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Marielle e o fio de Ariadne – por Leonardo da Rocha Botega

Enfim, começa a ser puxado o fio para solucionar o assassinato da vereadora

Entre as múltiplas estórias contadas pela mitologia grega existe uma bastante singular: o mito do fio de Ariadne. Contavam os antigos gregos que Teseu, filho de Egeu, rei dos atenienses, e de Etra, se dirigiu a ilha de Creta, governada pelo rei Minos, com o objetivo de libertar Atenas da obrigação de periodicamente enviar jovens para serem devorados pelo Minotauro. O monstro, metade touro, metade homem, habitava um labirinto construído pelo notável arquiteto Dédalo.

Chegando em Creta, Teseu conheceu Ariadne, filha do rei Minos. Teseu e Ariadne acabam se apaixonando. Temendo pela vida do amado, Ariadne lhe dá uma espada e um fio. Com a espada, Teseu poderia derrotar o monstro, com o fio, encontrar o caminho de volta. E assim aconteceu. Teseu derrotou o Minotauro, saiu do labirinto e libertou Atenas da obrigação de sacrificar seus jovens.

Você deve estar se perguntando: que relação pode existir entre o mito do Fio Ariadne e o caso Marielle Franco? Onde está a analogia? Pois bem. É muito comum os criminologistas compararem os processos investigativos com o desenrolar de um fio. Isso ocorre porque em ambos os casos o puxar de um fio ou de uma prova consistente pode levar a solução do problema. No caso da criminologia, o desvendar do próprio crime.

Nas últimas semanas, a Polícia Federal e o Ministério Público parecem ter encontrado o fio para definitivamente se chegar à resolução do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. O depoimento em delação premiada do ex-PM Élcio de Queiroz foi revelador. Nele, o ex-sargento, expulso da PM do RJ em 2015, assumiu sua participação como motorista do veículo utilizado no atentado contra a vereadora.

Élcio de Queiroz revelou também que os disparos foram feitos pelo ex-policial reformado, Ronnie Lessa. Por fim, pelo menos daquilo que foi tornado público da delação, Élcio ainda afirmou que o ex-bombeiro Maxwell Simões, o Suel, era o responsável por realizar campanas para monitorar a rotina da vereadora. À Suel coube também “dar cabo” ao veículo e as armas utilizadas no assassinato.

Para além do conteúdo do depoimento de Élcio de Queiroz, outras questões de fundo chamam atenção no caso. Em pouco mais de seis meses, a Polícia Federal conseguiu descobrir o que a Polícia Civil do Rio de Janeiro não conseguiu em cinco anos. Tal fato indica que as relações entre os crimes da milícia e os agentes do Estado do Rio de Janeiro talvez sejam mais complexas do que se imagina.

O jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, Bruno Paes Manso, autor dos livros “A Guerra: a ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil” e “A República das Milícias”, chama atenção para o fato de que por trás do crime organizado há sempre a conivência ou a participação de agentes do Estado. Os patrimônios de Élcio de Queiroz, Ronnie Lessa e Suel, expostos pela imprensa demonstram o quanto essa relação é umbilicalmente forte. Afinal, como pode alguém com a renda de policial militar, em um país onde os agentes de segurança são mal pagos, possuir os bens que eles possuíam? Como pode os órgãos de fiscalização de receita não desconfiarem desta incongruência?

Uma coisa é certa, o caso do assassinato de Marielle Franco e de Anderson Gomes pode ser uma ponta de lança na luta contra o crime organizado e as milícias no Rio de Janeiro. Pode ser o fio de Ariadne que irá ajudar o Brasil no caminho da libertação de milhares de trabalhadores e trabalhadoras, donos de pequenos estabelecimentos, moradores de bairros e periferias, jovens negros e negras que em seu cotidiano são extorquidos e tem suas vidas colocadas em risco em territórios onde a milícia faz a lei.

Até lá algumas perguntas ainda seguem abertas como: quem mandou o vizinho do ex-presidente matar Marielle? Por que alguém mandou o vizinho do ex-presidente matar Marielle? Por que as autoridades responsáveis pela gestão da segurança pública no Rio de Janeiro, quando do assassinato de Marielle e Anderson, permanecem caladas diante das revelações feitas por Élcio de Queiroz? Quando essas perguntas forem respondidas talvez possamos achar a saída do labirinto.         

(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve regularmente no site, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).

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Um Comentário

  1. Primeiro, o Brasil é muito maior do que Mariele. Dois, vermelhos tentam ‘enganchar’ o crime no ex-presidente com finalidades politico eleitorais. Terceiro: nada de novo aconteceu. Quarto: Antonio Tabet num podcast. Aglomeração na entrada do Maracanã, jogo do Flamengo. Barreira policial para impedir quem não tinha ingresso de acessar os portões. Humorista e filho no meio da massa vendo ‘qual é’. Um policial o enxerga. Chama ‘Peçanha! Peçanha! Passa aqui na frente’. Ele chega na frente e começa a conversar com o policial que o chamou pelo nome do personagem. Dali a pouco outro policial do lado avisa: ‘Cuidado com o cara que esta a tua esquerda, ela está tentando furtar o teu celular’. Ele vira para o sujeito e diz ‘O celular está no bolso do casaco da direita’. O punguista fala ‘Ah! Tá bom.’. E vai embora. Os policiais depois das selfies deixam o humorista ir para o jogo. Resumo da opera: o que se ve no noticiario é muito superficial (dentre outros problemas), não propicia muitas especulações de fundamento.

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