de Allen é primorosa não nos restam dúvidas, mas são as atuações que mais colaboram para que Blue Jasmine já possa ser considerado um clássico dos nossos tempos. Cate Blanchet, agraciada por um Oscar pelo papel, encara com naturalidade uma mulher que na mão de uma atriz medíocre soaria engraçada, coisa que Jasmine não é. Sua tristeza é visível em cada gesto elegante que destoa com o ambiente despojado da casa da irmã.

Ah, Ginger! Sally Hawkins aceita a tarefa de ser a agraciada com “genes piores” da família e brilha ao se mostrar tão diferente da irmã ex-rica. Uma quer voltar a usar diamantes, a outra se diverte com cerveja e pizza, sem reclamar. E segue assim por toda a trama, sem desejar sair de sua zona de conforto, por mais desconfortável que ela pareça para Jasmine.

Na plateia dos cinemas, que se tornou uma diversão cara com o avanço dos espaços multiplex, muitas Jasmines devem ter se acomodado nas poltronas com seu olhar de paisagem para desfrutar do trabalho de Woody Allen. Oremos para que os deuses do cinema abram suas mentes e elas façam mais que caridade e ajudem a si mesmas a encontrarem a verdadeira dignidade, aquela que não se alcança usando Rolex nem bebendo champanhe.

Blue Jasmine

Ano: 2013

Direção: Woody Allen

Disponível em DVD, Blu-Ray e na plataforma Netflix

Artigos relacionados

ATENÇÃO


1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.

2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.

3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.

4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.

5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.


OBSERVAÇÃO FINAL:


A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo