Claudemir Pereira

CRÔNICA. Orlando Fonseca e os debates natalinos

Conjuntura natalina

Por ORLANDO FONSECA (*)

Apesar de as cidades estarem cada vez mais iluminadas para os festejos de final de ano, a conjuntura está cada vez mais escura no país. O governo tem-se esmerado em produzir decretos, resoluções e Medidas Provisórias que, ou são derrubadas pela movimentação sensata do Congresso, ou o próprio presidente volta atrás, diante da repercussão negativa. As manchetes do início do seu mandato diziam: “em 9 dias Bolsonaro volta atrás 9 vezes”. E isso continuou ao longo dos meses seguintes. Basta reler as notícias deste 2019, pra ver as marchas e contramarchas do executivo federal: fusão dos ministérios do Meio Ambiente e Agricultura, literalmente colocando a raposa para cuidar do galinheiro; mudanças em edital do Ministério da Educação para compra de livros didáticos que deixavam de exigir referências bibliográficas; possibilidade de os EUA instalarem uma base militar em solo brasileiro; criação de uma nova CPMF; revisão da emenda constitucional do teto dos gastos. O simples anúncio da transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, em Israel, prejudicou a imagem do Brasil internacionalmente e prenunciava problemas com as exportações para o mundo árabe. A última veio com uma proposta que atingia artistas e educadores. Após repercussão negativa, o governo resolveu revogar medida que tirava 17 ocupações do MEI – programa fiscal para Microempreendedor Individual. Artistas se manifestaram contra a medida pelas redes sociais. Presidentes do Senado e da Câmara também se manifestaram contra a decisão.

Preocupado com os números da última pesquisa Datafolha, pelos quais observa que 36% reprovam e 30% aprovam seu governo, o Chefe, olhando pela janela do palácio do Planalto, resolveu editar uma Medida Provisória Natalina. Fica garantida por essa que todo brasileiro terá direito à sua cota de espírito natalino. Este, com seu brilho mágico, terá o poder de obnubilar as cenas deploráveis dos parlamentares se engalfinhando por questões menores, acusações de malversações dos recursos públicos, manobras, propinodutos e golpes de toda sorte. Com esse pacote de bondades natalinas, certamente, os congressistas vão disputar alegremente sobre emendas de felicidade à dita MP. O próprio Noel será chamado para dar seu depoimento nas audiências públicas sobre o direito inalienável às alegrias momentâneas do Natal. Assim o fim do ano virá e teremos um ano novo (espera-se). O resto então será passado.

O Ministério da Saúde também está entrando no clima, pelo esforço de garantir o direito à euforia natalina. Depois da zica gerada pelos vários problemas criados pelo “aedes egipty, vários laboratórios foram chamados para tentar tirar proveito das condições que têm gerado epidemias como a dengue. O povo – e não apenas os que têm o esgoto a céu aberto em frente a suas casas, mas até mesmo os que têm piscinas e grandes reservatórios de água – não se convence de que nestes casos não é só o poder público que tem responsabilidades. Vai daí que se criou então o Vírus Natalinus, que será espalhado por um prosaico espécime de mosquito tupiniquim – para que não se discrimine ninguém. Até o Natal, a maior parte da população estará contaminada, e os sintomas poderão ser sentidos em toda parte: febre natalina e os olhos brilhantes com as cores da estação.

Mesmo a famigerada Operação Lava Jato vai entrar no esforço pela democratização do espírito natalino. Será praticada por estes dias a “delação presenteada”, segundo a qual os indiciados, os presos provisórios e preventivos serão estimulados a fazerem afirmações positivas sobre seus amigos secretos. Além da redução da pena, os alcaguetes presenteados também poderão fazer um rateio dos valores de propinas não confiscadas. Pode ser que o Presidente mude de ideia até às vésperas do Natal. É esperar para ver.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

OBSERVAÇÃO: Instagram / Reprodução

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