Palavras roubadas – por Bianca Zasso
Pode ser uma carta, uma dedicatória ou o que sobrou de um bilhete de despedida. Certas palavras, mesmo que estejam claras em nossa memória, precisam ser conservadas no papel. Esta colunista não sabe explicar os motivos que fazem o ser humano nutrir essa necessidade de guardar as frases que um dia outro ser humano nos endereçou. E os originais de um romance?
Em tempos onde existe a turma que anota tudo no bloco de notas do celular e caneta e papel não fazem mais parte do kit básico para sair de casa, ainda existem os que, como esta que vos escreve, gostam de manter as primeiras anotações de um trabalho conservadas. Muito disso se perde, entre uma mudança e outra, num ataque de fúria ou mesmo por pura distração. O impacto dessas perdas é o tema central do longa-metragem As palavras, dirigido às quatro mãos pelos americanos Brian Klugman e Lee Sternthal.
Protagonizado por Bradley Cooper, que dá vida ao aspirante a escritor Rory Jansen, As palavras apresenta o cotidiano de um homem que quer ver seu romance lançado e lido. Um dia, ele encontra dentro de uma pasta comprada em um antiquário, os originais de um livro. Sem assinatura do autor ou qualquer coisa que indique o que inspirou aquelas linhas, Jansen resolve copiá-las. E chama-las de suas.
Abrem-se as portas do sucesso e a conta bancária colhe os louros de seu dono estar no topo da lista dos mais vendidos. De uma dessas portas abertas, surge um senhor já idoso, o dono da história. Abordar o tema do roubo de ideias não é novidade, mas o que faz de As palavras um filme que merece ser visto é a construção de seu roteiro.
Mesmo que Jansen ocupe o lugar de destaque no cartaz de divulgação e nas sinopses, o fio condutor é outro escritor, Clay Hammond, uma ótima interpretação de Dennis Quaid. Ele é autor de um livro que conta a história de Jansen e seus manuscritos roubados e que participa de uma leitura dos primeiros capítulos para um público selecionado.
Na plateia, a estudante Daniella, vivida pela lindíssima Olivia Wilde, arquiteta um jogo de sedução que parece ter muito mais a ver com literatura do que com paixão. O público precisa lidar com o livro de Hammond, o livro de Jansen e a história de Jansen contada no livro de Hammond, que inclui um flashback de como foi escrita a história encontrada por Jansen. Parece confuso, mas As palavras nos propõe um quebra-cabeça delicioso de se assistir e desvendar.
Se o roteiro é firme e forte, o mesmo não se pode dizer das atuações. Bradley Cooper, que já ganhou três inexplicáveis indicações ao Oscar, não consegue traduzir a aflição de seu personagem e isso fica evidente nos momentos em que ele divide a cena com Jeremy Irons, impecável no papel do homem que perdeu o registro de sua história.
Sua entrada na trama é discreta visualmente, mas o poder de sua voz e a construção dos diálogos nos faz lembrar porque ele é e continua um grande ator. Seus movimentos frágeis se contrapõem ao furor em seus olhos ao lembrar da triste história de amor que viveu.
As palavras não é obra-prima e pode ser que não seja revisitado daqui alguns anos e declarado um grande filme. Mas é das poucas produções recentes que prezam os bons diálogos e as sutilezas cênicas, como o derradeiro encontro entre Jansen e o velho homem na estufa de flores. Se os rabiscos que deixamos no papel correm o risco de acabarem na lixeira, as imagens de As Palavras ficam guardadas no melhor cofre que há: a nossa memória.
As Palavras (The Words)
Ano: 2012
Direção: Brian Klugman e Lee Sternthal
Disponível em DVD, Blu-Ray e na plataforma Netflix
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