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Culpados ou vítimas?! – por Luciana Manica

Ao tomar notícia da mais nova súmula do STJ sobre direitos autorais, quase que me dedurei na primeira delegacia. Simplesmente não diz porque veio e como aplicá-la no sentido da lei.

Generalizar no direito penal faz com que crimes tidos como insignificantes venham a ser tratados com o mesmo rigor de um hediondo. Ou ainda, é igualar o ladrão de galinhas a um sequestrador de criancinhas. Ou pior, é tentar solucionar um problema muito maior do Brasil, criminalizando condutas que não têm corpo de delito, prova da autoria, bem violado ou sequer vítima.

O crime de direito autoral, assim como inúmeros previstos no Código Penal, tem suas variantes. O caput do artigo 184 menciona que “Violar direitos de autor e os que lhe são conexos” gera pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Trata-se de uma norma penal em branco, que deve ser lida em consonância com os artigos 22 a 45 da Lei 9.610/98, que se referem, resumidamente, aos direitos morais e patrimoniais do autor.

O elemento subjetivo do tipo penal é o dolo, não há crime se provada culpa do agente. O dolo consiste na vontade livre e consciente do sujeito violar o direito autoral. Nas figuras qualificadas (§§ 1º a 3º), exige-se, ainda, o fim especial de agir “com o intuito de lucro direito ou indireto”. Resumo: se você violar o direito autoral de alguém, cometendo plágio, ou baixando a música sem o devido pagamento dos direitos autorais, incorrerá no caput do crime. Se fizer tais condutas visando vantagem econômica, entra nas qualificadoras e a pena aumenta.

Para surpresa de todos, surgiu a Súmula 574 do STJ asseverando que:Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem”.

Diz a lenda que essa súmula teria sido feita para crimes de comércio ilegal de CDs/DVDs, restringindo-se às condutas previstas no artigo 184, §2° do CP. Duas eram as teses alegadas em defesa quando o réu era indiciado por este crime: a perícia realizada por amostragem no estoque não abarcava todo o catálogo de produtos, portanto seria inválida; a identificação do verdadeiro titular da obra não é tarefa fácil, logo, não teria como comprovar se realmente houve violação do Direito de Autor.

Mas afinal, qual é o problema? A súmula não identificou que é voltada para condutas do artigo 184, §2° do CP. E mais, se assim fosse, como pode alguém ser condenado por violar um “direito autoral”, se sequer se prova que há um direito ali protegido (ou violado)? E se as obras estiverem em domínio público? E se o réu fosse o artista? E se não se tratasse de obra passível de proteção?

Outro problema a ser enfrentado é a diferença da tutela do direito autoral entre Brasil e EUA. Em verdade, essa súmula mais parece lobby da terrinha do Tio Sam. No Brasil, o autor é pessoa física! Detém o direito de ceder total ou parcialmente os direitos patrimoniais, enquanto seus direitos morais são inalienáveis. O direito nasce do autor, da sua criação. Já nos EUA, a proteção advém do “copyright” (direito à cópia), surge da obra, e o titular pode ser pessoa jurídica.

Em resumo, essa súmula reconhece direitos que sequer existem no Brasil. Enquanto não se provar a cessão de um direito autoral, esse permanece enraizado ao autor (pessoa física). Não pode uma empresa alegar a violação de sua propriedade se não fizer a devida prova. Mas pela súmula, sequer se precisa provar que há Direito Autoral! Se somos todos culpados, por outro lado, somos todos vítimas!

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