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Bicentenários – por Luciano Ribas

Algumas pessoas ainda lembram que, em 1998, este que vos escreve venceu o concurso para a escolha da “Marca Oficial das Comemorações dos 500 Anos do Descobrimento”. Como diz o proprietário do site que hospeda meus artigos, “modéstia às favas”, foi uma vitória sobre quase sete mil trabalhos inscritos. Dentre eles, três foram escolhidos como finalistas e submetidos a uma votação popular – por telefone, pois, à época, a internet ainda era um “bicho esquisito” no Brasil.

Minhas velas alçadas, com um 500 cumprindo o papel de caravela logo abaixo, caíram no gosto do povo e venceram a disputa. Para quem duvidar, posso mostrar um anúncio na revista Veja e um diploma emoldurado, pois a foto recebendo o prêmio das mãos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nunca me foi enviada (naquela época, obviamente, a foto seria em papel e o envio por carta).

Por diversas razões, que vão desde a situação que o país vivia naquele fim de século até a confusão com uma ação da então poderosíssima Rede Globo denominada “Brasil 500”, o que era para ser uma grande comemoração popular “flopou”, para usar um termo da moda. Digamos que foi “tipo” o BBB 22 visto do futuro: aconteceu, rendeu algum assunto, mas pouca gente lembra…

Foi diferente no Bicentenário Argentino que, pelos registros, obteve grande adesão popular. Simbolizado por uma marca construída a partir da escarapela azul e branca – um tradicional adorno patriótico, também conhecido como roseta – acrescida do sol da bandeira, “ganhou o coração” do povo e esteve presente nas ruas e nas comemorações oficiais. Bela, bem comunicada e existindo em uma conjuntura melhor, ao que tudo indica cumpriu honrosamente o papel que uma marca cívica deve desempenhar. Uma marca também é definida por suas circunstâncias.

Mas por que trago esses dois assuntos um tanto “aleatórios”, devem estar se perguntando, nesse momento, as três ou quatro pessoas que costumam ler meus artigos.

Me explico: em 2022, quem comemora os 200 anos da Independência é o Brasil e, quase no 22 de abril do Descobrimento (ou da Invasão, como preferirem), a maioria dos brasileiros e das brasileiras não faz a mínima ideia disso.

No site governamental dedicado ao assunto, o conteúdo é escasso. Há uma marca construída a partir da mão de Dom Pedro I segurando uma espada, que é esteticamente questionável, simbolicamente sofrível, formalmente terrível e culturalmente nula, na minha opinião. E pouca coisa mais.

Certamente não é assim porque o néscio tem consciência de que o momento não é de festa e que o principal culpado por isso é ele. Provavelmente, é apenas mais uma das incompetências da horda que chegou ao governo, parida pela facada de 2018. O que não significa que não haverá rega-bofes e salamaleques, pois os militares já compraram 1.184 toneladas de filé mignon, picanha e salmão, totalizando R$ 56 milhões.

Para muita gente é difícil separar patriotismo de patriotada. No Bolsonistão, o primeiro é raro e a segunda farta. Por isso, não me surpreenderá se, em alguns meses, surgir uma campanha massiva nas diferentes mídias exaltando a nossa “perfeição”, por exemplo. Comemorações para turistas sexuais verem, viúvas da ditadura derramarem lágrimas de crocodilo e pastores lobistas amealharem algum. E, mais uma vez, vamos “esquecer a nossa gente, que trabalhou honestamente a vida inteira e agora não tem mais direito a nada”, nem a comprar um botijão de gás e fazer três boas refeições no dia 7 de setembro de 2022.

(*) Luciano do Monte Ribas é designer gráfico, mestre em Artes Visuais pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e doutorando em Diseño pela Universidad de Palermo (UP/Buenos Aires). É um dos coordenadores do Santa Maria Vídeo e Cinema, além de já ter exercido diversas funções na iniciativa privada e na gestão pública. Ele escreve neste site aos domingos. 

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