Sobre pitacos – por Orlando Fonseca
Participar do programa Sala de Debate, na Rádio Antena 1, sob o comando do titular deste site – ou sítio como ele prefere -, tem-se constituído em uma experiência muito interessante. Ainda nos anos 1970, fui um assíduo ouvinte das rádios de Santa Maria, tanto da programação musical, quanto dos noticiosos e debates.
Tive a oportunidade de apresentar um programa musical na Rádio Universidade, por cinco anos, na década de 90, e fui professor do Curso de Comunicação da nossa UFSM, por 27 anos, em uma disciplina que tratava da produção textual, o que envolve eficácia no uso da linguagem escrita e oral. Digo isso para enfatizar o meu interesse pelo veículo e o que lhe diz respeito, o que dimensiona a minha satisfação por estar no lado dos que ocupam o microfone.
No entanto, não se trata apenas disso. O meu prazer de dar opinião está associado à participação em uma roda de debate, que conta com a inteligência e a verve de gente preparada. E se estende ainda mais pelo fato de que, com a profusão das redes sociais, o ouvinte também pode dar, como nós, os seus pitacos e contrapor as suas percepções sobre os temas enfocados.
Há uma dinâmica inexistente naquele tempo em que eu ouvia passivamente os debatedores, pois requeria o uso do telefone, o que nem sempre permitia um número mais expressivo de participações como hoje. Acrescente-se a isso que, em tempos de Google, na atualidade, ninguém mais fica em dúvida por muito tempo, o que exige dos debatedores o foco em uma opinião abalizada, e não em achismos ou impressionismos.
Semana passada, o tema passava pelo aniversário da Rádio – que já foi Cultura, depois CDN e atualmente Antena 1 – e se transformou em questões meteorológicas do jargão radiofônico. Provocado pelo âncora do programa, expliquei por que conheço certas expressões, como a tal da “umidade relativa do ar”, em função daquela minha atividade de professor de futuros jornalistas. Um ouvinte, obviamente por brincadeira, enviou uma pergunta para mim sobre quais as chances de haver vento norte no dia seguinte.
Disse que, por ter ouvido na programação meteorológica da TV, a chance era zero, pois estava a caminho do Estado uma frente fria vindo da Argentina. Eis que, no sábado – o dia seguinte – Santa Maria amanhece sacudida por uma ventania vinda do quadrante norte. Ou seja, sei muito pouco de meteorologia, e o meu metiê são as palavras, mesmo.
Uma coisa no entanto reafirmo, como uma convicção tirada da minha profissão de professor na área textual: pouca gente tem a paciência que tenho de ler conteúdos diversos para embasar o que penso e digo; muito poucos prestam atenção no que dizem – e no que omitem – os telejornais e os noticiários radiofônicos. E o mais crucial nisso é quando a responsabilidade de opinar, de dar parecer, de formular sentenças, tem a ver com a justiça, a política ou a educação.
O maior problema que enfrentamos hoje, em nosso país, é a desinformação, a opinião baseada na ignorância, o ódio baseado nas ideias pré-concebidas, no senso comum. Pior porque, para vencermos a crise moral – que emporcalha a política e contamina a ordem social – só mesmo com uma cruzada nacional de gente instruída, bem informada e bem intencionada (no sentido democrático, republicano e do bem comum), para anular os desmandos que tomaram de assalto a elite dirigente do país. Nesse caso, posso afirmar com certeza que os ventos soprarão forte na direção de um destino melhor.
LIVRO QUE ESTOU LENDO
O título desse livro pode parecer estranho, porque, em nossa cultura é mais comum haver galos na disputa. Mas se trata de uma estratégia do autor espanhol, Eduardo Mendoza, mestre em misturar o humor com os temas históricos de sua pátria. Adquiri o livro por indicação do livreiro, mas o título e o subtítulo – Madri 1936 – contribuíram muito na minha decisão de comprá-lo. Sequer me dei conta de que já havia lido do mesmo autor o romance A assombrosa viagem de Pompônio Flato, cujo sobrenome indica muito do aspecto anedótico do texto.
As tramas, muito bem desenhadas pelo autor, desenrolam-se nos meses que antecedem a guerra civil espanhola. O protagonista é um inglês, Anthony Whitelands, especialista em arte espanhola. Sua missão, a princípio, é reconhecer a autenticidade de um quadro desconhecido, na posse de uma família nobre, cujo patriarca é amigo de José Antonio Primo de Rivera.
Sem saber onde se metia, o ingênuo professor acaba descobrindo uma obra de Velasquez, cujo valor econômico pode ser determinante para favorecer uma mudança política crucial na história da Espanha. Então começa a tal da rinha, onde comparecem amantes – nobres e plebeias – e agentes fascistas, marxistas, anarquistas, legalistas, aristocratas e espiões de todos os lados. Nosso herói só consegue aumentar as chances de acabar em confusão. Nesse sentido, a narrativa de Mendoza tem todos os atrativos para manter a leitura atenta.
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