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Será o fim dos tempos? – por Marta Tocchetto

A semana que passou e a que se inicia, acredito, que não será diferente, parecem trazer o recado do fim dos tempos. Os casos de Covid 19 dispararam assustadoramente. Reflexo da falsa sensação de que a pandemia acabou. Enquanto os infectologistas alertavam para o apagão de dados do Ministério da Saúde e que o momento não era de baixar a guarda relaxando com as medidas preventivas, as flexibilizações ocorriam em todos os lugares e em todos os níveis – praias lotadas, festas sem limite de público, viagens, cruzeiros marítimos, eventos presenciais, bares e casas noturnas sem restrição. Até parecia vida normal!

O vírus não voa! A transmissão se dá de pessoa para pessoa. As redes sociais bombaram e, ainda bombam fotos sem máscara como se fosse possível dar um stop no vírus diante das lentes. O resultado foi uma transmissão em massa que interrompe diversas atividades, não por prevenção, mas pelo adoecimento de um grande número de pessoas. A economia não pode parar, mas está parando por força das circunstâncias. Parece até ironia, mas é fato.

Chego a pensar que o negacionismo do governo criou um fantasioso ataque hacker como estratégia para que todos peguem a doença, já que ela está mais branda, para alcançar a famigerada imunidade de rebanho. Não é de se duvidar! São inúmeros os exemplos de que até o Ministério da Saúde resolveu se aliar ao vírus, em vez de proteger a população brasileira de uma doença que mata e pode deixar sequelas graves.

Não bastasse o vírus que nos aprisiona, nos limita e nos isola, as temperaturas escaldantes confinam as pessoas em busca de algum alívio. Domingo, a temperatura em Santa Maria foi a maior dos últimos 108 anos, disseram os jornais. Foram ultrapassados os 40ºC! As previsões não são de parar por aí! Ao ar livre, a sensação era de estar na boca do forno. As plantas queimaram. Os animais inquietos e extenuados buscavam algum lugar mais fresco. Quem podia desfrutar de um condicionador de ar se protegia das temperaturas senegalesas.

As mudanças climáticas a cada estação evidenciam que as transformações alcançam níveis irreversíveis. Assim como a pandemia, a causa é a ação do homem sobre o meio ambiente. O aumento da concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera funcionam como uma tampa sobre a superfície impedindo a movimentação das camadas de ar. Diante desse fato, o ar mais quente fica aprisionado junto à superfície. A consequência é o aumento das temperaturas.

As populações em vulnerabilidade social e econômica são as que mais sofrem. A injustiça e o racismo climáticos são uma realidade cada vez mais evidente. É necessária uma mudança radical no modo de produção e de vida para evitar que a sobrevivência humana se torne insustentável no planeta. É urgente que as políticas públicas caminhem nesta direção, em vez de ignorar e negar o problema.

A crise hídrica é mais um sinal que se agrava pelo desmatamento crescente, pelo incentivo à monocultura, pelo assoreamento dos corpos d’água, pelo descumprimento da reserva legal, pela destruição das nascentes e da mata ciliar, pelo descumprimento da legislação, pela flexibilização do licenciamento, pela falta de fiscalização e responsabilização de crimes ambientais.

A estiagem no Rio Grande do Sul é a maior dos últimos 17 anos. São centenas de munícipios em estado de emergência e um prejuízo que beira os 20 bilhões de reais. A fome e a insegurança alimentar galopam. Soluções emergenciais não resolvem o problema, amenizam. Ano após ano, a situação se repete. É preciso falar em água antes que ela falte!

O fortalecimento dos Comitês de Bacia Hidrográfica como legítima instância de gestão é essencial para a definição de usos prioritários, para o desenvolvimento de projetos e para o estabelecimento de políticas públicas que proporcionem soluções efetivas e definitivas que aumentem a reservação e recuperem a degradação das águas superficiais e subterrâneas. Enquanto o cenário de fim dos tempos toma forma o que se vê, tanto a nível de governo federal quanto estadual, são políticas de retrocesso – incentivo à destruição dos biomas, impunidade, flexibilização e descumprimento da legislação, incentivo aos combustíveis fósseis, em especial ao carvão, liberação de agrotóxicos proibidos, invasão e especulação de áreas de proteção, incentivo ao desmatamento e à mineração ilegal.

A lista é grande e faz parte de um projeto ecocida pelo qual estamos pagando e pagaremos altos preços por assistir de camarote a destruição nacional. É urgente que as pautas ambientais façam parte de nossas ações diárias e escolhas políticas, sob pena de abreviarmos a nossa vida e daqueles que nos são caros.

*Marta Tocchetto é Professora Titular aposentada do Departamento de Química da UFSM. É Doutora em Engenharia, na área de Ciência dos Materiais. Foi responsável pela implantação da Coleta Seletiva Solidária na UFSM e ganhadora do Prêmio Pioneiras da Ecologia 2017, concedido pela Assembleia Legislativa gaúcha. Marta Tocchetto, que também é palestrante em diversos eventos nacionais e internacionais, escreve neste espaço às terças-feiras.

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2 Comentários

  1. Não podiam faltar as ‘politicas publicas’, afirmação genérica de quem não tem idéia de como o problema pode ser resolvido. Sem falar nos ‘comites’, os soviets que tanto gostam. Reunião de burocratas não resolvem problemas. No mais, os cães ladram e a caravana passa. As praias irão lotar e as festas, legalizadas ou não, continuarão acontecendo. E completos idiotas perguntarão: ‘Tu viste o filme “Não Olhem para Cima”‘?

  2. Por isto que não é necessario se assustar com os vermelhinhos, gente com capacidade cognitiva reduzida. Alás, chamar de ‘comunista’ não dá processo, bastante civilizado, mas o significado da palavra pode ser multiplo. Questão dos dados do MS, ninguém dá bola para isto. Mais ou menos como o JãoCovid, o tal tenista. Vermelhinhos dizem que tênis é coisa de burgues, já acho que é muito chato. ‘Fantasioso ataque hacker’, teoria da conspiração não pode faltar. Condições meteorologicas tem a ver com La Niña e a Oscilação Decadal do Pacifico, quem for defender a ciencia é bom estudar um pouco e falar com meteorologistas. Alás, noutro dia um imbecil colocou na conta da atividade humana a reversão dos polos. Algo que acontece mais ou menos a cada 450 mil anos. Outro imbecil, afeito a mentiras e teorias da conspiração, fez discurso contra a privatização da empresa estadal de ‘chips’ de POA. Unico chip que pode a criatura conhecer é o Elma Chips, mas fala como se fosse ‘otoridade’ no assunto.

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