Educação Especial e leitura dos clássicos – por Demetrio Cherobini
‘Salvo exceções, não existe inclusão escolar -ou social- sem esse aprendizado...’
A educação especial deve buscar formar bons leitores, sujeitos capazes de apreender o mundo a partir do domínio da linguagem escrita em todas as suas formas e gêneros de expressão. Para isso, a leitura dos clássicos é fundamental.
Alguém perguntará: por que ler os clássicos?Por motivos absolutamente imprescindíveis. Como explica o escritor Italo Calvino, um clássico é um livro com importância maior que os demais, pois serve para compreender quem somos e o mundo em redor de nós. É um livro, portanto, que vem antes dos outros, que ensina a ver a vida de uma perspectiva extraordinária e coloca questões fundamentais para nossa reflexão e prática diárias.
Por sua riqueza e possibilidades, diz Calvino, um clássico nunca termina de dizer o que tem para dizer. Isso significa que, com ele, se pode aprender sempre mais, a partir de novas releituras. É fácil constatar. Pensemos em Machado de Assis, Graciliano Ramos, Drummond, Cecília Meireles, Clarice Lispector, Hilda Hilst… são tantos e tantas, só na literatura brasileira, a cumprir bem esse papel.
A escola deve facultar aos jovens o contato com esses autores, que ajudam a sentir e a compreender a realidade para além das aparências. A escola precisa fazer, justamente, que os estudantes conheçam um certo número de clássicos, para que, com o tempo, eles mesmos possam escolher os “seus” clássicos, isto é, os livros que contribuirão decisivamente na formação de sua personalidade enquanto sujeitos livres, ativos e partícipes conscientes dos destinos da coletividade humana.
É possível proporcionar o conhecimento dos clássicos para crianças e adolescentes com necessidades especiais? Sim, e a melhor forma de fazer isso é ensinar-lhes a ler, escrever e interpreter textos corretamente. Salvo exceções, não existe verdadeira inclusão escolar – ou social, de qualquer tipo – sem esse aprendizado.
É claro que hoje estamos longe disso. Infelizmente, a educação especial tem se limitado, nas escolas, à condição de gerenciadora de uma inclusão aparente e paliativa, por se reduzir ao papel subserviente de chanceladora acrítica dos laudos médicos que aí chegam. Laudos – muitas vezes desleixados, mal escritos, presunçosos, errôneos, obscuros, preconceituosos, feitos por profissionais que visam apenas lucrar com o comércio da deficiência – que mais marcam negativamente a vida dos estudantes do que contribuem para sua formação plena e integral.
Mantenhamos, no entanto, o otimismo – um otimismo ativo e não ingênuo. Pois tudo, enfim, se transforma: o momento histórico, as práticas sociais, os ideais políticos, as instituições, a educação. E quiçá, possamos transformá-los para melhor. Quando a educação especial puder formar bons leitores, numa sociedade superiormente organizada, saberemos que deixou a condição de mera obrigatoriedade formal secundarizada nas escolas para ser uma atividade educativa efetiva e verdadeiramente digna desse nome.
(*) Demetrio Cherobini, professor da rede municipal de Santa Maria, é licenciado em Educação Especial e bacharel e Ciências Sociais pela UFSM, mestre e doutor em Educação pela UFSM e pós-doutor em Sociologia pela Unicamp.
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