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Os dodôs – por Luciano Ribas

Por curiosidade, há alguns dias procurei como se classificam as espécies quanto à possibilidade (ou proximidade) de sua extinção. Descobri a “classificação por estado de conservação”, um tipo de ranking que diz quais espécies estão mais próximas de “dar o peido mestre”, como dizia meu avô Floriano do Monte.

É uma classificação interessante feita, segundo a Wikipédia, com base na “amplitude de distribuição, o nível de ameaça a que está sujeita, a variação do tamanho da população” entre outros fatores, entre os quais suponho que esteja a disposição do predador-mor em tentar conservá-la.

O ranking inicia com o nível “segura ou pouco preocupante”, classificação onde se enquadram os torcedores do Imortal Tricolor, por exemplo, cuja população está em permanente crescimento. Seguem os níveis “quase ameaçada NT”, “vulnerável VU”, “em perigo EM”, “crítica ou criticamente ameaçada CR”, “extinta na natureza EW” (acho que nesse caso se enquadram os torcedores do Cruzeiro de Porto Alegre) e “extinta EX”, o último nível, equivalente a uma sentença de morte coletiva e, por enquanto, irreversível.

Entre os animais que não mais caminham, se arrastam, pulam, voam ou nadam no planeta Terra estão espécies como as raposas-das-Malvinas (o nome certo seria “das-Falkland”, mas em solidariedade ao hermanos decidi mudar), que não são vistas entre os súditos da rainha ocupante desde 1876; as focas-monge-das-Caraíbas, desparecidas desde 1952; os tigres-de-Bali, sem registros confirmados desde o final da década de 30; os asnos-sírios, cujo último exemplar morreu em cativeiro em 1927; os bandicoot-pés-de-porco, mais uma criatura australiana esquisita de quem não se tem notícias desde os anos 20 do século passado. Na mesma lista estão a ave-elefante de Madagascar, o pato-do-Labrador, o pato-de-cabeça-rosa da Índia, o cormorão-de-lunetas russo, a cara-cara-de-Guadalupe, a cotovia-da-ilha-Stephen, o lagarto da ilha de Ratas, o kawekaweau neo-zelandês e, provavelmente, os torcedores do Renner e do Força e Luz porto-alegrenses.

A espécie extinta mais famosa, porém, é a dos dodôs, grandes aves de até um metro de altura que habitavam as ilhas Maurício, localizadas perto de Madagascar. Parece que os portugueses foram os primeiros a chegar nelas, em 1505, e que teriam batizados os bichos de “doudos”, doidos em português da época, uma singela homenagem ao jeitão desajeitado das aves. Menos de dois séculos depois desse contato com nossos primos portugueses, o último deles fez a derradeira corrida deselegante sob o sol.

Saltando no tempo e saindo da biologia (ou seria da ecologia?), temo que estejamos testemunhando mais uma espécie “extinta na natureza EW” ou simplesmente “extinta EX”, dessa vez aqui em Santa Maria. Não consigo enquadrá-la com segurança em nenhum dos critérios, pois creio que existam ainda alguns indivíduos em “cativeiro”. Na verdade, esta esperança é tão própria do imaginário humano que até mesmo um dodô escondido num canto das Ilhas Maurício sonhamos encontrar – e o celacanto estará sempre lá, pronto para alentar nosso devaneio.

Tal como as raposas-das-Malvinas e os dodôs, parecem não estar mais entre nós os fiscais que deveriam cuidar do trânsito, inibir a propaganda irregular dos panfleteiros, impedir a ocupação sem limites do espaço público, coibir a venda de bebidas alcoólicas nas calçadas, entre outras funções que o poder público precisa exercer. Talvez um predador, ávido por simpatias duvidosas e sem nenhum compromisso com quem lhe garante a subsistência, seja o responsável pela iminente (ou já consumada) extinção. Uma lástima.

Tomara que alguém possa trazer de volta os dodôs-do-coração-do-Rio-Grande, quer dizer, os fiscais à luz do dia. Nosso meio ambiente precisa urgentemente deles.

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Um Comentário

  1. Muito bom o texto e muito pertinente também. Quem achar um fiscal municipal operante na cidade deve avisar a imprensa para mostrar que a espécie ainda existe. Enquanto isso, dá-lhe bagunça e esculhambação na cidade dia e noite. Com aval do prefeito.

  2. “Talvez um predador, ávido por simpatias duvidosas e sem nenhum compromisso com quem lhe garante a subsistência, seja o responsável pela iminente (ou já consumada) extinção.”
    Muito bom!!! Hehehehe

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