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Coisas do Sul – por Rogério Koff

Não gosto em geral da música tradicionalista gaúcha, mas reconheço que há talentos no sul. Gosto mesmo é de rock’n’roll, colonizado que fui desde cedo por Beatles e Stones. Não sei fazer chimarrão, não tenho roupa típica e já faz um tempo que não como mais carne. Aceito convites para visitar fazenda ou passar um dia no campo, desde que à tardinha volte correndo para a cidade, para assistir televisão e depois dormir na minha própria cama. Acampamento, então, é pesadelo para este gaudério urbano. Não sobrevivo sem água quente, luz e uma parafernália de eletrodomésticos.

Mas sou gaúcho sim senhor, de Santa Maria da Boca do Monte. Fui motivo de chacota entre os amigos cariocas nos dois anos em que vivi na cidade maravilhosa, no final dos anos 1990. “Quer dizer que tu não sabes fazer churrasco, tchê?” – perguntavam entre chiados, com aquela imitação sofrível de sotaque gaúcho. À parte todas estas incongruências, sou apaixonado pelo Sul. O Rio de Janeiro, que tão bem me acolheu, é na memória um belo álbum de fotografias pelo qual desfilam amigos e paisagens paradisíacas. Volto lá na primeira oportunidade que tiver, mas para visitar. Pretendo morar o resto da vida no Rio Grande e preferencialmente na minha Santa Maria.

Quanto ao vinte de setembro, trata-se de uma das maiores festas populares do país. Só perde para o carnaval, que não suporto, apesar de ser uma paixão nacional. O Dia do Gaúcho, como batizamos a data, entretanto, é momento impar de afirmação de uma identidade regional. Somos reconhecidos em todos os cantos do país como defensores apaixonados de nossas tradições. Cantamos o Hino Rio-Grandense em nossos momentos mais importantes, seja na Semana da Pátria, formaturas ou nos estádios de futebol. Em qual Estado isto acontece? Quem mais sabe de cor a letra do seu hino?

No futebol, somos diferentes e unidos, como as duas faces da mesma moeda. Torcemos contra nosso maior adversário, mesmo sabendo que a grandeza de um foi construída na celebração desta rivalidade com o pólo oposto e vice versa. Somos assim mesmo, fiéis seguidores das nossas paixões, incapazes de ficar em cima do muro. Coisas do Sul.

Acho que tudo o que relatei explica porque fiquei tão aborrecido com a carta enviada por um senhor mal-humorado a um jornal de grande circulação que, não sei bem por qual motivo, deu destaque a uma série de impropérios contra nós, gaúchos. No show de generalizações, falou mal de nossas churrascarias e disse que somos preconceituosos e xenófobos. A enxurrada de cartas de leitores revoltados mostrou que, em uma sociedade onde as instituições são corroídas pela corrupção e pela indiferença de muitos, ainda somos capazes de indignação moral.

Depois de tudo, prometo rever alguns de meus conceitos. Quem sabe ainda compro um cavalo, me associo a um clube de tradições e desfilo orgulhoso, de chapéu e lenço vermelho (opa!) na próxima Semana Farroupilha. Sou assim mesmo, imprevisível. Coisa de gaúcho. Coisas do Sul.

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