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GOLPE. O fantasma: professores universitários são alvos de criminosos que se passam por advogados

Criminosos usam dados públicas de processos judiciais para aplicar os golpes

“Uma ligação inesperada, uma promessa de pagamento e um pedido de transferência urgente de dinheiro” (Arte Matheus Leal/Sul21)

Do jornal eletrônico SUL21 / Reportagem assinada por Marihá Maria

Uma ligação inesperada, uma promessa de pagamento e um pedido de transferência urgente de dinheiro. Esse é o roteiro de um golpe que há anos tem atingido professores vinculados a instituições de ensino superior. Utilizando nomes de advogados reais, dados de processos públicos e até imagens pessoais, criminosos enganam vítimas ao simular o encerramento de ações judiciais, exigindo pagamentos para a liberação dos supostos valores ganhos.

Em 2024, a professora universitária Nádia* foi uma das vítimas. Ela recebeu uma ligação de alguém que se apresentou como sua advogada, informando que o processo de precatório havia sido finalizado e haveria um alto valor a ser recebido. Para receber o montante, no entanto, precisaria transferir valores para uma conta bancária indicada. Sem conhecer os trâmites reais da liberação judicial e confiando na suposta veracidade da ligação, ela seguiu as instruções dos criminosos.

Nádia* relata que já conhecia o formato dos golpes e que havia escutado histórias de colegas de trabalho que haviam sido enganados. Segundo ela, circulava uma sensação generalizada de desconfiança. “Não se sabia quem golpeava quem, se era na Universidade, se era na empresa, se era dentro dos sindicatos, era um fantasma do golpe”, relata.

Apesar de estar familiarizada com os relatos e alertas, Nádia não imaginava que pudesse ser uma vítima. “Havia no jornal, na televisão, nas redes sociais, alertas de golpe. Mas eu não sou paranoica, eu nunca pensei que iria ser vítima, nunca dei bola. Até que eu caí no golpe, e através de um telefonema”, conta.

No caso dela e de outros docentes, os golpistas se passavam por integrantes do escritório Bordas Advogados Associados. A empresa atende diversos professores universitários, pois é parceira da Adufrgs, sindicato que representa docentes de instituições federais de ensino no Rio Grande do Sul. O contato inicial ocorre por ligação telefônica ou por mensagens via WhatsApp, em contas com o logotipo do escritório e até fotos dos advogados verdadeiros.

O advogado Francis Bordas tem sido, há anos, vítima de estelionatários que utilizam suas fotos, dados profissionais e informações pessoais para aplicar golpes em professores, se passando por ele. Segundo Francis, os primeiros casos começaram em 2022 e, desde então, só aumentaram. Atualmente, os golpes ou tentativas de golpe acontecem com frequência semanal. “Não tem uma semana que a gente não tem uma pessoa ligando para confirmar se é golpe ou se não é golpe”, relata o advogado.

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“É golpe!”: docentes da UFSM são alvo de grupo criminoso com atuação nacional”, reportagem de Bruna Homrich, publicada na página de internet da Seção Sindical dos Docentes da UFSM, a Sedufsm (AQUI)

Ele explica que os criminosos se aproveitam do caráter público dos processos e da ansiedade dos clientes com a possibilidade de finalmente receberem os valores devidos. Diante da recorrência dos golpes, já não é possível definir um perfil específico das vítimas. Francis explica que no início, os casos eram mais frequentes entre idosos, com profissionais já aposentados, mas hoje atingem pessoas de diferentes faixas etárias.

Conforme o advogado destaca, o que une essas vítimas é a esperança de verem seus processos judiciais concluídos. Uma questão emocional que os golpistas exploram. “As pessoas que caem no golpe são ludibriadas na esperança de receber valores. Então esse é o perfil, de uma pessoa, muitas vezes, muito ansiosa. Se ela tivesse esperado um dia e ligado para o escritório, ela não cairia no golpe. Então, é importante frisar isso, eles pegam essas pessoas em um momento de muita ansiedade”, relata Francis.

Com o agravamento da situação e a inércia das autoridades, o escritório implementou uma série de medidas para reforçar a segurança. Isso inclui a unificação de canais de comunicação, disponibilizando apenas um número oficial de telefone e um e-mail central, e o investimento em tecnologias de proteção de dados. Francis também passou a adotar cuidados pessoais: não publica mais fotos nas redes sociais para dificultar que golpistas utilizem sua imagem.

“Há esses cuidados pessoais, que eu tenho mudado, e o escritório tem feito constantemente alertas. Isso tem consumido muito tempo e investimentos financeiros, a gente fez tudo possível para minimizar que as pessoas estejam no risco de cair no golpe. São políticas de comunicação e de ferramentas internas”, relata Francis.

O golpe sofrido por Nádia causou impacto em sua vida financeira, embora os prejuízos pudessem ter sido ainda maiores. Durante todo o processo, ela afirma não ter desconfiado de que estava sendo enganada, mesmo com os alertas e questionamentos de familiares. Somente após ter transferido valores altos aos golpistas, sua conta foi bloqueada pelo banco, o que impediu novas perdas.

Ela relata que o golpe se estendeu por cerca de um mês, período em que permaneceu em negação quanto à possibilidade de estar sendo vítima. “Porque é um processo que te confunde muito as emoções”, ela conta. 

Somente após ser convencida pela sobrinha a procurar a polícia, ela teve certeza de que havia sido enganada. Na delegacia, ao encontrar outras vítimas registrando ocorrências semelhantes, confirmou a suspeita dos familiares. “Fiz o registro, abri o processo e depois nunca mais toquei no assunto, porque eu sei que esse dinheiro morreu”, diz.

Nádia* pontua como muitas vezes as vítimas dos golpes são julgadas por terem acreditado no que foi comunicado pelos criminosos, se tornando malvistas e passam a se sentir envergonhadas. “Não é uma falha intelectual, nem uma falha psicológica, é um ato que, no momento, o comportamento é uma atitude de estupidez, que não tem nenhuma relação com intelectualidade. A estupidez é um arco humano, um comportamento humano”, ela diz.

Para evitar cair em golpes, Francis reforça a importância de sempre verificar a veracidade das informações recebidas. Diante de uma ligação de número desconhecido, a orientação é não tomar decisões imediatas e, em vez disso, entrar em contato diretamente com o advogado pelo número habitual. “Costumo dizer para meus clientes: nada no judiciário do Brasil é tão urgente que não dê para ligar para seus advogados”, diz.

Como medida adicional de segurança, recomenda acessar os canais oficiais dos escritórios de advocacia, como redes sociais e sites, para confirmar os contatos corretos antes de qualquer ação. Além de destacar que nunca um processo judicial exigirá pagamentos para a liberação do recebimento de valores que o indivíduo tem direito.

O advogado destaca que esse tipo de golpe não se restringe a escritórios de advocacia ou a professores, qualquer pessoa pode ser alvo. “O crime vai onde o dinheiro está. O dinheiro não tá na rua, o dinheiro tá na internet. Então, o crime vai com a internet”, pontua.

*Nome alterado para preservar a identidade da fonte

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